A incidência do mal

“Na verdade é inútil estender-se a rede ante os olhos de qualquer ave.” Pro 1; 17

Essa metáfora sucede a uma série de conselhos, onde, Salomão tenta desencorajar a associação com os maus; literalmente, alude à formação de quadrilha.

“Se disserem: Vem conosco a tocaias de sangue; embosquemos o inocente sem motivo; Traguemo-los vivos, como a sepultura; e inteiros, como os que descem à cova; acharemos toda sorte de bens preciosos; encheremos as nossas casas de despojos; lança a tua sorte conosco; teremos todos uma só bolsa! Filho meu, não te ponhas a caminho com eles; desvia o teu pé das suas veredas;” vs 11 a 15

Entretanto, o fato de o sábio desaconselhar tais atos como inúteis não deve ser entendido como infrutíferos. Na verdade muita gente “ganha a vida” assim; roubando, assaltando, protegidos pela pluralidade de suas súcias, e pelo favor das trevas.

Os pesquisadores obtêm sucesso quando precisam armar redes às aves, se o fazem à noite; quando empreendem seus trajetos noturnos elas caem na armadilha. Mas, Salomão referia-se a uma rede ante os olhos, não oculta. Qual é a ideia então? Que mesmo sendo possível fazer essas coisas fora da vista das vítimas, gozando os indignos frutos, em última análise, o mal feito retornará sobre seus agentes, pois, foi praticado ante os olhos de Deus. “No entanto estes armam ciladas contra o seu próprio sangue; espreitam as suas próprias vidas.” V 18

Assim, se por um lado a ideia de que trazemos Karmas de outras vidas para purgar nessa é estranha às Escrituras, por outro é patente que seremos plenamente responsabilizados pelos atos que praticarmos.

Pois, mesmo que a incidência do mal sobre a sorte dos justos seja uma necessidade, é circunstancial; enquanto, na sina dos que têm o mal como modo de vida, no fim, será letal. “Não armes ciladas contra a habitação do justo, ó ímpio, nem assoles seu lugar de repouso, porque sete vezes cairá o justo, e se levantará; mas os ímpios tropeçarão no mal.” Prov 24; 15 e 16

Certo é que, para quem cogita a vida apenas no estágio terreno tem horas que parece que o mal compensa, deveras. Mas, olhar as coisas dessa perspectiva não é permitido aos filhos de Deus; como ensina Paulo: “Se esperamos em Cristo só nesta vida, somos os mais miseráveis de todos os homens.” I Cor 15; 19

Asafe, aliás, vendo o “triunfo” circunstancial do mal teve uma recaída, da qual se refez, andando no tempo. Ouçamo-lo. “Pois eu tinha inveja dos néscios, quando via a prosperidade dos ímpios. Porque não há apertos na sua morte, mas firme está sua força. Não se acham em trabalhos como outros homens, nem são afligidos como outros homens. Por isso a soberba os cerca como um colar; vestem-se de violência como de adorno.” Sal 73; 3 a 6

Ele seguiu um pouco falando hipoteticamente como néscio; depois, nos tranquilizou cotejando o insensato presente com o passado, com a geração antiga; e o futuro com a sorte porvir. “Se eu dissesse: Falarei assim; eis que ofenderia a geração de teus filhos. Quando pensava em entender isto, foi para mim muito doloroso; até que entrei no santuário de Deus; então entendi o fim deles. Certamente Tu os puseste em lugares escorregadios; Tu os lanças em destruição.” Vs 15 a 18

Sim, se louvasse como sábios aos ímpios prósperos macularia a memória dos justos; “ofenderia a geração de teus filhos…” Se apostasse num final venturoso duvidaria da justiça de Deus; da qual, Abraão cogitou: “Longe de ti que faças tal coisa, que mates o justo com o ímpio; que o justo seja como o ímpio, longe de ti. Não faria justiça o Juiz de toda a terra?” Gên 18; 25

Assim, os ímpios serão condenados pelas suas obras; e, se é vero que os “justos” herdam a justiça de Cristo a despeito das obras, também o é, que após conversão as boas obras serão testemunhas em suas vidas, como consequências necessárias do que O Salvador fez.

Sócrates, o filósofo, acertou ao defender que é mais infeliz quem comete uma injustiça, que outrem que a sofre. Afinal, é o injusto que possui uma alma carente de cura. Pois, as promessas do Salvador buscam injustiçados, não, injustos; “Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão fartos …” Mat 5; 6

Por ser o homem uma “ave” racional, arbitrária, só cai nas redes que deseja; sua própria vontade enferma o faz praticar o mal contra si mesmo. Se, hipocrisia enseja miopia quando as consequências chegam, Jeremias nos empresta a lupa: “De que se queixa o homem vivente? Queixe-se cada um dos seus pecados.” Lam 3; 39