Qual seria a mais adequada prece na relação com o Altíssimo?
 
Irmãs e irmãos, que a paz esteja presente sempre em sua vida!

Por algumas vezes, refletimos sobre a prece. Formas orantes de nos relacionarmos com o divino que em nós habita e presente em todo tempo e lugar. Meio de estarmos em contato com o infinito, apesar de nossa limitada finitude, caminhos que buscamos para trilhar, em busca de algo que não compreendemos direito, mas tentamos emocionalmente, sentimentalmente e racionalmente construir e estabelecer como meta para nossa vida. A parte em busca do todo, a gota de água almejando compreender todo o oceano. Damos nomes, formas, ideias, imagens, meios para melhor podermos fixar nossa mente e nosso ser em sua direção, em busca do seu encontro, em busca de nos ligarmos a ele (ou ela?!) e compartilharmos de sua ilimitada existência.

Utilizamos a oração falada, espontânea ou repetida, a oração meditativa, por diversos modos, a oração contemplativa, focada ou simplesmente pela entrega. Enfim, meios de nos relacionarmos com a nossa mais profunda essência que, pela nossa razão, sequer sabemos onde ou como se encontra, muito menos como nos relacionarmos adequadamente com ela. Buscamos um meio, um caminho, um jeito de nos “encontrarmos” com o Ser, com o Absoluto, uma forma de preenchermos o vazio que permanece sempre presente, mesmo quando nos “inundamos” de matéria, um caminho para nos livrarmos dessa “insatisfatoriedade” permanente, mesmo quando nos “presenteamos” com os objetos de nossos desejos. E, tudo isso acontece, toda essa busca, toda essa tentativa de encontro, todo esse esforço, apesar do ego limitador, das amarras mundanas, das ilusões sensoriais.

De qualquer forma, optamos e tentamos. Escolhemos formas de seguir e de nos relacionarmos com o Criador, de acordo com os meios que mais nos fazem sentir confortáveis, física e emocionalmente, racional e espiritualmente.

Entretanto, gostaríamos de refletir sobre a prática orante, em especial a verbalizada, contextualizando-a à lógica do amor e da compaixão, sentimento enraizado na essência divina e, por muitos, direcionado a Ele e/ou ao próximo.

Permitam-se trazer à tona uma passagem do evangelho de São Mateus:

Tendes ouvido o que foi dito: Amarás o teu próximo e poderás odiar teu inimigo. Eu, porém, vos digo: amai vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam, orai pelos que vos [maltratam e] perseguem. Deste modo sereis os filhos de vosso Pai do céu, pois ele faz nascer o sol tanto sobre os maus como sobre os bons, e faz chover sobre os justos e sobre os injustos. (São Mateus, 5:43-45)

Ao se praticar a meditação focada em algum fato, ponto ou cenário, a forma mais difícil de se concentrar atentamente, com a mente pacificada e amorosa, é quando utilizamos, como imagem, algum inimigo ou desafeto. É um maravilhoso e dificílimo exercício.

Nossas emoções ruins tomam conta de nós, o rancor e, as vezes, até mesmo a ira assumem o comando de nossos sentimentos. Tudo se transforma nesse momento, fazendo com que enormes obstáculos de interponham em nosso caminho em direção à nossa essência divina, à qual estamos buscando nos focar.

Muito raro conseguirmos manter nossa meditação, nossa contemplação ou nossa oração falada enquanto estamos pensando em algum desafeto, muito menos somos capazes de incluirmos em nossas súplicas tais pessoas, mesmo quando estão sofrendo. Mas amá-los, pedir por eles, inclui-los em nossas orações??!!

Mas busquemos novamente o foco no Inefável, concentremo-nos na presença do amor divino que radicalizado está em nós e partamos para o nosso caminho orante.

E agradecemos.

Cheios de satisfação por não estarmos pedindo algo, pleno de gozo por sentirmos, somente, o desejo de agradecer. E assim o fazemos. Porém, por exemplo, agradecemos pelo sol que esplendidamente nasceu naquele dia, propiciando o lazer familiar, sentindo aquela oportunidade como um grande presente do Altíssimo. Entretanto, o mesmo sol, com a mesma intensidade, foi o causador da agressão à lavoura de um agricultor que tanto pedira chuva ao Criador, levando-o à beira da perda de seu plantio. Estaria Deus protegendo o primeiro orante, em detrimento do segundo? A mãe de um policial coloca o seu filho nas mãos de Deus pela oração, com o mesmo fervor que a mãe do bandido que se enfrentarão em determinado momento. Qual dos dois terá maior proteção? Qual das duas mães terá sua oração atendida? Ou a oração torna-se prioritária quando feita primeiro? Que Deus de amor é esse que permite o sofrimento de uns e o prazer de outros, que aceita o pedido de alguns e recusa o de outrem?

Estaríamos nós contextualizados no amor divino ao pedir coisas que, independentemente de nós, poderiam gerar o sofrimento de outras pessoas? Estaríamos sendo impulsionados pela essência amorosa do Altíssimo a fazer súplicas que, se concretizadas, poderiam levar outros seres a perdas e angústias? O pensamento orante egocêntrico, importando-se apenas consigo ou com os seus afetos, estaria sendo acalentado pela amorosidade do Criador?

Com isso, vem a grande pergunta: Mas qual o pedido ou agradecimento não estaria voltado ao privilégio para uns e o prejuízo de outros? Se formos analisar detalhadamente, muito poucos, se é que existe. No equilíbrio universal, apenas o amor tem sua expansão ilimitada, sem que requeira a redução de algo para compensá-la.

Poderiam, muitos de vocês, questionar tal pensamento, trazendo para essa reflexão palavras do próprio Cristo Jesus, apresentada pelo evangelista João: “Até agora não pedistes nada em meu nome. Pedi e recebereis, para que a vossa alegria seja perfeita.” (Jo 16:24)

Porém, reflitamos juntos. O que mais foi dito e exemplificado pelo próprio Jesus foi o desprendimento das questões deste mundo, foi o desapego de tudo que se referia ao ter, até mesmo, em determinados momentos, ao sentimento direto relacionado às pessoas mais ligadas. Estaria Ele, nessa passagem relacionando-se a qual pedido? Certamente que, ao falar em pedir em seu nome, estava falando em expansão do amor, da plena entrega ao Altíssimo, cujo retorno seria a verdadeira Paz, não a paz deste mundo material e sensorial, mas a paz perfeita, como Ele disse, a alegria perfeita.

Nós que, pelo nosso limitado entendimento e nosso distorcido e ilusório desejo material, direcionamos o entendimento de tal passagem aos pedidos materiais, ao pedido relacionado aos prazeres momentâneos, mesmo que em detrimento de outros. E ai, voltamos ao amarmo-nos mutuamente com o mesmo amor divino!!

Não nos esqueçamos que também Jesus disse-nos: “Não sabeis o que pedis, retorquiu Jesus. Podeis vós beber o cálice que eu vou beber, ou ser batizados no batismo em que eu vou ser batizado?” (Mc 10:38) Ou seja, sabemos, exatamente, o que significará nosso desejo atendido? Temos a clareza se o sofrimento acoplado ao atendimento de determinados pleitos seriam por nós suportados?

Pelo exposto, não seria a “oração” de entrega e o construir o bem e a paz no mundo o melhor caminho, a mais adequada prece, para que estejamos corretamente contextualizados no amor do Altíssimo, imbuídos, de fato, pela amorosidade essencial que em nós radicalmente existe, advinda de nossa origem divina? Entregarmo-nos e tudo que a nós se relaciona, para que se concretize o desejo do Criador, para que ocorra tudo que a nós for devido e por nós for conseguido, pelas nossas ações e pelos nossos sentimentos, não seria o melhor caminho orante?

Pensemos que orar é o contato com a nossa essência amorosa, divina e iluminada, é a nossa perfeita harmonia, como seres humanos e divinos e toda forma e prática orante deve contemplar tal intento.

Não existe a melhor forma de oração, a mais eficaz ou o modo correto de orarmos. Existe, porém, o meio que melhor nos conduz pelo caminho do amor, do bem e da compaixão, aproximando-nos, sempre, do Criador e possibilitando que o mundo em que habitamos seja, continuamente, iluminado pelas atitudes de amor e união.

Existe uma reflexão atribuída a Sidarta Gautama (o Buda histórico) referente a isso. Se alguém estiver na margem de um rio e quiser ir para o outro lado, terá de usar um barco ou atravessá-lo a nado, pois não conseguirá com a oração que uma das margens aproxime-se da outra para fazer sua travessia. Ou seja, a oração verbal, meditativa ou contemplativa, mesmo que se entregando sem qualquer intencionalidade, pouco estará direcionada à verdadeira e efetiva prece.

Um fraterno abraço e que a paz de Deus esteja com vocês!

 
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Milton Menezes
Enviado por Milton Menezes em 13/01/2014
Reeditado em 13/01/2014
Código do texto: T4648245
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