Sexualidade em questão

Pressão externa tem desvirtuado uso e função sexual

A revista VEJA (Editora Abril, edição 1665, ano 33, nº 36, de 06 de setembro de 2000, páginas 11 a 15) publicou entrevista com a psicanalista inglesa Susie Orbach, de 53 anos, professora da London School of Economics, autora de nove livros, e ficou muito conhecida “graças à popularidade de sua paciente mais famosa, a princesa Diana.”, conforme texto da própria reportagem.

Na referida entrevista, a psicanalista apresenta suas idéias sobre o comportamento sexual entre casais, afirmando que “muitas mulheres estão mentindo quando dizem ter relações todos os dias. Algumas se contentariam com uma vez por mês”. E que ao mesmo tempo “as mulheres escondem sua frequência sexual por vergonha, muitos homens tentam corresponder à exigência da sociedade”.

Indagada se o sexo, então, não é a base da felicidade, respondeu que “essa é uma idéia ultrapassada e perigosa, porque gera insatisfação, medo e vergonha.”

A indústria do sexo imprimiu conceitos de cobrança na mente popular, fruto, é claro, dos milênios de repressão, pressionando homens e mulheres para uma permanente e diária atividade sexual, como se o casamento ou o relacionamento entre homens e mulheres estivesse baseado exclusivamente no sexo. Como se o casamento fosse um diário exclusivo de prazer sexual...

Como é realmente a questão do relacionamento sexual entre cônjuges, diante das cobranças externas e a realidade vivida na intimidade do lar?

O que o Espiritismo diz sobre a questão? Consultemos a Revista Espírita de Allan Kardec.

Em março de 1869, ano XII, da Revista Espírita (edição da Edicel, São Paulo), com o artigo A carne é fraca – estudo fisiológico e moral, o Codificador tece importantes comentários sobre a influência do organismo sobre o moral e vice-versa, na atividade e comportamento do homem. Embora não específico sobre a atividade sexual, a lúcida abordagem fornece excelente conteúdo para análise da questão ora abordada.

Transcrevemos abaixo pequenos trechos das reflexões do Codificador para embasamento ao leitor:

“Um homem não é músico porque tenha a bossa da música, mas tem a bossa da música porque seu espírito é músico.”

“O espírito é o artífice de seu próprio corpo, por assim dizer, modela-o, a fim de apropriá-lo às suas necessidades e à manifestação de suas tendências.”

“Por consequência natural deste princípio, as disposições morais do espírito devem modificar as qualidades do sangue, dar-lhe maior ou menor atividade, provocar uma secreção mais ou menos abundante, de bile ou outros fluidos. É assim, por exemplo, que o glutão sente vir a saliva à vista de um prato apetitoso. Não é o alimento que pode superexcitar o órgão do paladar, pois não há contato; é, pois, o espírito, cuja sensualidade é despertada, que age pelo pensamento sobre esse órgão, ao passo que, sobre um outro espírito, a vista daquele prato nada produz. Dá-se o mesmo em todas as cobiças, todos os desejos provocados pela vista. A diversidade das emoções não se pode explicar, numa porção de casos, senão pela diversidade das qualidades do espírito. Tal é a razão pela qual uma pessoa sensível facilmente derrama lágrimas; não é abundância das lágrimas que dá sensibilidade ao espírito, mas a sensibilidade do espírito que provoca a abundante secreção de lágrimas”.

O mesmo raciocínio pode ser aplicado à cólera ou ao apetite sexual. Não é o corpo que é colérico ou nele o apetite sexual seja intenso. Estas disposições estão no espírito encarnado naquele corpo. Um espírito indolente, na mesma ordem de reflexões, deixa seu corpo mole, se assim podemos nos expressar e no lado oposto um espírito ativo, determinado, fará de seu corpo um instrumento ágil, etc. Também a conhecida frase, usada inclusive pelo Codificador no texto em referência, de que “a emoção lhe fêz subir o sangue” indica claramente que o que pode alterar o sangue são as disposições do espírito.

Outras situações podem também ser citadas: o medo ou até pavor, a imaginação, a coragem, a vontade, o ânimo ou desânimo, a apatia, a dignidade ou a falta dela, a responsabilidade, o temperamento, a perspicácia ou a dificuldade, etc. demonstram virtudes, conquistas ou defeitos do espírito que ocupa corpos transitórios. Claro que ninguém está dispensando a situação oposta, de corpos enfermos ou com limitações de toda ordem que se possa imaginar, que afetam ou dificultam a ação do espírito. Nem tampouco as alterações fisiológicas a que todos estamos sujeitos diariamente e que afetam sim as disposições do espírito. E mesmo ainda os estados mórbidos, determinados por causa externa ou não, acidental e mesmo independente do espírito, como a temperatura, clima, vícios hereditários de constituição, mal-estar passageiro, etc.

O que se quer realçar é que as vontades ou apetites estão na alma. Fisicamente os corpos obedecem ao mesmo determinismo biológico, mas os espíritos que os ocupam detêm personalidades e conquistas morais distintas.

Usando ainda expressão do próprio Codificador, “a carne não é fraca senão porque o espírito é fraco”, pois na verdade a “carne, que não tem pensamento nem vontade, jamais prevalece sobre o espírito, que é o ser pensante e voluntarioso.”

E no caso específico do sexo, vale considerar a energia sexual é diferente em cada ser, modelado pela alma que habita aquele corpo. Não há como padronizar comportamentos e atitudes. A sociedade materialista, de consumo, que dita padrões de comportamento, tenta conduzir os homens como se fossem “boiada”, induzindo-os como se fossem autômatos que devem obedecer pensamentos daquele que elaborou um caminho.

A questão sexual, como tantas outras do comportamento humano em toda a área moral, é uma questão de foro íntimo, de estágios de amadurecimento e conquista evolutiva e inclusive de necessidade distinta de um para outro ser. No caso de cônjuges, seres distintos, essa diferença pode fazer diferença. Daí a necessidade de diálogo entre os parceiros, para que o sexo não seja instrumento avassalador das finalidades primeiras do matrimônio, a felicidade do lar na convivência e progresso da família.

Em tudo, a pessoa há que se sentir bem. Seu referencial individual ditará seu comportamento e ainda abrirá caminhos através do diálogo necessário para o entendimento que se espera, especialmente na área sexual, que não é diferente das demais, apenas foi cravada pelo preconceito e pela repressão através dos milênios, pois na verdade trata-se de energia vibrante concedida pelo Criador.

Em O Livro dos Espíritos, questões 907 e 908, há notáveis esclarecimentos sobre a questão, de forma genérica mas cabível no caso. Porém, remetemos o leitor diretamente à Revista Espírita, a fim de apoderar-se do lúcido pensamento de Kardec, o que fatalmente trará conclusões sobre a sempre presente questão da sexualidade.

Porém, vale citar que a vontade sempre está no espírito. Este é que comanda as atividades do corpo que se utiliza para progredir.

Orson
Enviado por Orson em 06/02/2007
Código do texto: T371439