“Ide e ensinai.”
   5o domingo depois da Páscoa, pelo Calendário Litúrgico Ortodoxo
 
Aproximando-se o tempo em que Jesus devia ser arrebatado deste mundo, ele resolveu dirigir-se a Jerusalém. Enviou diante de si mensageiros que, tendo partido, entraram em uma povoação dos samaritanos para lhe arranjar pousada. Mas não o receberam, por ele dar mostras de que ia para Jerusalém. Vendo isto, Tiago e João disseram: Senhor, queres que mandemos que desça fogo do céu e os consuma? Jesus voltou-se e repreendeu-os severamente. [Não sabeis de que espírito sois animados. O Filho do Homem não veio para perder as vidas dos homens, mas para salvá-las.] Foram então para outra povoação. Enquanto caminhavam, um homem lhe disse: Senhor, seguir-te-ei para onde quer que vás. Jesus replicou-lhe: As raposas têm covas e as aves do céu, ninhos, mas o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça. A outro disse: Segue-me. Mas ele pediu: Senhor, permite-me ir primeiro enterrar meu pai. Mas Jesus disse-lhe: Deixa que os mortos enterrem seus mortos; tu, porém, vai e anuncia o Reino de Deus. Um outro ainda lhe falou: Senhor, seguir-te-ei, mas permite primeiro que me despeça dos que estão em casa. Mas Jesus disse-lhe: Aquele que põe a mão no arado e olha para trás, não é apto para o Reino de Deus.” (Lc 9,51-62)
 
Queridas irmãs, queridos irmãos:

O trecho evangélico transcrito acima, narrado por São Lucas, tem sua síntese na narração de Mateus, quando, Cristo Jesus, próximo de sua transmigração para além deste mundo, reuniu-se no Cenáculo com os seus Discípulos e disse-lhes, de forma categórica: “Portanto, ide e ensinai a todas as nações. Ide por todo o mundo, pregai o Evangelho a toda criatura” (Mt 28,16-20).

Esta é a missão da Igreja Cristã, esta é a nossa verdadeira missão, missão de todos nós.

Entretanto, será que a missão evangelizadora da Igreja cabe apenas àqueles que compõem seu corpo clerical? É de responsabilidade somente dos padres, religiosos e religiosas, diáconos, leigos e leigas consagrados? É claro que não.
Igreja é comunidade, não é instituição, somos todos nós. Ela é a junção de todos que crêem no Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo e pretendem viver pautado em Sua mensagem. Mas ir ao mundo e ensinar a Boa Nova significa apenas sair gritando, pelos quatro cantos do mundo, repetindo as palavras que estão no Evangelho? Creio que não. Vamos juntos refletir, de forma um pouco mais detalhada, sobre a mensagem que Jesus nos deixou no trecho de São Lucas.

Ele inicia buscando pouso, morada provisória em algum lugar que, para tanto, se refere ao povoado dos samaritanos, para dar prosseguimento à Sua caminhada. Com esse intuito, Ele manda mensageiros solicitando pousada.

Jesus não invade, não irrompe qualquer morada, Ele não penetra brutalmente, ou de forma desavisada, à vida de qualquer um. Ele solicita, pede licença e somente adentra quando aceito, quando convidado. Ele envia mensageiros solicitando que seja recepcionado, que seja acolhido, e busca a morada mesmo junto aos samaritanos, historicamente inimigos do povo judeu, mostrando-nos que não há limites para a busca de “Sua moradas”, a todos é solicitada a permissão de Sua entrada, todos devem ser convidados, todos devem ser chamados, sem qualquer distinção.

Nós somos os Seus mensageiros, indo pelo mundo para pedir às pessoas que O acolham em sua morada. Sem discriminação, devemos buscar “abrigo” às palavras do Evangelho, de forma mansa e universal. Tão mansa quanto à forma pacífica indicada por Jesus, mesmo com aqueles que O rejeitam: “Não sabeis de que espírito sois animados. O Filho do Homem não veio para perder as vidas dos homens, mas para salvá-las.” Jamais desistamos da possibilidade de uma salvação, de uma nova intervenção, de uma nova tentativa. Nunca “exterminemos” a chance de uma nova investida, “eliminado” qualquer pessoa, mesmo que, num primeiro momento, rejeite a acolhida de Cristo ou de Seu mensageiro.

Vamos, mas em paz. Procuremos “novas moradas”, mas levando conosco, sempre, o amor e a caridade, mesmo com aqueles que nos rejeitarem, pois sempre deverá haver novas tentativas. O perdão e a compreensão deverá ser repetido “setenta vezes sete” vezes, assim como fora ensinado pelo próprio Cristo a Pedro.

Destaca Jesus, em sua caminhada na busca por “novas moradas”, a importância dos ensinamentos, não somente por palavras, mas, acima de tudo, por atitudes e ações.

Vamos e ensinemos, mas não somente com palavras. Ajamos como verdadeiros mensageiros da Boa Nova, como se fossemos o próprio Cristo presente, pois, na verdade, é Ele que deve viver em nós e por nosso intermédio. Façamos o que Ele faria, ajamos como se Ele estivesse agindo através de você. Assim seremos, verdadeiramente, mensageiros – não apenas de palavras, mas de posturas e ações.

Que não busquemos as covas ou os ninhos, como as raposas ou os pássaros, que não nos apeguemos às nossas moradas, ao nosso cotidiano, às nossas idéias pré-concebidas. Devemos deixar Cristo conduzir nossa vida, Ele é quem deve indicar o caminho, os princípios, as palavras e as atitudes. A nossa missão não é sermos Deus, mas sim, levá-Lo a todos que nos cercam, falando d’Ele e agindo como Ele.

É claro que, ao afirmar que devemos deixar “os mortos enterrar seus mortos” para que possamos “anunciar o Reino de Deus”, assim como deixar para traz nossos entes queridos, Jesus não quis dizer para que abandonemos os mortos no meio da rua, ou que abandonemos as pessoas que amamos. Ele indica-nos, basicamente, o desapego de tudo que temos e que somos neste mundo, para que possamos dedicarmo-nos, por palavras e atos, à missão de evangelização. É obvio que Ele não determinou que tenhamos de abandonar nosso emprego, nossa família, doar todos os nossos bens a quem primeiro encontrar. Sua indicação foi para que coloquemos Suas Palavras acima de qualquer coisa neste mundo. Que possamos, livres da vaidade, do orgulho e do apego, vivermos, de fato, a Boa Nova e, com isso, sermos missionários de Cristo. Anunciando o Evangelho mais pelas ações do que pelas palavras.

Que, de fato, sigamos Jesus, “onde quer que Ele vá”, agindo com a certeza de estarmos ao Seu lado, e que sejamos “aptos para o Reino de Deus”, anunciando o Evangelho através de nossas atitudes.

A Boa Nova transformou a antiga religião de Leis e determinações em uma nova religião de paz, amor, compreensão, desapego e, acima de tudo, transmitida por exemplos, além das palavras.

Este mundo “reprovou” Jesus, a ponto de persegui-Lo e matá-Lo. É por isso que há, em seus ensinamentos, tanta ênfase para que nossa missão seja despregada “deste mundo”. Isso significa que, tudo aquilo que “este mundo” aponta como atrativo e importante deve ser “abandonado”, pois é a inevitável luta entre o Reino de Deus e “este mundo”, e que sigamos Jesus, em Suas palavras e Suas ações, sendo tal postura fundamental para a nossa missão evangelizadora.

Cristo, porém, com Sua gloriosa ressurreição, venceu a morte, não pelo poder de Sua natureza humana, mas pelo poder divino, poder este concedido a todos nós que n'Ele cremos, para que possamos anunciar a verdade do Evangelho.

Sintamo-nos, todos, assim, responsáveis pela missão de “ir e ensinar”, indicada por Cristo Jesus, pois para o verdadeiro Cristão esta missão é inseparável da própria vida. Jesus incitou-nos a todos para sermos missionários, todos fomos enviados para vivermos Sua vida e divulgando-a e ensinando como fazê-lo, pois a missão cristã é, fundamentalmente, o anúncio da verdade de Cristo a todos.

Não nos esqueçamos, porém, da mensagem do grande santo russo, São Serafim de Sarov: “Salva-te a ti mesmo e, em tua volta, milhares serão salvos.” Nossas ações como cristãos verdadeiros mobilizarão muito mais do que se repetirmos todas as palavras do evangelho. Creio que nossa constante aproximação de Cristo, ainda vivo e presente, tornar-nos-á muito mais fortes em nossa missão evangelizadora.
Já foi dito que as pessoas não conhecem a Deus, elas O experimentam, e na respostas de sua revelação é que surge a fé e a vontade de segui-Lo, mantendo vivo e presente Jesus Cristo em nosso meio, através de palavras e atos.

Um padre ortodoxo russo deixou-nos a reflexão de que perceber a revelação de Deus é como se fosse a descoberta do coração na alma daquele que o procura, jamais sendo encontrado, apenas, na mente humana. É perda de tempo buscarmos conhecer Deus com explicações racionais da fé, da mesma forma que seria perda de tempo, em nossa missão evangelizadora, tão somente, tentarmos explicar, de forma racional, a Sua presença e a Sua importância.

Descubramos toda essa intensidade da revelação de Deus em nosso ser e, como missionários, permitamos que todos a nossa volta tenham a oportunidade de fazer o mesmo, estimulando-os com nossa fala e nossas ações.

Tenhamos o conhecimento da Palavra e a força para seu anúncio. Porém, sem o nosso exemplo vivo e cotidiano, a força de tal anúncio reduzir-se-á de forma significativa.

Que sintamos, sempre, Deus presente em nós!

 
Milton Menezes
Enviado por Milton Menezes em 25/05/2011
Código do texto: T2992554
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