Domingo de Ramos

Uma grande multidão de judeus veio a saber que Jesus lá estava; e chegou, não somente por causa de Jesus, mas ainda para ver Lázaro, que ele ressuscitara. Mas os príncipes dos sacerdotes resolveram tirar a vida também a Lázaro, porque muitos judeus, por causa dele, se afastavam e acreditavam em Jesus. No dia seguinte, uma grande multidão que tinha vindo à festa em Jerusalém ouviu dizer que Jesus se ia aproximando. Saíram-lhe ao encontro com ramos de palmas, exclamando: Hosana! Bendito o que vem em nome do Senhor, o rei de Israel! Tendo Jesus encontrado um jumentinho, montou nele, segundo o que está escrito: Não temas, filha de Sião, eis que vem o teu rei montado num filho de jumenta (Zc 9,9). Os seus discípulos a princípio não compreendiam essas coisas, mas, quando Jesus foi glorificado, então se lembraram de que isto estava escrito a seu respeito e de que assim lho fizeram. A multidão, pois, que se achava com ele, quando chamara Lázaro do sepulcro e o ressuscitara, aclamava-o. Por isso o povo lhe saía ao encontro, porque tinha ouvido que Jesus fizera aquele milagre. Mas os fariseus disseram entre si: Vede! Nada adiantamos! Reparai que todo mundo corre após ele!” (Jo 12,9-19)
 
A entrada triunfante Jesus em Jerusalém é também narrada pelos três outros evangelistas, além de João (Mt 21; Mc 11; Lc 19). Porém, optamos pela narrativa do evangelista João por ser o único a mencionar o episódio da ressurreição de Lázaro, antecedendo a chegada de Jesus em Jerusalém.

Lázaro, discípulo amigo de Jesus, por Ele ressuscitado, fora citado pelos fariseus nesta passagem, como alvo de ira e desejo de morte, pelo milagre nele ocorrido, fato que levou muitos a crerem em Jesus como o verdadeiro Cristo.

Apesar do ponto central dessa passagem ser a entrada de Jesus em Jerusalém, gostaríamos de, sinteticamente, levantar algumas aspectos sobre a ressurreição de Lázaro, para podermos vinculá-la à festa de ramos, enriquecendo, assim, tal reflexão.

Diferentemente do senso comum, toda morte dá início a um fato sucessivo, podendo ser vista, não como o fim, mas como o começo. A morte da semente dá vida à árvore; a morte do feto dá vida ao novo recém nascido; milhões de células que morrem, a cada minuto, em nosso organismo, dão vida a outros milhões. Toda morte gera um novo começo.

Para que nos vinculemos a Cristo Jesus, para que o acolhamos em nossa vida, para que entreguemos nosso ser em Suas mão, para que seja feita a Sua vontade, faz-se necessário que morramos para o mundo, que morramos para tudo aquilo que nos afasta de nosso Salvador. Já apontamos em reflexões anteriores que, para ressuscitarmos com Jesus e com Ele vivermos à eternidade, precisamos, antes, acompanhá-lo em seu calvário, carregarmos nossa cruz e, com Ele, sermos crucificados e mortos. Não a morte física, o sofrimento carnal, mas a morte para o mal, para o egoísmo, para o orgulho, para a soberba, para a vaidade, em fim, para tudo que obstaculiza nossa caminhada rumo à gloriosa ressurreição.

Pensemos que foi desta morte que Lázaro vivenciou. Para que ele pudesse ser ressuscitado por Jesus, necessariamente, ele deveria ter morrido para as coisas do mundo, permitindo que Cristo Jesus pudesse dar-lhe a genuína liberdade, a real salvação, a verdadeira vida. Esse, de fato, fora o maior dos milagres!

Algo de especial, além do retorno à vida física, ocorrera com Lázaro. Apesar de ser um fato espetacular, dar-se a vida a alguém que já morrera, esse episódio foi narrado, somente, por São João (não o encontramos nos demais evangelhos), o que reforça a existência de algo maior, algo que vai além de um retorno à vida biológica. Pois, se a ressurreição de um morto, para nós, já é um fato inusitado, dar a ele a vida eterna, após sua morte para o mundo, é algo inimaginável, para a limitada compreensão humana.

De qualquer forma, o fato fora tão importante, segundo São João, que Lázaro passou a ser alvo de morte para os fariseus. A conversão retumbante de alguém, tendo ele recebido “nova vida”, “vida plena”, “vida eterna”, é um risco destacável à burocrática religião defendida pelos fariseus e doutores da Lei. Cuja prática, rituais, normas e formas eram muito mais importantes que o cuidado amoroso com o próximo, que a espiritualidade que rege as ações do bem, que o sentido da pratica caridosa com o outro. Para eles, a forma era muito mais importante que o conteúdo. Era tudo que Jesus Cristo combatia. É obvio que Lázaro, representando a mudança de conteúdo, a ressurreição da vida espiritual, sua morte para as coisas do mundo e o início de uma vida plena em Cristo, deveria ser perseguido e alvo de extermínio. Ele transformara-se em um grande risco para a estabilidade das instituições religiosas formais, à época.

É nesse clima que entra Jesus em Jerusalém. Como aquele que ressuscitara um morto para a vida, como o verdadeiro rei de Israel, como aquele que veio em nome do Senhor – um grande espetáculo para o povo. Sua recepção com ramos, com alegria e júbilo daqueles que o recebiam, representava a festa da aparência, a festa da esperança da solução de problemas pessoais, a festa para se obter a paz e a alegria limitadas às coisas deste mundo, pois, normalmente, é apenas com elas que as pessoas se preocupam, em seu cotidiano. Normalmente, as pessoas não são contra nem a favor de Jesus, ela desejam os espetáculos e os milagres que possam melhorar sua vida. Vieram, à época, ao seu encontro, por ser um “fazedor de milagres”. Será que, na maioria das vezes, vamos a Ele com esse mesmo intuito?

Quantas vezes recebemos Cristo em nossa vida, com júbilo e ramos de árvores nas mãos, acreditando que Ele trará alegria, satisfação, conforto e sossego para nossa atribulada vida neste mundo? Quantas vezes O recebemos com festas, pela felicidade diante de um grande feito que nos rendeu mais dinheiro e alegria? Quantas pessoas foram ao encontro de Jesus, ao entrar em Jerusalém, para conhecer aquele que teria ressuscitado um morto, sem saber no entanto, que tal ressurreição não era pirotécnica, não era física, mas a ressurreição de um homem que nEle creu e passou a viver com Ele à eternidade? Teriam elas tido a mesma “curiosidade” se soubessem que a nova vida concedida ao discípulo amado de Jesus fora a vida abundante em Sua companhia – a ressurreição espiritual? Procuramos Jesus Cristo, em nossas orações, com a certeza de que nada neste mundo é importante, buscando, somente, a grande paz do Senhor que está fora daqui, que está no reino dos céus? Os mártires morriam cantando, felizes, não pelo sofrimento físico, não pela dor, mas pela possibilidade de se encontrarem com Deus e com Ele usufruírem da paz e da vida eternas.

O povo recepcionou jubilosamente Jesus em Sua entrada em Jerusalém, uma semana antes de condená-lo à morte. Enorme mudança e em período tão curto. Receberam o seu salvador, aquele que iria resolver seus problemas, aquele que passaria a reinar Israel, aquele que iria substituir Davi na união do povo escolhido, porém Ele oferecia seu reino pelo caminho do amor, da paz e da humildade. Ninguém estava preparado para isso. Poderia, este rei ser aceito pelos homens que buscam a glória, a riqueza e as conquistas mundanas diárias? Pode esse Deus ser recebido por cada um de nós, em nosso dia-a-dia? Estamos preparados para Ele, hoje?

Reflitamos sobre o domingo de ramos, daquela época e os de cada dia. Recepcionemos, sim, a entrada de Jesus Cristo em nossa vida, mas não para a solução de nossos problemas atuais, não para nos libertarmos de dificuldades e labores, mas, acima de tudo, para que Ele ressuscite-nos, como fez com Lázaro, ajudando-nos a morrer para as coisas sem importância desde mundo, com vistas a colocá-Lo, de fato, como centro de nossa vida. Busquemos a verdadeira paz do Senhor, não somente a efêmera alegria deste mundo.

Que recepcionemos Jesus com ramos de árvore, acolhendo-O, verdadeiramente, em nossa vida, seguindo com Ele em seu calvário e morte para as coisas passageiras deste mundo, para que, também com Ele, possamos, viver verdadeiramente, após a ressurreição. 

Fiquem com Deus!


Milton Menezes
Enviado por Milton Menezes em 14/04/2011
Código do texto: T2908388
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