Se eu pudesse
Hoje acordei cedo e me deparei enfrente ao espelho. Inesperadamente me coloquei a pensar e então veio àquela frase exclamativa “se eu pudesse...” e por longos minutos não saí dela, pois não consegui completar a frase.
Inevitavelmente questionei o mais íntimo de mim, então, percebi que esta frase estava completamente errada em minha vida. Só ali diante da minha própria imagem, me dei conta de quanto fui egoísta, negligente, omisso, fraco e pessimista. Nunca havia me dado conta, que “se eu pudesse...” havia tomado conta de minha vida e com isso eu perdia as coisas mais simples ao redor de mim. Então me lembrei de um pequeno versículo bíblico em uma das epístolas de São Paulo onde se lê “Tudo posso naquele que me fortalece”. Caiu como uma luva para a ocasião.
Decididamente, mudei a frase exclamativa “se eu pudesse” para uma frase afirmativa, sem utopias ou fantasias “eu posso”. Eu posso sorrir, ver o sol se pondo, correr ao encontro da pessoa amada, traçar metas e projetos, conquistar meu espaço, sentir a brisa leve da manhã, ouvir o som dos pássaros, a algazarra das crianças, o burburinho das pessoas que passam por mim... Posso derrubar as barreiras dentro de mim, amparar meu irmão quando tudo parecer desabar ao seu redor, mudar o meu mundo, dormir e sonhar, ter esperanças verdadeiras, percorrer mares e desbravar montanhas, ir além daquilo que eu mesmo planejei pra mim.
Posso ser melhor, posso ser eu mesmo, sem máscaras. Sim, São Paulo tem toda a razão, eu só posso tudo porque a força propulsora dentro de mim é Deus, o Senhor da vida, o Conhecedor do interior humano. Só Ele pode me fortalecer para vencer meus próprios obstáculos. Como fui egoisticamente trágico no decorrer desses anos, nunca tinha sequer sentido o quanto Deus é generoso comigo. Por isso, Senhor, peço seu perdão, pois decidi não voltar atrás.
O espelho revelou a minha face oculta, meu mau comportamento diante de Deus, dos homens e de mim mesmo. Todas as vezes que eu dizia “se eu pudesse...” o mundo se fechava para mim, pois ali se encontrava alguém totalmente medroso, alguém incapaz de ir além de si mesmo, alguém desconfiado e perdido. Como fui tolo, em não perceber que minha incapacidade estava ligada ao “se eu pudesse”, pois nunca ousei, sempre fui pessimista para aceitar tudo como verdades prontas e programadas. Nunca questionei o óbvio que os outros me impunham, nunca sonhei em ter minhas próprias idéias, pois sempre me deixei levar pelas idéias alheias. Quantas vezes eu disse: “se eu pudesse ter um emprego satisfatório”, “se eu pudesse estudar mais”, “se eu pudesse ir passear com meus amigos”, “se eu pudesse dizer tudo o que sinto”, “se eu pudesse ter mais saúde”, “se eu pudesse conversar com aquela garota”.
Tudo isso me limitava, e eu, sem querer, me tornava um cenário morto no palco da vida, alguém que caminhava, só por caminhar, que falava, só por falar, que repetia tudo para satisfazer às pessoas. Diante do espelho, notei que o jovem talentoso se esvaía de dentro de mim, os olhos já não tinham o mesmo brilho de antes. Bem ali estava um ser derrotado e vencido por ele próprio, mas com aquele empurrão de Deus, ergui novamente os olhos e passei a analisar os detalhes da minha vida. Era preciso mudar. Mudar meus argumentos, mudar de atitudes, mudar de rumo, ir realmente ao encontro de valores até então esquecidos dentro de mim.
O que eu estava procurando tão longe estava ali tão perto e tão acessível a mim. Chorei muito, mas de alegria, pois o segredo havia sido descoberto. Comecei a notar que todas as minhas frustrações caíram por terra, porque eu fui capaz de vencê-las. Daquele momento em diante os minutos pareciam horas e eu não parava de repetir “eu posso”, “eu posso”, “eu posso” e uma paz invadiu a minha alma e olhei profundamente nos meus olhos refletidos no espelho e os vi renascer e sorrir.