A cadeira, a cruz e a ausência.
Olhar para a cadeira pintada por Van Gogh é encontrar aquilo que já se foi. O quadro é simples, tendo como objeto central uma velha cadeira de palha. Com um olhar mais atento observamos um cachimbo e ao seu lado algo parecido com cinzas de fumo... Atrás da cadeira também vemos uma caixa de madeira, parte dela... O que mais nos marca ao vermos este quadro não é bem o que nele contém, mas aquilo que nos remete... Somos lançados para o desconhecido, para uma ausência. Alguns se perguntam sobre quem era a pessoa que fumava seu cachimbo, outros vão mais além, lembram-se da casa de seus avós, da saudade da infância, sentimos saudade daquilo que nos cativou. Para o autor da obra este quadro poderia ter outro significado, porém o mistério deste quadro é justamente este, não há objetividade, em sua simplicidade a pintura nos leva ao desconhecido, a vários sentimentos como busca, saudade, nostalgia... Ao pensarmos sobre este quadro passamos a entender sobre os símbolos, sua importância e como são fontes inesgotáveis de sentidos inacabáveis...
As crianças são especialistas na arte de enxergar símbolos. Teus desenhos lhes fazem sonhar, possuem dinamismo, possuem histórias cheias de significado. Quando adultos temos uma tendência a ignorar estes valores, somos até mesmo arrogantes em nossos métodos e concepções acerca do que é arte, do que é concreto e verdadeiro. Talvez por isso os adultos, na história do Pequeno Príncipe, não conseguiam ver o desenho da jibóia engolindo um animal, viam apenas um chapéu, não conseguiam sonhar com aquele desenho mesmo que a criança lhe explicasse o sentido original. “As pessoas grandes não compreendem nada sozinhas, e é cansativo, para as crianças, estar toda hora explicando.” [1]
Para a fé cristã os símbolos são essenciais. É com fé se relatou os eventos bíblicos e é com fé que devemos lê-la. Da verdade da Páscoa depende a fé cristã. “... se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa pregação e vã a vossa fé” (1 Corintios 15.14). Refletindo sobre a obra de Van Gogh logo me lembro da Cruz. A cruz vazia nos remete a ressurreição. Ao olhá-la procuramos por Cristo, lembramos de Cristo. Quando percebemos a cruz pelos olhos da ressurreição, esta não se faz como um ato isolado do passado, mas como realidade do presente. Não temos provas da ressurreição. O sepulcro vazio nos mostra que ele não estava mais lá, mas nada prova sobre a ressurreição. A aparição de Cristo aos jovens no caminho para Emaús também não é prova, poderiam dizer que se tratava de uma interpretação subjetiva dos discípulos. As aparições pascais tiveram o seu tempo, elas não se repetiram em épocas posteriores ( 1 Corintios 15.8). A fé na ressurreição não se baseia somente no que apóstolos e as mulheres (Lucas 24.1-12) disseram. Jesus não deixa de revelar-se como vivo aos que nele depositam sua confiança. A realidade da ressurreição é dinâmica, ela ocorre como um fato no passado e como um fato do presente. Quem procurá-lo entre os vivos o encontrará. No Espírito Santo o Cristo vive em nós (Atos 2.1 ss, João 14.16 ss) .
Assim como aquela pessoa que se lembrou do aconchego da casa dos avós ao ver a cadeira vazia. Ao ver a cruz a pessoa que sentiu o amor presente na relação com Cristo se lembra deste, se conforta no fato de que apesar da cruz, houve ressurreição. A simples ausência não caracteriza a saudade, pois não temos saudade de tudo que ocorreu no passado, sentimos saudade daquilo que nos trouxe amor, que nos cativou. A cruz vazia não remete à ressurreição se o amor de Cristo por meio da fé não se fizer presente. O convite feito pela ressurreição é de se crer que a realidade que estamos acostumados, realidade de sofrimento, de tragédias, dores, morte, fuga da morte seja substituída pela realidade da ressurreição. Em que não vivamos como se fôssemos imortais, ignorando tudo o remete a morte, fugindo de tudo que é miséria, desespero, doença. Mas o contrário, encontremos Cristo vivo e oferecemos combate à injustiça, ao ódio, à violência, a toda morte nesse mundo. Em que não fugimos da morte, mas oferecemos resistência a ela.
“- O essencial é invisível para os olhos, repetiu o principezinho, a fim de se lembrar.” [2]
Referencias indiretas:
Joyce Rodrigues de Azevedo – Interpretações sobre a Cadeira de Van Gogh.
José S. Croatto - As Linguagens da Experiência Religiosa.
Paul Tillich - A dinâmica da fé.
Rubem Alves – Eu creio na ressurreição do corpo.
Referencias diretas:
Antoine de Saint-Exupéry - O Pequeno Príncipe([1] p. 02, [2] p. 32)