I.

Amanheceu.
A chuva mancha de cinza a paisagem.
Esta noite pensei em ti.
Pensei em todas as vezes em que olhamos a chuva juntos.
Lembrei da manhã em que me dissestes que a chuva era a bênção da Mãe sob a Terra.
Fechei os olhos e tentei sentir a dor.
Os cacos de vidro transpassavam a minha carne.
Sangrava.
Mas eu não sentia dor.
Vi você se levantar e caminhar até mim.
Minhas mãos desesperadas tentavam alcançar as suas, estendidas para mim.
Minha alma gritava. Mas o som não saia.
Vi você indo embora de mim.
Deus, como eu queria poder mudar o tempo...
Hoje eu vi a chuva abençoar a Terra.
Vi que uma nova planta nascia no jardim da minha casa.
Vi que a Esperança sempre se renova, junto com a Vida.
Mas você não. Você não volta.
Olho para o céu e sinto a chuva beijar meu rosto.
Um beijo gelado.
Os pingos atravessam minha camisola.
Lembro do seu abraço.
Lembro que tentei ir ao teu encontro, mas falhei.
A chuva aumenta.
E já nem sei se o som que ouço são suas gotas ou minhas lágrimas.
Olho para o chão e me vejo em mil pedaços de vidro.
Sei que tenho que juntar os cacos e recomeçar.
Como já fiz tantas vezes.
Sou uma guerreira. Sou filha da Terra.
Um dia nos encontraremos.
Mas não hoje.
Não ainda.

Até breve.