O CORVO DO PLANALTO

O CORVO DO PLANALTO

Um dia eu refletia, à meia-noite erma e sombria

As leis, dogmas e manuais, a Constituição, seus anais

Exausto, exaurido, quase adormecido, ouvi súbito ruído

Tal qual alguém deprimido abatendo as leis no Palácio

No Palácio do Planalto. Fiquei a pensar: quem, quem

A soberania popular quer acabar???

Eu me lembro. Eram uns tórridos setembros, outubros

Novembros. Um fogo agônico se dizia cômico, insaciável

No chão das urnas animava suas turbas fantasmais

Ansiando por uma noite infinda, arbitrária, tirânica

Parcial. A medicação amarga que sua bela Michela

Nas igrejas evangélicas, propagava o idioma ditatorial.

Os passos incertos na surdina evocavam cadáveres

Dos torturados pelo regime sepulcral. Uma pávida

Arritmia em meu coração agia no desassossego zurzia

Repetidamente, o mórbido habitante do Planalto

Fazendo discursos à revelia do regime democrático

Eu me consolava dizendo: apenas discurso, nada mais.

Ergui-me da poltrona sem hesitar, falei-me na sala

De jantar: “senhora, que estais com isso a tramar”???

Não vedes nesse senhorio do Palácio um alienado

Que do Planalto está a vituperar contra a Lei, contra

A ordem e a democracia que deseja menosprezar???

Mas na alma da mulher só havia neblina, nada mais.

Busquei na noite planaltina intranquila, perquiri-la:

“Por que sonhas e anseias com milicianos carnavais???

Não basta o longo período de medo, ânsias e agonias

Que de 1° de abril de sessenta e quatro a 15 de março

De mil novecentos e oitenta e cinco, ousou desafiar

Instituições e leis de um país deprimido, desolado???

Com alma exaltada não vês que defendes os ruídos

E as patranhas caraminholas desse teu cônjuge gabola

Que se diz ao país “imbroxável”??? Quem, minha cara

Senhora quer saber dessa sua intimidade, se broxa ou

“Imbroxável”??? O país deseja ser sadio e governável

E sair desse vento agourento que ora sopra no Planalto.

Da janela do apartamento vejo o tumulto que ele

Causa. A cultura asnada de caminhoneiros insanos

A travar o trânsito normativo nas estradas. Ele, cara

Dama, se julga mesmo um mito cafajeste, um fidalgo

Das casernas de um país de capitanias hereditárias???

Não vês, madama, o traçado traiçoeiro dessa trama???

A ave antidemocrática do Corvo do Planalto querendo

Alçar voo mentecapto contra as instituições democráticas

Pretendes fazer valer, oh cara dama, o espectro sombrio

E todo o desvario autoritário do qual o país, a muito custo

Libertou-se??? Representais por acaso a “alma da noite”

Desejas assombrar os países do Trópico de Capricórnio???

Por que defendes a ave rude dessa esfinge em tua cama

Essa ave de asas turvas, que se faz surgir das criptas

E catacumbas, empoleirada na casta obscura do Planalto

Central do orçamento secreto. Sabes o que é emenda

Emenda de Relator??? Por que te entregas a defender

A serpente enroscada na terra lavrada das rachadinhas???

Não ouves os gritos do país nas urnas que deram o recado:

“O "imbroxável" nunca, nunca mais". Não tens ouvidos

Que ouçam essas sílabas para ti e os teus milicianos

De colo, acatais: por que não se vão embora suas

Mágoas ancestrais de migrantes. Por que não param

De se vingar no povo do país que querem desgovernar???

O “imbroxável" nunca, nunca mais. Ele fala as palavras

Que ecoam raivosas no coração desse país que quer paz

O Corvo do Planalto não dá trégua ao seu ódio, à ira

Dos que desejam semear a implacável tortura de seus

Milicianos da amargura. As urnas disseram a eles:

“Nunca, nunca mais”. Nunca, nunca outra vez jamais.

O Corvo do Planalto quando sorri mostra a triste face

Tão antiga dos que existem apenas para fazer valer

A avidez, a fome da ambição, a mesquinhez deles,

Dos que habitam sua particular bolha de privilégios

Mergulhados em suas poltronas, no conforto do teto

De gastos de portais secretos, covardes, imperiais.

Ao Corvo do Planalto e a seus defensores, as urnas

Da democracia disseram: ”nunca, nunca jamais”

A ave soturna, carrancuda, nervosa queima agora

Em seus abismos secretos conjunturais. Incandescente

O Corvo planaltino roça o bico em suas partes vitais

Absorto e mudo reclinado a ouvir: “nunca, nunca mais”.

O ar que lhe cerca, viciado e denso, penetra em suas

Narinas o incenso perfumado das urnas que de dentro

Em seu cérebro perturbado ecoam: o “imbroxável"

Nunca, nunca jamais. O Deus Et lhe deu tributos

Cortesias e vassalagens daqueles militares que dele

Cercaram-se de encantamentos oficiais, rudimentares.

Estes, finalmente ouviram ecoar em suas inconscientes

Tramas palacianas, o hino nacional do bicentenário

Do povo heroico, o brado retumbante: o "imbroxável"

Nunca, nunca jamais”. Ave infernal estás a se contorcer

Em chamas terríveis, insuportáveis, mefistofélicas

O próprio Corvo repetiu a si mesmo: “nunca, jamais”.

Oh ser do mal, Ah ave infernal a quem os teus chamam

De mito de circo, tua alma atroz sente-se distante, muito

Distante das benesses do Éden. Tua Michela de chinela

Os seus passos ao teu lado ecoam, repetindo-se soam

Repercutem em teu cérebro, em tua mente carente:

Nunca, nunca jamais. O “imbroxável” não terá paz.

A tempestade incendeia seus neurônios infernais

A chuva de mentiras propaladas em seus sites, suas

Fake-news, seu facebook, suas redes sociais clamam

— Quem diria, o "imbroxável" nunca, nunca jamais.

Seus próprios corvos filiais repetem o mantra do dia

Em sânscrito, em todas as línguas e linguagens filiais:

— “O mito de circo dos horrores, nunca, nunca mais”.

Até o busto de Minerva, inerte sobre a mesa da sala

Sob o abajur lilás, se fez de um olhar medonho

Como se fosse agora um anjo do mal. A luz da lâmpada

Disforme projeta sobre o chão da sala e do quarto

De dormir a sombra sonora: “nunca, outra vez jamais”.

Não há de se erguer nunca. Nunca outra vez jamais.

DECIO GOODNEWS
Enviado por DECIO GOODNEWS em 01/11/2022
Reeditado em 04/11/2022
Código do texto: T7640604
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