JEREMIAS em foco! - Jr1

Jeremias, nosso segundo profeta maior quanto ao seu posicionamento no livro sagrado (após Isaías), talvez devesse ser considerado o primeiro, tanto se o analisássemos do ponto de vista do seu alcance profético, uma vez que o Senhor expande seu ministério – “às nações te dei por profeta” (Jr 1.5), bem como pelo sofrimento e amargura resultantes de sua atuação. Seu desabafo é único – “Maldito o dia em que nasci... Maldito o homem que deu as novas a meu pai... Por que não me matou na madre? Por que saí da madre, para ver trabalho e tristeza, e para que os meus dias se consumam na vergonha?” (20.14-18). Não lembram as palavras de Jó?!

Jeremias era filho de sacerdote, e de se esperar teria um ‘futuro pomposo e promissor’ que a lei mosaica lhe assegurava. Mas o chamado divino o tiraria da comodidade da vida no templo de Salomão, para castigar já do lado de fora – e antecipando a destruição física deste mesmo templo – os impenitentes, profanos e arrogantes de seu tempo.

“Olha, ponho-te neste dia sobre as nações, e sobre os reinos, para arrancares, e para derrubares, e para destruíres, e para arruinares [os alicerces do pecado e da corrupção]; e também para edificares e para plantares [os alicerces do reino de Deus em santidade e justiça]” (1.10).

É costume datar seu chamado pela infância, levando em conta suas palavras – “Ah, Senhor Deus! Eis que não sei falar; porque ainda sou um menino” (1.6).

Mas proponho algo diferente, visto que o escritor de Hebreus também usou esta figura ao falar do seu povo.

“Porque, devendo já ser mestres pelo tempo, ainda necessitais de que se vos torne a ensinar... e vos haveis feito tais que necessitais de leite, e não de sólido mantimento. Porque qualquer que ainda se alimenta de leite não está experimentado na palavra da justiça, porque é menino” (Hb 5.12-13).

Acredito que ele já oficiava como sacerdote no templo ao ser separado por Deus, portanto desde que completou 30 anos, como a lei o requeria – “Da idade de trinta anos para cima, até aos cinquenta, contarás a todo aquele que entrar neste serviço, para administrar o ministério da tenda da congregação” (Nm 4.30).

Outro indício interessante está em certa diferença quanto ao seu chamado em relação ao profeta anterior, Isaías, que teve seus lábios purificados com uma tenaz tirada do altar celeste por um serafim (Is 6.6), enquanto Jeremias recebeu um toque diretamente das mãos de Deus em sua boca, não para purificação, mas para recepção de Suas palavras. Isto porque ele já estava devidamente purificado pelo ministério que já exercia no templo terrestre, imagem do celestial. Quem pode garantir que ele não tenha sido chamado por Deus dentro do templo em pleno ministério, como Zacarias, pai de João Batista? (Leia Lucas 1 e veja o que pode ter acontecido como em espelho).

“E estendeu o Senhor a sua mão, e tocou-me na boca; e disse-me o Senhor: Eis que ponho as minhas palavras na tua boca” (1.9).

Provavelmente então, sua alegada ‘meninice’ se referia ao pouco tempo em que servia ao tabernáculo. Sua imaturidade ministerial certamente o privava da experiência, como ponto negativo, mas também o salvaguardou da contaminação, como ponto positivo.

Seu alvo será quádruplo – primariamente os reis, sacerdotes e profetas, e secundariamente o povo. Pelo menos 5 passagens unem os 3 primeiros grupos (responsáveis pela direção do povo) sob uma mesma condenação (2.26; 4.9; 8.1; 13.13; 32.32), sem contar tantas outras que os encurralam separadamente. Basta um exemplo.

“Assim diz o Senhor: Eis que eu encherei de embriaguez a todos os habitantes desta terra, e aos reis da estirpe de Davi, que estão assentados sobre o seu trono, e aos sacerdotes, e aos profetas, e a todos os habitantes de Jerusalém” (13.13).

Jeremias é repleto de figuras que se enquadram perfeitamente ao período final da Igreja, uma vez que todo final de dispensação (no mesmo sentido de uma semeadura em que se espera pelos frutos), carrega os mesmos ingredientes contaminantes.

A famosa figura que o apóstolo Paulo usa para descrever o enxerto da oliveira brava sobre os ramos naturais, têm sua base típica aqui em Jeremias.

Por fim, suas palavras serão duras, perfurantes, não suavizadas ou maquiadas, apropriadas a um tempo rebelde como aquele. A resposta dos ouvintes soará em mesmo tom, levadas em conta por Deus para sua condenação final e cabal, “porque por tuas palavras serás justificado, e por tuas palavras serás condenado” (Mt 12.37).

Há sempre um tempo limite em que o clamor dos ímpios não pode ser ouvido.

“Tu, pois, não ores por este povo, nem levantes por ele clamor nem oração; porque não os ouvirei no tempo em que eles clamarem a mim, por causa do seu mal” (11.14).

E há sempre um tempo em que mesmo o clamor dos justos por eles não será aceito.

“Tu [Jeremias], pois, não ores por este povo, nem levantes por ele clamor ou oração, nem me supliques, porque eu não te ouvirei” (7.16).