A grande (des)ilusão - Ec3
Muitos estranhariam a desilusão desmedida de Salomão, exatamente por buscar desenfreadamente as mesmas coisas e jamais cogitarem que poderão ser uma armadilha ao final da jornada debaixo do sol.
As frias palavras de Salomão são piores do que se pensaria ouvir de alguém que nunca as tivesse encontrado.
“Assim eu disse no meu coração: Como acontece ao tolo, assim me sucederá a mim; por que então busquei eu mais a sabedoria?... Porque nunca haverá mais lembrança do sábio do que do tolo; porquanto de tudo, nos dias futuros, total esquecimento haverá. E como morre o sábio, assim morre o tolo! Por isso odiei esta vida...” (2.15-17).
Quanto ao destino de todo homem, Paulo arremataria sem maquiagens.
“Porque todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus... Porque o salário do pecado é a morte” (Rm 3.23; 6.23).
Mas as palavras de Salomão demonstram que seu desespero impedia sua real visão das coisas. A prova de que sua sabedoria não seria esquecida juntamente com a tolice dos demais, está no simples fato de que estamos analisando suas palavras que perduraram até agora.
Mas ele continua descendo em seu abismo, rebaixando a dignidade humana.
“Vi mais debaixo do sol que no lugar do juízo havia impiedade, e no lugar da justiça havia iniquidade. Eu disse no meu coração: Deus julgará o justo e o ímpio; porque há um tempo para todo o propósito e para toda a obra. Disse eu no meu coração, quanto a condição dos filhos dos homens, que Deus os provaria, para que assim pudessem ver que são em si mesmos como os animais. Porque o que sucede aos filhos dos homens, isso mesmo também sucede aos animais, e lhes sucede a mesma coisa; como morre um, assim morre o outro; e todos têm o mesmo fôlego, e a vantagem dos homens sobre os animais não é nenhuma, porque todos são vaidade. Todos vão para um lugar; todos foram feitos do pó, e todos voltarão ao pó. Quem sabe que o fôlego do homem vai para cima, e que o fôlego dos animais vai para baixo da terra?” (3.16-21).
Se ele tivesse se agarrado ao princípio da criação do homem em Gênesis, ele não falaria tais palavras. O Rei prometido – Jesus – vai desafiar toda conclusão ressecada pelo sol.
“Mais é a vida do que o sustento, e o corpo mais do que as vestes. Considerai os corvos, que nem semeiam, nem segam, nem têm despensa nem celeiro, e Deus os alimenta; quanto mais valeis vós do que as aves?” (Lc 12.23-24).
E quanto ao destino das almas, sua sabedoria foi ofuscada mesmo diante do exemplo de Moisés, mas que Jesus sabia interpretar perfeitamente.
“E que os mortos hão de ressuscitar também o mostrou Moisés junto da sarça, quando chama ao Senhor Deus de Abraão, e Deus de Isaque, e Deus de Jacó. Ora, Deus não é Deus de mortos, mas de vivos; porque para ele vivem todos [todos estes que mantiveram um relacionamento vivo com Deus, conclusão dentro do contexto maior de toda a Escritura]” (Lc 20.37-38).
Mas ele desce mais um pouco, no desejo insano e egoísta da não-existência.
“Eis que vi as lágrimas dos que foram oprimidos e dos que não têm consolador, e a força estava do lado dos seus opressores; mas eles não tinham consolador. Por isso eu louvei os que já morreram, mais do que os que vivem ainda. E melhor que uns e outros é aquele que ainda não é; que não viu as más obras que se fazem debaixo do sol” (4.1-3).
Jó também apelou a esta injeção letal de pensamento no auge de sua dor. Mas o Consolador lhe apareceu ao final, alternando todas as condições presentes. Podemos não entender na maior parte das vezes nossa própria condição e tudo o que nos cerca, mas a Palavra de Deus não admite tal inexistência, e não nos desculpa pela ignorância ou rebeldia.
O próprio fato de que “também Cristo padeceu uma vez pelos pecados, o justo pelos injustos, para levar-nos a Deus” (1 Pe 3.18), comprova que o pensamento da ‘extinção’ é inexistente em Deus, pois somente “Deus... vivifica os mortos, e chama as coisas que não são como se já fossem” (Rm 4.17).
Diante destes conceitos deturpados pela obscuridade da depressão e pela dificuldade e enfado que era tentar entender os caminhos de Deus, não restava a ele concluir se não o lema de nosso próprio tempo.
“Eis aqui o que eu vi, uma boa e bela coisa: comer e beber, e gozar cada um do bem de todo o seu trabalho, em que trabalhou debaixo do sol, todos os dias de vida que Deus lhe deu, porque esta é a sua porção [ou não espere nada melhor que isto]” (5.18).
Este é o conceito debaixo do sol, mas não o que está acima dele.
“E Jesus lhe respondeu, dizendo: Está escrito que nem só de pão viverá o homem, mas de toda a palavra de Deus... Eu sou o pão da vida... Este é o pão que desce do céu, para que o que dele comer não morra. Eu sou o pão vivo que desceu do céu; se alguém comer deste pão, viverá para sempre; e o pão que eu der é a minha carne, que eu darei pela vida do mundo” (Lc 4.4; Jo 6.48-51).
Salomão em toda sua sabedoria não entendeu estas coisas.
Mas Deus espera que você as entenda, pois foram “escritas para aviso nosso, para quem já são chegados os fins dos séculos” (1 Co 10.11).