O Beemote – em carne e espírito - Jó7

Finalmente, depois de todo embate espiritual entre Jó e seus amigos, o próprio Deus aparece em um redemoinho e começa – não a responder – mas a perguntar a Jó sobre vários temas comuns da vida. Podemos dividir seu longo questionamento em duas partes.

Os capítulos 38 e 39 tratam de muitos assuntos da vida cotidiana. Deus pergunta sobre a criação da terra, do mar e seus limites, das nuvens, o amanhecer – pergunta sobre o mundo dos mortos... Passa para a neve entesourada para o “tempo da angústia” (38:23), numa clara alusão ao julgamento final. Sobe até as constelações de Órion e da Ursa. Vai ao reino animal perguntando sobre os leões, os corvos, as cabras montesas, o jumento bravo, o boi selvagem, a avestruz, o cavalo diante da guerra, a morada do gavião e a presa da águia.

Todos os elementos vivos e inanimados em questão são usados continuamente pela Escritura – “como uma verdadeira figura” (1 Pe 3.21) – visando diversos ensinos e profecias. Os personagens aqui descritos vão muito além do físico, mas passam para o mundo espiritual, ensinado algo espiritual, como bem argumentou Jesus – “Se vos falei de coisas terrestres, e não crestes, como crereis, se vos falar das celestiais?” (Jo 3.12).

As muitas perguntas podem até ser respondidas do ponto de vista físico e científico, mas dificilmente poderiam ser respondidas do ponto de vista espiritual.

“Ora, o homem natural [ou estritamente preso às regras deste mundo] não compreende as coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente” (1 Co 2.14).

Mas é no segundo golpe discursivo de Deus, aos capítulos 39 e 40, que as coisas complicam. Duas espécies totalmente estranhas ao nosso ecossistema contemporâneo são descritas – o Beemote e o Leviatã.

Não adianta traduzir infantilmente o primeiro animal como ‘hipopótamo’, quando seu soberbo e monstruoso descritivo nada tem a ver com ele. Nem adianta querer roubar ou rebaixar o sentido exaltado de toda narrativa do livro, alegando que se trate de valor poético.

Deus não responderá ao sofrimento mais atroz de Jó, e por dilatação a toda humanidade, com mera poesia e figuras pequenas da presente ordem. O sofrimento humano em toda sua história será respondida na morte cruel do Filho amado na cruz ensanguentada. Nada há de poético aqui ou lá. A descrição destes dois monstros incompreendidos é 100% real, como é 100% real a descrição da vergonhosa cruz. Deus precisava trazer à tona elementos que se enquadrem à altura da hediondez do pecado e do justo castigo divino.

Sim, amados! Os dois espécimes estranhos que se encontram debaixo do mesmo céu que os outros que já comentamos acima, ainda que em tempos distantes, falam de algo mais profundo e espiritual, que vamos tentar clarear agora com algumas comparações.

“Contempla agora o Beemote, que eu fiz contigo, que come a erva como o boi... Ele é obra-prima dos caminhos de Deus” (40.15,19).

Analisemos o primeiro termo em negrito, e que aparece somente mais 3 vezes em toda Bíblia seguindo esta fórmula restrita.

“Por isso Moabe disse aos anciãos dos midianitas: Agora lamberá esta congregação [de Israel] tudo quanto houver ao redor de nós, como o boi lambe a erva do campo” (Nm 22.4).

“Fizeram um bezerro em Horebe e adoraram a imagem fundida. E converteram a sua glória na figura de um boi que come erva” (Sl 106.19-20).

“Na mesma hora se cumpriu a palavra sobre Nabucodonosor, e foi tirado dentre os homens, e comia erva como os bois” (Dn 4.33).

Caminhando em sentido contrário, Nabucodonosor – comendo erva como boi – vive o castigo divino da retirada de seu trono pela sua arrogância e prepotência.

A imagem do bezerro que come erva levantado pelo povo no deserto quando Moisés estava no monte, representa a mudança corrupta e idólatra da adoração do Deus vivo para o deus morto. Será que você já está percebendo onde quero chegar?!

Moabe, por sua vez, vive o medo de perder sua posição para uma nação, não mais justa do que ela, mas certamente mais agraciada por Deus em seus propósitos eternos. Se você quiser saber mais desta substituição que se efetuou nas esferas celestiais, pode ler o livro “O princípio da substituição dos mordomos” acessando

https://issuu.com/ministerioescrito/docs/do_verdadeiro_-_substitui____o

Beemote fala de Lúcifer em sua perfeição celestial, mas que não bastará para resistir à queda – na verdade será o motivo dela.

Ele é expulso do seu trono (Nabuco) – converte-se em imagem de adoração em todas as suas formas pagãs (bezerro), rival do culto santo ao Deus vivo e, finalmente – teme o castigo eterno de Deus que o varrerá deste mundo (Moabe), perseguindo o povo escolhido.

Quanto ao primor do segundo termo em negrito, achamos o seguinte pela versão Almeida Atualizada, passagem esta consagrada para a descrição de Lúcifer antes de sua queda. E assim como o Beemote físico teve seu fim trágico, também o espiritual.

“Assim diz o Senhor Deus: Tu eras o selo da perfeição, cheio de sabedoria e perfeito em formosura. Estiveste no Éden, jardim de Deus; cobrias-te de toda pedra preciosa... estiveste sobre o monte santo de Deus... Perfeito eras nos teus caminhos, desde o dia em que foste criado, até que...” (Ez 28.12-15).

Vamos abrir um capítulo extra para esmiuçar melhor a segunda figura do mesmo personagem e concluir esta análise do livro de Jó.