Homenagem ao escritor português, prêmio Nobel de Literatura em 1998, José Saramago
Homenagem ao escritor português, prêmio Nobel de Literatura em 1998, José Saramago
«Nascemos, e nesse momento é como se tivéssemos firmado um pacto para toda a vida, mas o dia pode chegar em que nos perguntemos Quem assinou isto por mim...” ( Ensaio sobre a lucidez)
Sim, meu caro José, você certamente se comprometeu com a humanidade ao assinar esse pacto para toda a vida e, ao efetivá-lo, você também se tornou parte da nossa história. Desde o seu nascimento em 16 de novembro de 1922, portanto, há exatamente 90 anos, você já tinha um caminho bem determinado a percorrer e que, ao longo dele, você, efetivamente, deixaria marcas indeléveis que serviriam de projetos para construirmos uma sociedade melhor e, consequentemente, mais justa. Sempre consciente de que um pacto entre o homem, a arte e a sociedade foi firmado, você deixa evidente o respeito que sempre teve com este compromisso, prova disso são as suas obras: Memorial do Convento, O Evangelho segundo Jesus Cristo, A Jangada de Pedra, A Caverna, Ensaio sobre a cegueira, Ensaio sobre a lucidez, As Intermitências da Morte, Caim, e muitas outras. Cada livro contribui com temas humanos, muitos deles até polêmicos, mas que, despertam diversas formas de questionamentos sobre nossa sociedade e, sobretudo, sobre a condição humana.
A vida, meu caro cidadão do mundo, fê-lo amadurecer e com este amadurecimento surge também um patrimônio ideológico inestimável. Sua ideologia é a marca profunda de um pensamento sociopolítico que desemboca em um desenho arquitetônico de uma ou de várias utopias. Essa utopia, caro amigo escritor, é o seu lado humanístico mais profundo... Afinal quem nunca sonhou com um mundo melhor, com uma sociedade mais justa, mais humana? Essa característica humanística em sua literatura é fruto de uma coragem inigualável de expressar aquilo que nem todos têm coragem de dizer. Sua crítica à condição humana contemporânea às vezes é crua, às vezes não. Essa coragem que você expressa em suas obras provoca em muitos uma espécie de desassossego, mas não em todos, pois há muitos que esperavam por esse tipo de escrita. Para muitos também, ela faz nascer uma esperança de que o mundo ainda tem jeito, de que o ser humano ainda pode mudar! A humanidade, meu caro, tem falhas. Ela erra. Mas como você mesmo disse «Saberemos cada vez menos o que é um ser humano» .
Termino esta pequena homenagem, caro José, repetindo o que você disse sobre o tempo «Todos acabamos por chegar aonde queremos, é tudo uma questão de tempo e paciência, a lebre vai mais depressa do que a tartaruga, chegará talvez primeiro, desde que não encontre no seu caminho o caçador e a espingarda.”
CRISTIANE LIMA DA SILVA.
As Intermitências da Morte, Lisboa, Caminho, 2005, epígrafe, Livro das Previsões.
A Jangada de Pedra, Lisboa, Caminho, 1986, p.275.