Durante quando tempo tive que sufocar a imensa vontade de lhe parabenizar. Motivos pra isso não faltavam. Eu casada mãe de três filhos. Você casado e pai de um casal. Qualquer contato que eu tentasse junto a você seria muito mal interpretado, mesmo que fosse pra lhe desejar um feliz aniversário. Mas quero que você saiba que durante todos estes anos, nunca deixei de reverenciar sua data natalícia.
 
Sempre foi assim quando eu logo pela manhã corro pra um canto só meu pra fazer minhas orações pedindo ao pai celestial todas as bênçãos e proteção a você. Neste momento de retiro e todo meu, quantas vezes eu chorei emocionada por lembrar sobre tudo o que vivemos, mas agora tinha que ser assim, à distância e sem que você soubesse do meu imenso amor e carinho. Porém, mesmo com todos os impedimentos jamais deixei de fazer desta data, algo de imenso significado e magnitude ímpar.
 
Assim como lhe digo que também tinha a esperança viva, de um dia voltar a contatá-lo como faço agora. Há alguém que diga: “Pena que tenha sido tão tarde”. Mas sinceramente eu não penso assim, agradeço a Deus que tenha sido em tempo, pois, mesmo depois de tantos janeiros estamos vivos e isto é tudo o que interessa.
 
Meus filhos agora estão adultos, o meu caçula, a exemplo do que já havia feito os irmãos, se casou há dois meses. Meu marido se você ainda não sabe, deixou-me viúva faz dois anos. Quanto a você sei quase tudo sobre o que lhe aconteceu. Não me confunda como intrusa, mas tão somente como pessoa interessada por você, ou, ainda melhor, preocupada com você. Sei que você também ficou viúvo e tendo os filhos também casados resolveu mudar-se para esta clínica de repouso, nome menos pesado pra asilo.
 
Aí, com certeza há conforto, bom atendimento, camaradagens dos funcionários, pois, é particular e custa um preço que poucos na nossa idade podem pagar. Mas você sabe muito bem que há coisas que como diz aquela propaganda do cartão, o dinheiro não pode pagar. Como também há aquelas que o tempo não pode apagar. Falo do último aniversário seu que passamos juntos. Naquele dia você completava 23 primaveras. Vivia o clímax da sua juventude. Era extremamente bonito. Estava morando sozinho em São Paulo. Seus pais e irmãos continuavam no interior. Aquele era o dia do seu aniversário, mas o dia inteiro se passou sem que ninguém o tivesse cumprimentado.
 
Você estava certo de que eu sua namorada havia quatro meses tinha me esquecido da sua data. Como de costume você saiu do trabalho foi para a pensão onde morava, tomou seu banho, jantou e foi pra minha casa. Quando a porta se abriu você levou um susto, eu tinha preparado uma festa surpresa pra você. Dava pra ver estampado em seu olhar a grande felicidade que sentia. Tanto que ao final da festa você me agradeceu e disse que nunca havia tido até aquele momento aniversário tão gostoso.
 
Eu planejava uma festa ainda melhor para o aniversário que viria, mas dois meses antes, uma ex-namorada do interior apareceu com um filho nos braços e anunciando que era teu. Você homem de bom caráter, não foi atrás de provas que outros talvez fossem. Assumiu a responsabilidade. Ainda assim queria ter prosseguido o namoro comigo, mas meu pai sempre tão austero não permitiu prosseguirmos com nosso enlace.
 
Você desgostoso acabou se casando com a moça mãe solteira e eu segui outros rumos. Parece incrível mais de lá pra cá, meio século se passou e só agora eu posso fazer o que sufoquei durante este longo tempo. Mandar-lhe uma carta cumprimentando pelo seu aniversário.
 
Na missiva há também um telefone meu. Minha intenção é ir até a clínica onde você está. Quero como naquele dia eu mesma preparar um bolo e com uma garrafa de vinho brindar mais um ano e mais uma vez ao seu lado. Não se preocupe com o depois, acho que após tantos anos aprendemos melhor do que ninguém a esperar. Só não ria quando ao receber o primeiro pedaço de bolo de suas mãos eu disser: “Obrigada meu amor”.
Paulinho Boa Pessoa
Enviado por Paulinho Boa Pessoa em 30/12/2008
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