Quando me visitarás?

Visitei um asilo certa vez

em que meu pai morou

e tudo o que me marcou

contarei para vocês.

 

O asilo em que o pai morava

eu visitava com frequência,

pois ele ajudava na assistência

a muito idoso que ali estava.

 

Era um lar de necessitados,

velhinhos e outras gentes,

de forma que, humildemente,

muitos eram ajudados.

 

Quando nas férias escolares,

de São José eu me ausentava

e visitava os lares

em que essa gente morava.

 

Ajudava meu pai a dar o almoço,

café da manhã e da tarde,

tudo com paciência, sem alarde

de me passar por bom moço.

 

Nesse asilo tinha um senhor

que a todos animava

com o teclado e o que cantava

com empolgação e amor.

 

Muitos jovens vinham visitar

os idosos asilados,

que ficavam maravilhados

de ter com quem conversar,

e os jovens? Emocionados

por poder dialogar.

 

Pão e chá eu distribuía

a cada idoso, um por um,

e a tarefa que eu fazia,

fazia com gosto incomum.

 

Às vezes eu conversava

com este ou aquele senhor

e ganhava bem mais amor

achando que amor eu dava!

 

Histórias felizes, curiosas,

memoráveis, depressivas,

esquecidas, ansiosas,

mostravam-me gente viva.

 

Uma senhora, bem velhinha,

já quase não falava mais...

Meu pai disse: está sozinha,

os filhos assim a deixaram

para não voltar jamais.

 

Uma outra senhora de lá

as duas pernas não possuía,

mas a língua ferina ia

até onde conseguisse andar,

mesmo assim era boa gente,

só tinha o sangue muito quente.

 

Outro avô um turco era,

que falava e eu não entendia,

mas eu o tratava com a mesma alegria

com que a outros já fizera.

 

E no asilo de necessitados

nem só velhinho morava,

bem mais gente se abrigava

para sentir-se amparada,

e não jogada de lado.

 

Enquanto eu era visita,

também o dia a dia vivenciava

como se fosse um interno,

tomando sopa de inverno,

comendo pão e tomando chá,

e enquanto eu estava lá

visitando meu pai e os idosos

eu achava maravilhosos

os momentos de visitar.

 

Muito adulto, jovem, criança

trazia sabonete, perfume, pipoca

e ganhava uma beijoca

dos velhinhos, pela esperança

que com boa-aventurança

as pessoas resolviam doar.

 

Nas visitas realizadas,

os jovens e os velhinhos

aprendiam a mesma lição:

quando se aquece um coração,

se engrandece dois caminhos

e mais vidas são mudadas,

como a minha, abençoada

com essa memória de boa ação.

 

Quem dera se todos esses lugares

e todo velhinho internado

fossem sempre visitados

por pessoas exemplares

(crianças, jovens, adultos...),

mas não só por afeição,

e sim também por criação,

pois muita mãe e muito pai

podem até receber visita

mas não curam a ferida

do filho que lá não vai,

e às vezes, para piorar,

o idoso mora no lar

de um filho que não quer cuidar.

Obs.: O Brasil possui atualmente 20% de jovens, 65% de gente entre 15 e 59 anos e 15% de idosos (estes são 33 milhões!). Segundo reportagem de Carlos Madeiro, do Uol, "População do Brasil envelhece, mora cada vez mais só e de aluguel, diz IBGE...". Disponível em: https://noticias.uol.com.br/colunas/carlos-madeiro/2023/06/16/populacao-do-brasil-envelhece-mora-cada-vez-mais-so-e-de-aluguel-diz-ibge.htm.