Rotina
07:00 – O sol entra pelas persianas e aquece o meu corpo, eu ainda tento esconder o rosto com o travesseiro mas a claridade me chama para despertar.
07:30 – Largo o travesseiro que abraçava e fecho os olhos pensando no quanto é bom dormir em paz e sonhar. Levanto rapidamente vou para uma ducha morna, cuido da minha higiene pessoal, escovo o cabelo, passo o batom preferido e o perfume Paloma Picasso.
08:00 – Depois de uma corrida louca, chego na Universidade.
09:00 – Durante a aula começo a escrever meus poemas, sempre pensando em você.
09:30 – Intervalo, hora de descontrair com os amigos. O Celular toca e eu pensei no quanto seria bom se fosse você, mas que bobagem! Você não tem o meu número.
10:00 – De volta à aula procuro me concentrar.
10:30 – Recebo um bilhete me convidando para almoçar, como resposta dou um sorriso e balanço a cabeça negando, afinal meu tempo é curto, tenho que ir para o estágio.
11:00 – O professor fala da teoria da relatividade, estou sem disposição para polemizar, já estou pensando no trabalho que me espera e se alguma atividade ficou sem realizar.
11:30 – Saio apressada da Universidade, olho para o relógio e sei que estou me debatendo contra o tempo.
12:00 - Correndo dou uma passada rápida para uma salada tropical e chego na hora para me apresentar ao trabalho.
12:30 – Olho para os rostos dos pacientes os quais terei que fazer a triagem. São tantas histórias de vida que a minha já não me lembro mais.
13:00 – Estou absorta, envolvida completamente com o trabalho e com as mazelas dos pacientes. Geralmente são jovens, como eu, conturbados, com transtornos da vida moderna ou apenas um adulto solitário que chama a dor da solidão de depressão.
13:30 – Aparece um caso especial, uma jovem que perdeu a vontade de viver porque foi abandonada pelo rapaz que ama. Olho nos seus olhos tristes, vejo as lágrimas correrem abundantes pelo seu rosto. Antes de preencher sua ficha pego o telefone e peço uma amiga que venha até a recepção.
14:00 – Ela chega exibindo sua cabeça sem um fio de cabelo, mas seu rosto fica mais lindo quando abre um sorriso e me pergunta em que pode ajudar. Peço-lhe que assuma o meu lugar por uns instantes, pois vou lanchar. Antes de sair dou-lhe uma piscadela e sei que ela compreendeu o meu propósito.
14:20 – Ao retornar percebo que a jovem não se encontra mais na sala de espera e minha amiga esclarece sorrindo: “Foi embora, lembrou de um tesouro grande que estava esquecido e saiu com um largo e radiante sorriso”. Dou-lhe um abraço e agradeço por ser um exemplo de vida, pois cada dia ela enfrenta sua dor e sua doença com destemida coragem, tendo apenas 24 anos, poucos anos a mais do que eu!
15:00 – Ligo o computador, procuro notícias do meu poeta, vou até minha página e não encontro nada. Antes que a melancolia tomasse conta de mim lembro da jovem que foi embora porque lembrou do seu tesouro e afinal o que fiz do meu? Quantas pessoas eu pude ajudar naquele dia e continuarei ajudando? Desligo o computador e volto a me concentrar nas minhas tarefas.
17:30 - O Sol vai se pondo e eu vejo a Lua nascer, é a hora de voltar para casa, agora sem pressa, não tenho motivo a me esperar.
18:00 – Abro a porta devagar, vou tirando a roupa e deixando pela casa. Tomo um banho frio, visto minha camisola de seda e vou para cozinha fazer um lanche rápido.
18:30 – Ligo o notebook, novamente nenhum recado, nenhuma palavra. Será que você sabe quem sou eu?
19:00 – O telefone toca, não quero atender. Queria somente falar com você.
20:00 – Registro minha poesia no computador. Visito sua página. Olho o seu retrato. Não penso mais nada. Meu olhar está seco e vazio. Somos dois estranhos. Mundos diferentes.
21:00 – Vou para cama, tudo tão branco, tão macio que me conforta. Abro um livro, O caçador de pipas e começo a ler.
22:00 – Sinto que o sono está chegando, mas paro a leitura e vou escrever.
23:00 – Leio e releio o que escrevi. Abro a janela e contemplo o céu cheio de estrela e a lua generosa no seu brilho. Penso nos espíritos que vagueiam em busca de consolo e nos espíritos guardiões que nos auxiliam a enfrentar os percalços da vida.
24:00 - Liga o notebook vou até minha página e registro o que escrevi:
Sou a pessoa mais rica do mundo.
Tenho capacidades física, intelectual e moral.
Então porque fico triste por esse querer,
Que me faz tanto mal?
Sei que ignora o que passa comigo.
Afinal não faço parte da sua vida
Mesmo assim eu prossigo.
Buscando você como uma ave ferida.
Relembro o que costumo falar aos pacientes,
Quantas vezes falei que a vida traz felicidade,
Para quem sabe reconhecer seu valor de verdade?
Se sempre tenho uma palavra de consolo,
Se a minha juventude sempre se mostrou radiante para eles,
Por que na minha solidão deixo a lágrima correr?
Por que o que prego não posso viver?
Amanhã será outro dia,
Tudo será diferente.
Afinal tenho dentro de mim a magia,
Em poder ajudar tanta gente!
00:00 – Agora me deito. Cubro meu corpo, penso feliz em tudo que fiz. O meu dia foi justificado e o seu desamor está perdoado.