João Hélio
O dramático episódio envolvendo a família do garoto João Hélio, no Rio de Janeiro, deixa lições de importância para a sociedade brasileira. A lamentável ocorrência, que comoveu o mundo, tem vários pontos a serem estudados.
Nada justifica a violência praticada pelos jovens delinqüentes. Optaram pela violência e estão agora comprometidos com a justiça, além das danosas conseqüências perante a própria consciência que vai exigir reparação dos danos causados ao garoto e à família.
Reflitamos, no entanto. A violência é fruto da miséria, da falta de amor e estrutura da família, mas também da bagagem interior que forma o caráter, a idoneidade moral. Será que um abraço em casa, a atenção demorada dos pais no carinho aos filhos não poderia ter modificado esse quadro através do tempo?
Por outro lado, a redução da idade legal resolve a questão? A solução não está antes na formação que vem de casa? Na estrutura da família?
Um delinqüente não está habituado a receber carinho e atenção. Possivelmente sempre recebeu indiferença, desamor; talvez nunca um abraço, um afago, quando criança. Acostumou-se tanto à frieza que tornou-se frio; habitou-se tanto à ausência de cultivo de princípios morais, que em muitos casos nem chegou conhecer, que o respeito ao próximo fica esquecido.
Todavia, não temos o direito de julgar. Não conhecemos a história dos jovens. Não sabemos nada sobre suas vidas. É leviano julgar. Aqui o comentário é genérico, aplicável mesmo nos descasos com a educação e com a formação moral devida pelos pais aos filhos.
O fato é que a violência ocorreu, machucou profundamente os pais, chamou a atenção da justiça, abalou a sociedade e resultou na morte do garoto. Infelizmente.
Mais concreto ainda é que ninguém nasce para matar ou matar-se. A infelicidade, a violência (sob todos os aspectos), o desrespeito, a revolta, o abandono e a indiferença são sempre frutos de opões que fazemos.
Quanto aos atingidos pela violência, também não podemos dizer que estavam programadas em todos os casos. Seria ingenuidade, pois seríamos como máquinas. É óbvio que nossas carências e necessidades, que trazemos na bagagem, podem determinar escolhas nesse sentido, mas nunca no caso dos autores. Esses optam por decisão própria e comprometem-se perante a lei humana e divina. Poderemos sim situarmo-nos no resgate de velhos débitos ou mesmo comparecer como voluntários para despertar a atenção da sociedade em algo para a qual ela está cega ou madura... Mas, uma vez mais, como não conhecemos a história anterior, é melhor calar...
E mais interessante, nossa ignorância na história anterior, tanto quanto a autores e vítimas, desautorizam-nos (e a qualquer pessoa) a emitir julgamentos, apesar da justiça que se faz necessária.
Porém, voltemos aos autores da violência. Preocupamo-nos mais em construir cadeias que educar. Abandonamos escolas e prestigiamos os vícios; preferimos a mentira ao invés de educar, incentivamos a esperteza ao invés da solidariedade... Como construir uma sociedade de paz com esses parâmetros? O exemplo há que vir de casa. Não há outro caminho. Pais, educadores e cidadãos, estamos todos com essa imensa responsabilidade nas mãos: transmitir às crianças as noções de cidadania, de respeito, de fraternidade, de solidariedade. Formá-los cidadãos dignos, construir-lhes o caráter, incentivá-los ao trabalho e mostrar-lhes a consciência de viver...
Tarefa para todos. Talvez tenhamos que recomeçar do ponto zero. Mas é preciso recomeçar... É verdade que cada um traz a bagagem própria, mas quando encontram o amor dentro de casa, meio caminho já foi dado para reformar-lhes o caráter enfermiço.
O assunto é mais complexo que parece e não pode ser reduzido às aparências do que atualmente estamos enxergando. Há fatores anteriores que nem sempre vemos e também não podemos compreender de imediato.