Outono
Teu beijo faz-me pensar num outono, entre as matizes verdes e caucasianas. Nossos corpos, vultos suntuosos, num fim de tempo expoente; cronologicamente, os beijos contados, quase roubados, desvelados no espaço para integrar-me plena e prazerosamente. Integrar-me é fato da entrega vaga que persiste adiando-se, para o bem da paixão subversiva, dos olhares sedentos d'um encanto que deixa-me fria e desarmoniosamente impulsiva.
Teu beijo, hoje, é o que evita que eu me perca. Enquanto tu estiveres, eu estarei; quando tocar-me, tocarei, desesperadamente, meu próprio ego, minh'alma, antes cega; nestas noites, sã, viva, ruborizada.
Não há amargo nos instantes das vertentes verdes-caucaso. As flores, inertes, se hão, presenciam a queda das folhas, oscilantes e mágicas. Quase escrevo com a ponta dos pés:
"Queres ser só meu?"
Mas as folhas mortas, ainda verdes, somem num redemoinho de ventos ilusórios e, efemeramente, respondem-me:
"Nada é pleno ou total..."
Mergulho na grama orvalhada, fazendo-me de anjo - o verde, o caucaso. A pele e os sentidos mornos à espera da tua pele e dos teus sentidos. Ofegantes, aparentemente, seremos um do outro. Tão rápido quanto à vida, tão nebuloso o céu do quase outono. Letal, apaixonante, bravio...
As folhas, que ainda caem, cobrem-nos, inteiramente. Os beijos derramados, antes delicados e belos; num arfar maior, ferozes e persistentes.
Enumero, brevemente, os impulsos nervosos; focando a única flor encarnada, moça, solitária entre alguns galhos tortos.
Após, regresso ao beijo primeiro. Beijos e orvalhos misturam-se, unindo gotas e gotas. O suor, rastro do pseudo-pecado. O gozo, eternizado, fertilizará primaveras.
Voltarei para colher suas flores multiformes. E, se houver outras esperas, beijarei-te vezes mais. Á espera d'um verão rubro e fértil de esperanças.
* Mary Jane