Apaixonar-se

Perderam-se as folhas dos calendários para os vossos dias. Perderam-se-vos as agendas, os diários ocultos; o que vá vir, o que já passou, foi-se. O chão firme que pisáveis, as cousas sabidas, os objectos certos e bem definidos, as pessoas conhecidas, esvaeceram-se.

Estais, estás, fora de tudo, e nunca mais adentro de cada cousa, de cada ser, de nada.

Não haverá relógios.

Não há relógios, agulhas que indiquem o momento preciso no que bate o coração.

Mas descobrireis, a pouco a pouco, o imprevisível discorrer que vos arrasta:

Vamos a um misterioso ritmo, devestes pensar, é como se um instante levasse a outro superior, com a vertigem da queda possível no passo, no precipício em que um se abre a outro: o instante preciso no que um deixa de ser um, e dous se fundem consumindo-se como um lume, à vez que brotam despontando como astros.

Tempo adentro do tempo, afora do tempo, tempo, além de ti: os instantes fugidios nos que vos ides deslizando, vossas eternidades serão.

À Luz