O POEMA BÊBADO

(para Erode Lino Leite, escriba de Campo Grande/MS)

Cuide-se o poeta com a excessiva abstração. A par de ser o poema uma abstração enquanto Arte, os temários abordados têm de beirar o real, chafurdar-se na lama, tomar-se de chuva e de sol. Banhar-se de vida.

Tentei, dia desses, a definição do poema. Deu no seguinte: poema é um bêbado carregado, roçando a ponta dos pés no chão, ora sim, ora não! O dedão grande sangra, os outros se encolhem.O hálito dele é a respiração do mundo, arfante como todos que desejam viver!

Vês? O teu grito de amor fez, em minha cabeça, o intertexto. Piradão, mas algo palpável. Vês, até tomou forma de verdade quase nua!

E se vai banhar no mar aberto das angústias fugidas, numa pequenina e frágil prancha de surfe... E se some, para além da arrebentação marinha... Parece uma formiga preta de neopreno, deitada sobre um casco de branca tartaruga!

A poesia sempre surpreende!

– Do livro CONFESSIONÁRIO - Diálogos entre a Prosa e a Poesia, 2006.

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