Minha Pequena Luz...

Um MENINO:
Pedrinho tinha 4 anos quando eu o conheci.

Uma HISTÓRIA:
A mãe do Pedrinho era faxineira no hospital onde eu era voluntária.

A DESCOBERTA:
Aos 5 anos, foi diagnosticada uma Leucemia no Pedrinho.

A REALIDADE:
D. Vânia não tinha dinheiro para custear o tratamento do filho.

A SOLIDARIEDADE:
O tratamento do Pedrinho foi todo custeado pela amizade e pelo carinho.

A LUTA:
Pedrinho lutou pela sua vida com todas as forças de um pequeno grande guerreiro. Sua luta durou 6 longos anos. Foram tratamentos de todas as espécies. Graças aos grandes amigos que sempre nos apoiaram lá na Santa Casa, médicos de todos os cantos do país e até um Infectologista da Europa veio ajudar no tratamento do Pedrinho.

O FIM DA LUTA:
Embora tivéssemos feito tudo que pudemos para salvar o Pedrinho, nós perdemos a batalha. O Pedrinho se foi numa tarde de Primavera, às 16:55.
Era a hora do Por do Sol e o cheiro de Jasmim enchia o quarto.

O SOLDADO:
Quando o Dr. Carlos Fontes saiu da sala da UTI Infantil da Santa Casa, ele fitava o vazio. Estávamos todos reunidos na sala de espera do Hospital.
O Dr. Carlos Fontes era o melhor especialista de sua área e era conhecido por ter sucesso onde ninguém mais vencia. Era apelidado de “O Milagreiro” e detestava perder um paciente. O Dr. Carlos salvou dezenas de vidas lá mesmo na Santa Casa.
Quando eu vi os pessoas incertos caminhando a esmo pelo corredor, eu sabia que havíamos perdido a luta.
Dr. Carlos parou em frente a D. Vânia e deu-lhe a tão terrível notícia. O Pedrinho não havia resistido. Seu organismo estava muito debilitado. Ele sucumbira à doença.
Foi a primeira vez que eu vi o Dr. Carlos abraçar alguém...

O ÚLTIMO ENCONTRO:
Eram quase 20h e eu estava louca para ir para casa ver minha afilhada, quando eu vi a luzinha se acender. Era o quarto do Pedrinho. Pensei em chamar a enfermeira de Plantão, mas depois, resolvi ir até lá pessoalmente. Afinal, aquele menino não era mais um simples paciente. Era a pequena Luz do Hospital...
Bem, fui até lá.
Bati na porta e entrei.
Pedrinho estava olhando a TV (desligada).
Eu perguntei a ele se estava tudo bem e ele disse que sim. Eu notei que ele estava mais abatido que o normal. Ele me pediu para me aproximar e sentar na cama, perto dele.
- Você poderia segurar minha mão, por favor?
Eu disse: - claro! E apertei aquela mãozinha miúda na minha mão.
Ele disse: - sabia que amanhã será um dia especial?
Eu disse: - Ah, é? E por que?
Ele disse: Você não lembra? Amanhã é 23 de setembro. É a chegada da Primavera. Você não sente esse cheiro? É jasmim... Posso te pedir mais uma coisa?
Eu: - Tudo que você quiser, meu anjo.
Ele: - Você poderia me levar lá fora? Estou aqui dentro deste quarto há tanto tempo, que esqueci como é a cara da noite.
Eu (Receosa): - Você não acha melhor esperar amanhecer, porque o tempo vai estar mais quente. Agora a temperatura está friazinha. Tenho medo que este sereno te faça mal.
Ele: - Você sempre foi a minha melhor amiga desde que nos conhecemos. Lembra daquele dia? Você estava chorando porque havia perdido a sua filhinha. Nossa amizade começou ali e nunca mais nos separamos...
Eu (com os olhos marejados): - Sim... Eu me lembro. Jamais esquecerei aquele dia. Venha, vamos ver a noite. Hoje é lua cheia. Você vai gostar.
Enrolei o Pedrinho numa manta grossa, peguei o soro e o carreguei nos braços (ele pesava igual uma criança de 5 anos).
Sentamos num banco de pedra do lado de fora.
Ele estava no meu colo e seus olhos brilhavam olhando a lua cheia. Fechou os olhos e aspirou o perfume da noite. Ficou assim um tempão.
E foi então que ele olhou dentro dos meus olhos e falou assim:
- Eu queria te agradecer.
Eu disse, mas pelo que?
Ele respondeu: - Por não ter desistido da sua vida naquele dia, há quase 7 anos atrás. Porque se você tivesse desistido da sua vida naquela manhã, eu não estaria aqui hoje, sentado no seu colo, celebrando mais uma Primavera. A sua vida salvou a minha....

DOIS DIAS DEPOIS:
Estava chovendo e eu olhava a janela. Estava no quarto que fora do Pedrinho. Lembrava a conversa que havíamos tido há dois dias.
Ontem o Pedrinho partiu. Não vou comentar sobre o seu enterro, porque foi triste demais.
Vi uma borboleta azul pousando perto da janela. Ela abria suas asas enormes e quando percebi havia parado a chuva.
Era Primavera. O mundo se enchia de cores. Olhei pela ultima vez para aquele quarto.
No dia seguinte eu pediria para ser desligada da Santa Casa.
Minha alma chorava. Mas não era só tristeza pela partida daquele belo sorriso.
Eu sabia que toda Primavera me traria Pedrinho e a lição que ele nos deixou.
Minha alma chorava por uma imensa gratidão.
Uma gratidão por poder ver aquela borboleta azul, enfeitando o meu dia.
Uma gratidão por ter conhecido aquele menino, que durante 7 anos preencheu o vazio que a perda da minha filha tinha deixado.
E uma imensa gratidão por estar viva, hoje, para contar esta história para vocês.
 
DEDICATÓRIA:
Neste ano, completam-se cinco Primaveras que o Pedrinho partiu. Esta época do ano sempre me traz com mais força a presença dele.
Eu queria dedicar este texto a todas as pessoas que nunca fugiram de suas lutas, mesmo sabendo que o final poderia ser triste.
Dedico este texto a todas as crianças especiais que transformam a nossa existência com a sua Luz e sua Sabedoria.
A Maria Clara, onde quer que ela esteja.
E a todas as mães que enfrentam todos os dias o fantasma de verem aproximar-se a possibilidade de ficarem sem os seus anjos.
Que a Sua Força seja Eterna.
E a Pedrinho, um querido Anjinho que me ensinou que nossas ações podem mudar a vida de outras pessoas. Para melhor ou para pior.