Meu amigo Spike





Eu o conheci quando meu filho o trouxe para casa. Ele era lindo. Um filhotinho de labrador chocolate de olhos muito vivos. Eu não o queria. Já havia tido um cachorro e sofrido muito com a morte dele. Mas filho sempre consegue o quer das mães. E não foi diferente. Spike ficou em casa. De dia o espaço dele era restrito a um corredor fechado. Meu escritório funciona ao lado de minha casa no mesmo terreno e era impossível mantê-lo solto com toda energia que tinha. Inicialmente só meu filho cuidava dele. Depois passei a ajudá-lo. E como era de se esperar apeguei-me ao danadinho. Passado um ano meu filho casou e deixou o Spike de herança para mim. A casa deles era pequena demais para um cachorro daquele tamanho. Enorme. Em pé ficava maior que eu. Ficamos eu e o Spike em minha casa. Sozinhos. Superei a saudade de meu filho na companhia deste meu amigo. Assim era o Spike. Meu companheiro do dia a dia. Era tão grande e pesado que quando andava rebolava o corpo de uma maneira muito engraçada. Quando eu chegava em casa tinha que ficar prevenida. Invariavelmente ele pulava em mim. Tinha que me segurar para não cair. Quando fazia alguma arte eu o conhecia pela cara de culpado que me olhava. E olha que era perito em todos os tipos de bagunça. Principalmente em roubar objetos e ficar esperando que alguém tentasse tirar dele. Então era a glória. Quando meus netos vinham a minha casa eu ficava em pânico. Eles adoravam correr atrás do Spike, e o Spike por sua vez adorava a brincadeira. Eu dizia que não ficava pedra sobre pedra. Era o caos. Mas era muito divertido. Se eu o proibia de entrar em casa ele ficava na porta com a carinha mais triste do mundo. Comovia-me. Parecia que ele pressentia que eu estava indecisa. Levantava as orelhas e a um pequeno sinal meu já entrava correndo e ato continuo se esparramava no sofá feito um rei. Nem pensar em sair com ele. Era colocar a coleira e ele ficava tão entusiasmado que não era eu que o levava era ele que me carregava. Depois de várias tentativas deixei os passeios a cargo de meu filho. Quando ele chegava para buscar o Spike era recebido com um grande sorriso de cachorro. Só quem tem cachorro pode entender que realmente eles riem. Cachorro sabe rir.
À tardinha ficávamos na varanda. Eu sentava em minha cadeira e ele no chão aos meus pés. Qualquer movimento meu ele ficava alerta. Sentia que estava cuidando de mim.
Teve um tempo que tinha que trancá-lo no corredor para dormir. Latia para tudo e para todos a noite inteira incomodando os vizinhos. Numa madrugada acordei com os latidos dele e muito barulho. Fiquei com medo de levantar. Na manhã seguinte encontrei o portão do corredor todo arrebentado e o Spike me esperando na porta da cozinha. O mais impressionante é que a porta da sala tinha sinais de que alguém tentara arrombá-la. Imagino o apuro do ladrão quando o poderoso Spike rebentou o portão e foi pra cima dele. Deve estar correndo até hoje.
Um dia Spike ficou doente. Muito doente. Teve febre, foi ficando desanimado, perdeu a força nas pernas. Nenhum veterinário diagnosticou a doença. A última veterinária que cuidou dele era ainda uma menina recém formada. Cuidou dele por quase dois meses. Dois longos meses de sofrimento para o valente Spike. Nos últimos dias ele não levantava mais. Apenas ficava deitado com aqueles olhos grandes e tristes olhando para mim. Mesmo assim quando ouvia minha voz tentava se animar. Inútil.
Num domingo de manhã eu e a veterinária decidimos por fim ao sofrimento dele. Até hoje não sei se fiz o certo. Na hora de aplicar a fatídica injeção enquanto ela aplicava fiquei acariciando meu amigo. Ele não parou de olhar para mim até o fim. Por vinte minutos, o tempo que durou a eutanásia eu e esta menina corajosa choramos juntas. Meu amigo se foi.
Hoje já nem me importo mais saber qual doença o acometeu. Dou Graças a Deus porque convivi com ele por três anos maravilhosos, tempo que me ensinou muitas coisas.
Spike foi um amigo como poucos. Amava-me incondicionalmente. Protegia-me sem nenhuma recompensa. Alegrava-se com minha alegria e se entristecia com minha tristeza. Ensinou-me que amor a gente sempre pode dar de graça sem esperar nada em troca. Basta um sorriso ou um latido alegre de um cãozinho.
Ensinou-me que amigos verdadeiros deixam uma imensa saudade quando vão embora, mas permanecem em nossos corações.
Tenho um lugar secreto em meu coração onde deixei guardado este meu amigo e onde me refugio nas horas tristes.




Edamaria
Enviado por Edamaria em 24/01/2012
Reeditado em 17/02/2012
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