E continuamos amigos...

"Já sei como você é, folha ao atá, levada pelos ventos. O engraçado é que se trata duma folha pensante, reagente como sensibilidade, que espiritualmente caminha contra os ventos mas que até já está achando um certo sabor nessa malinconia de se deixar levar. Porque apesar de todas as reações e projetos e desejos, você continua folha. Você jamais esquecerá que no meio do caminho tinha uma pedra... De primeiro você me comovia, o jeito de você me esfolava o jeito meu, somos fundamentalmente diferentes na maneira de ser. (...) No princípio eu quis mudar você que nem eu. Porque, já falei, você me esfolava e eu queria ser amigo de você. Mas você foi discreto, me engambelou, me engambelou, continuou na mesma, deu tempo ao tempo. Foi bom porque hoje você não me esfola mais, não me contunde, eu já não quero mais mudar você. E vem a verdade surpreendente: E nós continuamos amigos" (Mário de Andreade, em carta a Carlos Drummond de Andrade, de 19.05.1929).