Condor?  Andorinha?

     O jovem poeta faz as coisas certas no tempo certo. Uma época sua, e só sua. Parabéns por vivê-la tão intensamente, flutuando nas esferas únicas da sua solidão e sua multidão. 

   Quando pede o poeta que lhe comentem os trabalhos, entendo que também aceite, além de aplausos, eventuais críticas. 

   Há poemas maduros, versáteis, profundos, como há aqueles a que faltou pensar muito e redigir mais: neles existe, às vezes, imensa profusão de banalidades, de sentimentos corriqueiros, de ingênuas declarações de amor, de penas de amor longamente enumeradas, que tumultuam a recepção do seu recado, a audição de seu sussurro. 

   (Isso se dá em todos os tempos, desde o início da Literatura. Daí a sabedoria da Natureza: já pensaram se todos os que escrevessem se perpetuassem?) 

   Quando lemos tais trabalhos, tropeçamos amiúde em figuras e imagens que, de tão empregadas, não mais arrebatam.  Míseros lugares-comuns.  Nós leitores merecemos maior reverência: afinal selecionamos alguns escritos dentre milhares -- miríades! -- de outros para apreciar. 

     Por ser imaturo, em formação, às vezes faltam à poética do jovem desencanto, denúncia, amargura, revelação; vivência, amplidão, febre, obsessão;
delirium tremens, contestação, temor cósmico, desequilíbrio, abismo, profundidade; desolação, passado, ancestralidade... (E faltam não por incompetência intelectual, mas porque ainda não é hora).
    Continua poeta. 

    Não te limites aos finitos "eus" e "tus" líricos: descobre o Infinito (com ou sem Deus), e expõe em versos o desespero da Vida, a emoção da Justiça, o enigma da Lei, a ânsia das fomes, a opressão sem fronteiras, o protesto soberano; o abandono calado, a epifania da ausência, a evocação mar aberto. 

   Aí sim tu te revestirás das asas do condor e do v0o da andorinha. Que assim se completam. 

  Além (embora próximos) de teus poemas plenos de delicadas meiguices, esperam-te a Sociedade, o Tempo, a Realidade: párias famintos, analfabetos humildes, mártires convictos, democratas pacíficos, vencedores cruéis, vencidos idem, costumes inéditos, atos malditos, agressões imbecis, omissões dolorosas, 'meio' ambiente acuado...

    E então, criança escritora? 

                                 

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Escrito em 20/062006.
Modificado 102 vezes até 12/10/2013.
 
Enviado por Jô do Recanto das Letras em 09/02/2008
Reeditado em 12/10/2013
Código do texto: T851741
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