O banquete das sombras
O salão era estreito, abafado, iluminado por luzes de néon que piscavam como um coração em convulsão. O cheiro de suor, álcool e promessas quebradas pairava no ar. Ao centro, uma mesa repleta de copos, garrafas abertas e pequenos montes de pó branco esperava por aqueles que buscavam esquecer quem eram.
Eles chegavam aos poucos, atraídos pelo som da música que pulsava como um chamado primitivo. Eram jovens, velhos, rostos indistintos escondidos sob o véu da euforia sintética. Os primeiros goles queimavam, os primeiros traços subiam como serpentes pelas narinas. O efeito era imediato: o riso fácil, o toque mais ousado, a entrega sem perguntas.
A noite avançava como um animal faminto. Corpos se misturavam, mãos percorriam peles como se quisessem apagar qualquer vestígio de sanidade. As substâncias dissolviam barreiras, distorciam vontades, e no epicentro da festa, ninguém mais sabia ao certo o que queria — ou se queria.
No começo, era libertação. Depois, um estranho torpor. Em algum momento, os toques começaram a pesar. Os olhos vidrados não reconheciam mais o que viam. As bocas diziam “sim” sem saber o que significava, enquanto a consciência se afogava em um mar de sensações vazias.
A música gritava, mas ninguém ouvia. As luzes piscavam, mas ninguém enxergava. O desejo, antes quente, agora parecia um abismo escuro e sem fundo.
Quando a madrugada morreu e a festa chegou ao fim, restaram apenas silhuetas largadas pelo chão, memórias partidas e um silêncio denso como culpa. Alguns despertaram sem lembrar o que aconteceu. Outros, sequer despertaram.
O banquete das sombras havia servido seu último prato. E a noite, essa, sempre cobra o que é dela.