sem temer os golpes sujos dos que rastejam, cães roendo os ossos da omissão.                                  

 

 

 

Poema "poética", do Poeta piauiense PAULO MACHADO:        

 

p o é t i c a
ao poeta salgado maranhão

 

 

fica o ranço das metáforas,
o outono na velha aquarela.
no porto, a lembrança das velas.

 

fica o silêncio, o esboço do poema,
os músculos rijos à espera do agora.

 

fica a certeza de caminhar
em linha reta,
não fugir nunca.
remar contra a corrente, lutar
sem temer os golpes sujos dos que rastejam,
cães roendo os ossos da omissão.

 

fica a ânsia, o sangue queimando nas veias
até o último momento.

 

fica um princípio:
não temos o direito de trair a poesia,
crucificá-la numa sexta-feira de passivismo.
jamais expô-la como símbolo
de uma vanguarda precoce, medrosa.

 

a poesia é torpedo-suicida,
não podemos camuflá-la de bailarina persa.

 

a escuridão dos calabouços,
as câmaras de tortura,
nada fará calar os poetas.

 

a poesia sobreviverá às bombas de gás, ao tédio.
ressurgirá das cinzas no vôo dos pássaros.
(à tardinha os homens imitam os pássaros, ingenuamente)

 

sonhemos: com o verde da tardia esperança,
o branco da paz inaudita.                                                          ...        .      ...