VOCÊ_________________
E o papo hoje foi demasiado longo, folheou palavras enquanto caminhávamos - esquecidos da agenda nessa pausa...
Lutei mas fiquei quieta (rs), deixei a tagarela de lado e o escutei.
Cheguei cheia de pastas, trabalho pronto, mas você me esvaziou de tudo isso, pediu licença a todos e saímos. E finalmente eu entendi (rs). O seu esforço veio com doses de humor. (você sabe que assim fica mais fácil na captura da minha atenção). E funcionou.
Entre sombras, caminhou - luz -, me falou sobre sua nova proposta, os grupos de trabalho e os meus desperdícios literários. Explicou-me sobre não haver liberdade quando as pessoas pertencem ao lugar. Disse-me também das horas e horas em que estive amputada dentro de mim. "Seus pensamentos são como um incêndio", disse, num tom de elogio e com uma pitada de conselho. Me deu um tempo para pensar. "Se aceitar, você nasceu em 15 de julho de 2019". Isso me marcou.
Me falou sobre a massificação mediana, o desleixo literário, o papel do editor, do livro, de quem o escreve, a lógica do trabalho e alguns dos pontos mais importantes que virão. Tudo foi dito enquanto o cheiro da mata parecia estar à espera da primavera. Mergulhamos no aroma da terra molhada, na beleza delicada dos musgos, no clarão da luz e na forma moldada pelo tempo. Seus olhos tão vivos e a fala tranquila lhe confirmavam um ar experiente. Os cabelos já grisalhos, os gestos como se regendo uma orquestra entre as árvores. Você caminhava em harmonia e contemplação e me respondia com paciência, visivelmente carinhoso. Não fui capaz de retrucar-lhe quase nada, e olha que eu tinha muitas coisas a dizer (rs).
Delicado, porém firme, me despiu das ilusões. Algo que de maneira nenhuma se tornou penoso. Caiam-lhe sobre as têmporas as certezas. E o seu sorriso entre as falas me fez lembrar um pai. Permitiu-me desordenada na fala, olhos marejados, o movimento inquietante dos passos e a suspensão de toda bobagem que, até então, me tomava o espírito. Falou-me sobre alguns dos escritos selecionados por ele, "Palavras promissoras, dê uma atenção maior durante essa semana!", "este, agonizante", "insosso", e seguiu em seu garimpo e calendário mensal.
Bem entendido, foi também categórico ao dizer "isso não mais", "isso também não", "jamais!", "sem negociação", "sim, mas apenas nos seus dias inativos e não ali e nem daquela maneira", "retire, já falei!", "não, para enxergar com maior clareza", "isso provoca o seu declínio e lentidão literária", e durante o que ouvia, o mundo estendido e de acordo com ele entre os suaves aromas que vinham. Ah! Foi um complô! Os sinais eram claros. (rs) Até os pássaros se meteram com o dobro ou o triplo dos cantos.
"Trabalho?", e voltamos. Antes, a minha cabeça estava cheia de ferrugem, foi a sensação que tive (rs). Numa oxidação da teima em infantilidade. Assim, não me espanto quando me vem a sensação de que, realmente, nasci em 15 de julho de 2019.
(Para o meu amigo Miguel)