Tudo se liga na obra da criação
Tudo se liga na obra da criação. Outrora se consideravam os três reinos como inteiramente independentes entre si e teriam rido de quem pretendesse encontrar uma correlação entre o mineral e o vegetal, entre o vegetal e o animal. Urna observação atenta fez desaparecer a solução de continuidade, e provou que todos os corpos formam uma cadeia ininterrupta. De tal sorte que os três reinos não subsistem, na realidade, senão pelos caracteres gerais mais marcados. Mas nos seus limites respectivos eles se confundem, a ponto de se hesitar em saber onde um termina e o outro começa, e em quais certos seres devem ser colocados. Tais são, por exemplo, os zoófilas, ou animais plantas, assim chamados porque tem, ao mesmo tempo de animal e de planta.
O mesmo acontece no que concerne à composição dos corpos. Durante muito tempo os quatro elementos serviram de base às ciências naturais: caíram ante as descobertas da química moderna, que reconheceu um número indeterminado de corpos simples. A química nos mostra todos os corpos da natureza formados desses elementos combinados em diversas proporções. É da infinita variedade dessas proporções que nascem as inumeráveis propriedades dos diferentes corpos. É assim, por exemplo, que uma molécula de gás oxigênio e duas de gás hidrogênio, combinadas, formam água. Na sua transformação em água, o oxigênio e o hidrogênio perdem suas qualidades próprias. A bem dizer, não há mais oxigênio, nem hidrogênio, mas água. Decompondo a água, encontram-se novamente os dois gases, nas mesmas proporções. Se, em lugar de uma molécula de oxigênio, houver duas, isto é, duas de cada gás, não será mais água, mas um líquido muito corrosivo. Bastou, pois, uma simples mudança na proporção de um dos elementos para transformar uma substância salutar em outra venenosa.
Por uma operação inversa, se os elementos de uma substância deletéria, como, por exemplo, o arsênico, forem simplesmente combinados em outras proporções, sem adição ou subtração de nenhuma outra substância, ela tornar-se-á inofensiva, ou mesmo salutar. Há mais: várias moléculas reunidas de um mesmo elemento gozarão de propriedades diferentes, conforme o modo de agregação e as condições do meio onde se encontram. A ozona, recentemente descoberta no ar atmosférico, é um exemplo. Reconheceu-se que essa substância não passa de oxigênio, um dos principais constituintes do ar, num estado particular, que lhe dá propriedades distintas das do oxigênio propriamente dito. O ar não deixa de ser formado de oxigênio e de azoto, mas suas qualidades variam conforme contenha maior ou menor quantidade de oxigênio no estado de ozona.
Estas observações, que parecem estranhas ao nosso assunto, não obstante a ele se ligam de maneira direta, como se verá mais tarde. Elas são, além disso, essenciais como pontos de comparação.
(revista espírita, março de 1866)