Asas da Existência
Tenho uma imagem comigo que uso como metáfora da existência.
Nascemos com asas, mas asas sem penas. As penas conquistamos ao longo de nossa existência.
As primeiras penas que ganhamos, que grudam em nossas asas vazias, vêm de nossos pais. Todos os valores que assimilamos em nossa família são as primeiras penas que compõem nossas asas. São essas penas que nos fazem arriscar os primeiros voos, os primeiros rasantes sobre o mundo. Voos ainda inseguros, mas temos a presença de nossos pais ali, bem perto de nós, para quando vacilarmos.
Também conquistamos outras penas ao relacionarmos com as pessoas do mundo em que vivemos. As pessoas de nossas ruas, nossos bairros, escolas, faculdades e empregos. Cada relação é importante para o preenchimento de nossas asas. Aprendemos a cada dia uma nova experiência e acrescentamos à nossa vida mais experiências.
Nossas asas vão se enchendo de penas e começam a pesar. É hora de aliviarmos um pouco esse peso e retirarmos as penas mais pesadas, aquelas que só fazem peso. Aquelas que já serviram para voos menores, mas precisamos voar mais longe e essas penas já não nos servem tão adequadamente. Precisamos dar mais liberdade para nossas asas.
Temos que ter cuidado para não retirarmos penas especiais, penas que são perenes. Por isso esse momento é de grande importância, pois passamos por um teste para ver se sabemos identificar o que nos pesa e o que nos alivia. Esse momento se assemelha com o pilotar um balão, quando o piloto precisa se desfazer de alguns sacos de areia para o balão subir mais alto. Cuidado para não tirar demais ou tirar de menos!
Asas aparadas, asas com as penas adequadas, já podemos ensaiar voos mais longos. Caso as penas que pesavam foram retiradas adequadamente, estamos prontos para alcançar novos horizontes, conhecer novos lugares, novas pessoas. Caso ainda reste algumas penas pesadas, ainda podemos refazer o processo e retirá-las. Importante saber que mesmo com nossas asas bem adequadas, com as penas corretas, precisamos bater as asas, precisamos nos esforçar, colocar em movimento as penas que conquistamos ao longo de nossa existência.
É claro que nem todas as asas seguem esse mesmo caminho. Acima expus um dos vários caminhos da existência. Há pessoas que precisam preencher suas asas sem as penas que poderiam ser adquiridas com seus pais, por que são órfãos. Outros não conseguiriam adquirir penas na convivência social, por não terem liberdade. Outros não tiveram tempo suficiente para incorporar penas às suas asas. E poderia aqui listar muitos outros casos semelhantes. É claro que sei que cada asa é composta por penas ímpares. Cada asa é construída dentro de um processo todo particular. E é essa diversidade de asas que enche nosso mundo de inúmeras possibilidades. Não importa como e onde nascemos, o que importa é construirmos nossas asas com as nossas experiências, precisamos usar as ferramentas que estão ao nosso alcance, pois isso é viver.
Bem, tenho essa imagem como metáfora da existência. Olho-me no espelho e contemplo minha asa. Vejo penas que estão comigo há bastante tempo e outras recentes.
Chego até a janela, pego impulso e salto...