Escrevo-me

"Perguntou-me o que é que eu escrevia nos livros.

Respondi-lhe que me escrevia a mim.

Escrevo-me.

Escrevo o que existo, onde sinto, todos os lugares onde sinto.

E o que sinto é o que existo e o que sou.

Escrevo-me nas palavras mais intensas: amor, esperança, estrelas,

e nas palavras mais belas: claridade, pureza, céu.

Transformo-me todo em palavras.

Ele olhou-me,

e tudo isto ele sabia antes de me ter perguntado.

Depois, contei-lhe da mulher que existia dentro de mim

e que eu escrevia.

Ela é a mulher mais bonita do mundo.

Encontro-a quando fecho os olhos.

Ela é o amor,

porque nem o sol, nem as manhãs, nem a terra.

E tudo é uma força infinita a erguer-me.

Quando escrevo, tocamo-nos.

O amor é tudo o que existe.

Algo do seu rosto e da sua limpidez

atravessa-me e fica escrito

na palavras que são suas.

E tudo isto é um mistério de beleza,

tudo isto é um segredo impossível de desvendar,

tudo isto é impossível e verdadeiro.

Com ela, sei que cada instante

poderá ser o meu último arrependimento."

José Luís Peixoto e in Uma casa na escuridão. (Quetzal Editores. Pp. 47-48).
Enviado por Jucilene Nóbrega Lima em 01/07/2013
Código do texto: T4367058
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