Esperança...
Era feliz até o fim da tardinha. N’algumas mornas, o sol batendo pelo viés da janela entreaberta, porque a esperança era dada a ser vista com a poeira fina que emergia na luz. Uma esperança tão nítida que parecia envolver o corpo e os cachos de cabelos acobreados. A esperança dos homens, das noites, de todos os mortos não sepultados.
Parecia querer devorar todo o quarto enquanto, aos pedaços, pousava na capa do livro que, estendido sobre o colo, ganhava lágrimas quentes. A esperança, única salvação de tudo.
Enquanto os sonhos, os livros, em essencial, aquele que há dias tentava ler em silêncio perpétuo, pareciam descortinarem em cortejo pelo vácuo escuro do cômodo. As palavras saíam e cresciam nas paredes brancas, negras, pálidas. Tudo suntuoso e tudo sem cor. Já eram passados e sepultados os dias de sorriso. Naquele instante a mais, só o olhar maldoso e impotente penetra os espelhos à procura do que restou da alma de menina. O nada voraz gritava e ecoava entre a casa inteira, da porta para fora, cada pulsar do coração desandado. Era um dia, de manhãzinha, a menina inclinada a poesias e curvas históricas, Luxos e balés. Hoje, uma mulher vazia de esperança, por mais que a esperança, incrustada nos móveis, nas roupas e nas mãos pudesse quase pedir para ser possuída e manipulada. Ela não podia ver. Estava cega demais ao amor, ao vento e a vida que circundava seu mundo estreito.