A CONCEPÇÃO POÉTICA

“Querido amigo! Eu não consegui entender porque um poema em primeira pessoa é um discurso individualista. Alguns dos poemas mais famosos dos grandes poetas que conheço foram escritos em primeira pessoa: "O Inseto" e "A Canção Desesperada", de Neruda, "Ausência" e "Oficina Irritada", de Drummond, "Poética", de Manoel Bandeira, vários de Pessoa (de seus heterônimos ou não), Florbela, Auta, enfim, todas belíssimas peças. O simples fato de se escrever em primeira pessoa, não significa, necessariamente, que o poeta esteja falando de si. Tenho dificuldade em entender isto; se puder me ajudar, serei grato. Abraço, meu bom poeta. Marco Aurelio.”

Estimado amigo! O melhor exemplo é o de Fernando Pessoa, o gênio modernista de Portugal. “O poeta da raça”, como os portugueses orgulhosamente o chamam. Cada um dos seus heterônimos e Fernando Pessoa-ele-mesmo-o-outro – o quase ortônimo, mas não necessariamente – falam no "eu", mas são individuados e distintos os seus discursos e abordagens sobre o estar no mundo. Pablo Neruda começa a alinhavar a sua grande poesia a partir da década de 50, séc. XX, nas "ODES ELEMENTARES". A iniciação anterior, iniciada aos seus 14 anos, é o discurso lírico derramado. Ele começara a escrever em 1917/18. E assim vai... A maioria dos novatos relata-se, fazendo AUTOBIOGRAFIA, e, no viés lírico-amoroso, não produz Poesia, e, sim, um mero recado amoroso, que até poderá vir a ser o embrião de um futuro poema. O EGO não produz Poesia, e, sim, o ALTER EGO. O ego é, apenas, a voz da possessão... E mais: pelo que conheço de tua obra (plenamente ego), só podes gostar dos autores citados, porque te identificas. Cada um tem a visão do mundo segundo o concebe. Eu vejo o "eu", no poema, como fator de exclusão do receptor... À hora em que descobrires a Poesia (também porque começaste há uns poucos anos a conceber textos) poderás sentir o que é estar fora dessa esfera excludente do uso da pessoalização. Mas, se não estiveres aberto ao novo, dificilmente entenderás isso... Peço dês uma chegada aos meus textos classificados como "Tutoriais" e "Teoria Literária" – no site do Recanto das Letras – e comecemos com os teus comentários ao pé dos meus textos, caso a caso. Desta sorte, poderás perceber e visualizar melhor a convivência, no poema, entre o ego e o alter ego. Por certo, teremos um rico exercício dialético. E nos acrescentaremos...

– Do livro ALMA DE PERDIÇÃO, 2012/13.

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