UMA FÁBULA DE LIBERDADE
Ele nunca me pertenceu, mas naquela manhã de primavera, depois de me despertar com o gemido do seu triste canto, resolvi dele me aproximar.
Ser livre sempre fez parte da sua natureza, mas ele não sabia disto!
Era lindo!
Trazia nas penas o ouro do sol mesclado ao verde da mata atlântica!Um canarinho delicado, cujos olhos a vida condenava ao cenário de concreto, os pulmões ao ar poluído de dióxido de carbono e as asas ao limitado bater de encontro às grades enegrecidas de ferro oxidado.
Então muito indignada , depois de lhe fitar por algum tempo, lhe perguntei o porquê de estar aparentemente resignado à gaiola dependurada na área de serviço daquele apartamento.
-Ouvi dizer,disse-me ele, que se sair daqui estou condenado a morte, pois nunca aprendi a ser livre!
-Isto é mentira!-respondi revoltada.
Jamais podemos ser felizes longe da nossa essência! Escuta, disse-lhe em segredo, vamos conquistar a tua liberdade. Amanhã bem cedinho, tu não cantarás para não despertar ninguém, e logo no primeiro raio de sol eu estarei aqui para abrir a porta da tua gaiola.
-E o que eu levarei comigo?-perguntou-me preocupado.
-Levarás a tua essência.O teu canto e a tua liberdade.
-E como sobreviverei?
-Verás que isto te bastará! Na plenitude da essência sobrevivemos da felicidade.
Na manhã seguinte, fiz o prometido.No momento oportuno abri a gaiola e fiquei a esperar que prontamente alçasse seu primeiro vôo.
Qual não foi minha surpresa, quando muito assustado, ele sequer se mexeu do lugar. Então, deixei a porta da gaiola aberta, na esperança de que voasse nas próximas horas.
-Tu tens todo o tempo do mundo...para voares ao teu mundo! – disse-lhe confiante.
Mas, quando lá voltei, logo o percebi apnéico.Num cantinho da gaiola calara o seu canto para sempre.
Só então entendi, que a liberdade não se consegue apenas abrindo as grades, pois as verdadeiras prisões transcendem as fechaduras.
E quantas vezes morremos apenas por acreditar que podemos existir...apesar de livres!