Música no Luto
Muitas pessoas acham que não é respeitoso escutar músicas quando se está de luto.
Meu relacionamento com a música, porém, é muito mais que uma comunhão com a felicidade. Também, é compartilhar o que se é triste e o temeroso. O que é curioso e enigmático. O que é acolhedor e inclusivo.
Quando escuto uma música, consigo me relacionar muito melhor com o meu subconsciente. Consigo escutar claramente as minhas idéias. E tenho uma troca muito mais sincera com as outras vozes que compartilham de minha consciência. Com a música, reverberando em meus ouvidos, me desligo do agora, volto ao passado e passeio com segurança no futuro. Quando a música soa ao meu redor, presto atenção no meu corpo e mente.
Sempre que escutar Jazz ou músicas instrumentais, me lembrarei com carinho do meu pai. Lembrarei-me eternamente das músicas do primeiro CD que ele comprou para mim. E sempre sentirei asco ao lembrar das músicas de Ray Conniff, o mesmo asco que sentia quando ele colocava estes famigerados LPs para tocar nas manhãs de sábado. E hoje, até aprendi a enxergar a beleza nas músicas de Tony Bennett e Frank Sinatra!
Como não me lembrar dos bons momentos que passei com minha mãe ao escutar Stevie Wonder, ou ainda ao saborear o mais delicioso saudosismo quando escuto Kim Carnes cantando os Olhos de Bette Davis. Lembro quando achei seu LP dentro de uma gaveta de velharias. Nele uma mulher loura, vestida de amarelo postada num sofá escuro, teria o poder de marcar a minha infância.
Se me perguntar se acho desrespeitoso escutar músicas quando se está de luto, lhe responderei que desrespeitoso é deixar de usar esse maravilhoso instrumento capaz de marcar momentos-chave de nossas vidas, nos trazendo lembranças como uma máquina do tempo.
Julho 2012