A PROPÓSITO DE UM QUESTIONAMENTO SOBRE CERTO E ERRADO

Os gramáticos normativos são censores e gostam de amarrar, prender, cercear a língua. Apreciam sobre ela colocar rédeas, leis, etc. Apegam-se ao passado, à etimologia das palavras. E adoram dizer que tal ou qual palavra existe ou deixa de existir. Acontece que a língua é viva, humana e se modifica. Tanto se modifica que o latim virou o italiano, o francês, o português, o espanhol, etc.

Conhecer a história de uma língua, a sua etimologia e a sua modernidade é indispensável para compreender o fenômeno linguístico. Os estudos mais modernos da linguística se ocupam de observar o comportamento e a capacidade criativa dos idiomas. E, se uma palavra não existe, de repente descobre-se que passa a existir. Cria-se, inventa-se. A criatividade é uma das mais importantes características de um idioma. A esta capacidade que tem a língua de criar palavras a gramática batizou

de neologismo. As palavras se formam e nascem assim como as estrelas no espaço sideral. Outras vão ganhando a margem, envelhecem e até "morrem".

Algumas discussões são perdidas e inúteis, como agora alguns discutem se existe ou não a palavra presidenta. Pois que passe a existir. Depois será aceita e registrada pelo simples e gracioso motivo de que quem faz e manda na língua é o falante e o escrevente.

Você encontra, sim, o verbo MESTRAR, até com outro significado. E, se o verbo não está ainda autorizado, é bom cuidar disto. O Vaticano diz quem é santo e as autoridades da língua canonizam as palavras. Por outro lado, Deus escolhe quem vai para o céu. Existem as formas mestre e mestra no uso corrente e ainda há muita teima entre gramáticos. Nos trabalhos acadêmicos também estão as anotações MESTRANDO e MESTRANDA.

Agora, com o clima de valorização da mulher, tudo que for para a felicidade geral e o bem feminino, é mais que válido. Eu, particularmente, gosto da palavra Presidenta, independentemente de qualquer estudo sobre a língua.

Veja que, no caso da pergunta formulada pelo meu amigo e colega de profissão, Professor Roberto, ELA ESTÁ MESTRANDO ou ELA ESTÁ MESTRANDA? , a lógica se volta para o verbo SER ou ESTAR. Assim, ELE ESTÁ MINISTRO e ELE É MINISTRO são frases de efeito devastador e a primeira destas fez um ministro brasileiro deixar de ser o que era. Esta história é bem conhecida.

Quando se diz que alguém está mestrando um determinado curso, o pensamento/ o significante equivale a algo como dizer que a pessoa está estudando, está em processo de estudos na fase preparatória para conseguir o título de MESTRE/MESTRA.

Quando se afirma que uma aluna é MESTRANDA, o significante é o de uma condição continuada de pertencimento a um ambiente onde se busca alcançar o título de MESTRE/MESTRA.

Dessa forma, eu diria CECÍLIA ESTÁ MESTRANDO (estudando para ser Mestra) e CECÍLIA É MESTRANDA (é a condição dela em um curso, claro que deve estar estudando também). Do mesmo jeito temos ORIENTANDO E ORIENTANDA, formas substantivadas.

Respeitando a beleza dos estudos que mostram como uma língua se forma, como é naturalmente organizada, como é vestida para o baile social burguês e como se apresenta na intimidade e nas massas populares, particularmente prefiro extasiar-me com a beleza da liberdade das palavras do que metê-las em qualquer camisa de força.

Quando o jovem quer passar no vestibular e nos concursos, recomende-se a aceitação das leis gramaticais _ o que não garante a esse jovem a produção de um bom texto. Esse texto poderá apresentar-se perfeito nas normas e medíocre no conteúdo. Muitos alunos por mim passaram cujo domínio memorizado das normas gramaticais era um fenômeno e até poderiam ganhar fortunas nos programas gramaticoides de linguagem TV. Melhor ter conteúdo e estilo. Se a pessoa não consegue se acostumar com as leis, então, contrate gente capacitada para a aplicação dessas leis.

Quando o jovem amadurecer, quando melhor compreender os fatos da linguagem, ganhará autoridade para fazer da sua palavra lei e entender que o povo é o senhor da língua. O gramático normativo deseja tomar tal posto, mas até agora não obteve êxito. Entretanto, é, sim, importante o seu papel de autoridade legisladora.

Parece difícil conviver num contexto assim, mas não é. Pessoas alfabetizadas são casadas com a Gramática e devem respeito a tal união para um final feliz. Finjamos orgasmos linguísticos. Para falar a verdade, a parceira Gramática Normativa vem renunciando a alguns itens em função desse amor. Olhe aí, querida “esposa”, tentei satisfazer seus anseios neste texto. Agora posso fumar um cigarrinho politicamente incorreto.

taniameneses
Enviado por taniameneses em 02/03/2011
Reeditado em 02/03/2011
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