MENSAGEM - PRECE DE NATAL PARA UMA MULHER
Sei que não podemos ser amigas, que a vida e um destino espantoso fizeram com que nos conhecêssemos para um Abismo.
Sei que oscilo como uma árvore batida pelos vendavais, toda vez que me lembro de ti, e me lembro de ti em quase todos os momentos.
Sei que te lembras de mim e que me carregas onde quer que estejas, como se carrega um Fardo para além das próprias forças.
Sei que nos carregamos assim uma à outra porque na tua alma vasta, tão vasta como a minha, cabe a presença inteira de um mesmo homem de alma tão vasta como a nossa.
Tão parecidas que somos, poderíamos ser grandes amigas, não fora a vida ter destinado a presença deste mesmo homem em nossas almas.
Muito do que me ocorre por dentro quando penso em ti não é belo nem bom, eu o admito. No entanto, luto com estes sentimentos dolorosos e brutais para trazer-me à tona a presença de outros sentimentos por ti nos quais busco compreender-te e compreender as razões do teu ódio por mim que, afinal, sem que jamais o houvesse suspeitado, fui-te a algoz e a usurpadora do tesouro que guardaste e que protegeste ao longo de tua vida, sem saber que ele, tesouro, pertencia a outrem.
O que posso dizer-te? Posso e devo dizer-te que, admitindo que esse tesouro sempre tenha sido meu, ainda assim me nego a qualquer usufruto dele se, para tal usufruto, seja este de que natureza for, seja preciso calcar aos pés o teu destino, mulher, que se eu o fizesse, não sobraria nada em meu rosto que pudesse fitar no espelho.
Neste momento, o mundo semelha um Deserto de três faces, todas refletidas em meu espelho. Tem que haver, oculto nas dobras do Tempo, caminhos de Resgate, para cada um de nós. Tem que haver, porque se não os houver, a vida é e será apenas sempre o Reino do Absoluto Absurdo, e tal Reino a vida não pode ser.
Estamos às vesperas do Natal e eu peço ao Menino que te proteja e te ampare os passos e que te suavize as dores do coração. Não te ouso pedir que me perdoes pelo crime que só agora eu soube que pratiquei, o crime de ter habitado o coração deste homem que ambas amamos há ... séculos... desde o âmago da nossa, tua e minha alma. Não ouso pedir que me perdoes, que também em mim o perdão é algo cuja face me escapa ainda que deseje tanto fitá-la, a esta face, a face do perdão: do autoperdão, do perdão a ele, do perdão a ti, que também a mim tens ferido muito, mulher,feridas que sangram ao longo de todos os minutos. Apesar disso, carrego em algum lugar de mim a Esperança de que ainda nos será dada a Benção de fitá-la, a Face do Perdão Mútuo, no Tempo preparado por Deus para isso.
Fiquemos abrigados sob as asas do Menino, tu, ele - o homem que amamos - e eu, trindade dolorosa deste nosso tempo. Fiquemos abrigados sob as asas do Menino. Que ele, o Menino, nos ajude a nascer de novo no interior de cada um de nós mesmos, amém.
Zuleika dos Reis, na manhã de 19 de dezembro de 2010.