AMOR CANINO

Em 11 de agosto de 1996, quando eu tinha 17 anos, apareceu no portão de nossa casa um filhotinho de cachorro vira-lata. Era uma das noites mais frias do ano, e eu quis recolher o lindo bichinho, mas minha mãe não deixou de jeito nenhum! Ela estava decidida – não queria cachorro em casa! E assim, ela tentou assustá-lo, enxotá-lo... mas o bichinho era teimoso e não saía de jeito nenhum de nosso portão. Estava obstinado em ficar. Mesmo assim – e apesar do frio e da fragilidade do filhote – minha mãe não me deixou recolhê-lo, na esperança de que ele iria embora durante a noite. Ou que passaria alguém na rua, o veria e o levaria embora.

Na manhã seguinte, para nossa surpresa, lá estava o pobre filhotinho ‘congelado’ de tanto frio, encolhidinho de encontro ao nosso portão. Sinceramente não sei como ele não morreu... E vê-lo assim tão geladinho e fraquinho ‘cortou o coração’ de minha mãe, e foi ela mesma quem o recolheu e cuidou dele. Assim, costumo dizer que não fomos nós quem o adotamos, e sim, por sua teimosia, foi o “Tiririca” quem nos adotou. – Sim, o nome que lhe demos foi Tiririca! (idéia de minha irmã, uma vez que naquela época todas as rádios tocavam “Florentina” o dia inteiro... e também pela teimosia do bichinho em ficar em nossa casa).

E Tiririca foi um ótimo cachorro que sempre nos deu muita alegria! Sempre o chamei de “fiel escudeiro” (risos). Quando me casei, Tiririca veio comigo para minha nova casa. E minha mãe ganhou 2 novos cachorros: o Átila e a Bianca.

Em 2004 meu filho nasceu, e mal começou a andar já começou a brincar com Tiririca, que apesar de ser de porte médio, NUNCA o machucou. Ver meu filho brincando com o velho Tiririca nos mostrava que enfim “Tiri” havia encontrado seu verdadeiro dono, como se ele tivesse vindo para nossa casa para esperar esse garotinho que lhe daria tanto amor... e o amor entre os dois era recíproco.

Tiririca tinha olhos que sorriam... mas em fevereiro deste ano, Tiririca partiu. Ou melhor, para minha grande tristeza, tivemos que ajudá-lo a partir, pois o bichinho se recusava a abandonar seu corpinho doente e debilitado de 13 anos. Desejei muito que ele tivesse ‘ido’ de forma natural... mas ele não ia... estava totalmente entregue, já não comia nem bebia nada... totalmente sem forças para se erguer... nem mesmo a cabeça erguia mais... porém, mesmo doente, nos olhava com seus olhos sorridentes e gratos quando nos aproximavamos para cuidá-lo.

Lembro de uma segunda-feira que entrei em casa, retornando do quintal. Entrei chorando de ver tanto sofriento que passava nosso “amicão”... eu nem tinha saído para trabalhar aquele dia, fiquei em casa só para cuidar dele. Nisso o telefone tocou. Mesmo chorando eu atendi, pois poderia ser ligação importante referente meu trabalho. Que surpresa eu tive! Do outro lado uma ‘vozinha’ de criança pequea, gritou com extrema alegria: “Jesus te amaaaaaaaa!!!!” Dito isso, desligou, e eu fiquei ali com o fone mudo nas mãos sem entender o que havia acontecido... mas passado os primeiros segundos, o entendimento me veio de forma clara. Num momento de tanto sofrimento, um anjo havia me trazido a mensagem que eu precisava ouvir, me lembrando de que eu não estava sozinha...

No dia seguinte, não havendo mais como adiar a triste decisão, permitimos que Tiririca partisse. Lembro que antes de adormecer ele fez um esforço para erguer sua cabecinha e olhar para o alto, para o lado esquerdo da sala onde estávamos no consultório veterinário; e eu tive a nítida sensação de que ele via algo ou alguém que nós não víamos. Mas em minha imaginação veio a cena de pessoas que o chamavam com carinho, prontos para recebê-lo e cuidá-lo com todo amor no novo plano para onde ele partia. Depois disso ele baixou a cabeça e foi fechando os olhinhos devagarinho, pegando no sono...

Eu, meu marido e meu filho, ficamos com ele até ele adormecer completamente. A injeção letal viria depois disso, mas não tive coragem de ficar, mesmo sabendo que ele não teria sofrimento nenhum – ao contrário, se libertaria do sofrimento que o câncer lhe impunha. Assim, saí da sala com meu filho, ficando apenas meu marido para o momento final.

Tudo terminado, saímos nós 3 chorando do consultório veterinário. Nosso amicão havia partido. Um rapaz do consultório, vendo nosso sofrimento, correu até o carro. Baixei a janeala e ele nos ofereceu um cachorrinho vira-latas que estava lá para adoção. Mas eu não aceitei naquele momento. Levar outro bichinho para casa naquele mesmo dia seria como tentar ocupar o lugar do Tiririca – mas este lugar era e é só dele. Mesmo que venha outro cão e mesmo que seja muito amado, ele não poderá ocupar este lugar. Um novo amicão terá seu próprio lugar em nosso coração, mas o lugar do Tiririca estará sempre lá... o lugar do “fiel escudeiro”. E aquele não era ainda o momento.

Nove meses já se passaram desde então, e sentimos que agora é hora de abrir novamente nosso coração, e hoje eu e meu marido vamos ver um cachorrinho que está para doação numa residência próxima à nossa. Meu filho de seis anos tem pedido muito um cachorro, e juntos já escolhemos até o nome... na verdade escolhemos dois nomes, e queremos ver a cara do cachorro para ver se ele tem ‘cara’ de Max ou ‘cara’ de Zorro.

Confesso que eu e meu marido não queríamos mais cachorro nenhum! A dor que passamos com a partida do ‘Tiri’ foi muito grande... mas faremos essa nova adoção por nosso filho. Seria muito egoísmo nosso privá-lo do amor e alegrias caninas durante sua infância, só porque nós, adultos, não sabemos bem como lidar com as perdas e emoções. Pois é exatamente isso! Hoje eu estava a pensar nos reais motivos de não querermos um novo cachorro... e o motivo, é claro, é o medo da dor da separação daqui há 13 anos no futuro (aproximadamente). Tempo curto que vive um cão! Mas pensando sobre tudo isso, de repente me veio uma clareza de pensamento me mostrando como estamos errados! Por temer o futuro – e futuro distante! – devemos nos abster das alegrias do presente? De repente tudo isso me pareceu tão irracional!

Foi como se “alguém” me dissesse: “No futuro, quando chegar a hora de Max/Zorro partir, simplesmente agradeça toda a alegria que ele proporcionou, e deixe-o ir sabendo que ele cumpriu seu caminho, exatamente como cada ser vivo que tem seu tempo e caminho para completar”.

Confesso que agora estou ansiosa pela visita à casa que tem 3 filhotinhos para escolhermos um para nossa adoção. Sabemos que é um cachorro mestiço de basset, ou seja, um cachorro de porte pequeno. Meu filho ainda não sabe que faremos essa visita hoje, e se tudo der certo, meu filho terá uma surpresa hoje à tarde quando chegar em casa vindo da escola.

E estando meu filho com 6 anos de idade, pelos nossos cálculos, nosso novo amigo canino poderá alegrar TODA a infância de meu filho – se Deus assim permitir.

Escrevi essa nossa história (entre lágrimas e sorrisos) apenas para compartilhar a lição que aprendo hoje: que é preciso olhar o lado bom da vida... é preciso contabilizar as alegrias que algo ou alguém nos traz, e deixar que essa alegria supere qualquer vestígio de tristeza. O otimista olha sempre o copo ‘meio cheio’, e nunca ‘meio vazio’.

É preciso abrir nossos corações e permitir a felicidade novamente entrar.

* Voltarei mais tarde para completar esse texto e contar o desfecho desta história...

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Desfecho da história (30/11) - os filhotinhos para adoção eram tão lindos, que adotamos 2!!!!! Assim, agora temos o Max e o Zorro. Nossa casa está cheia de alegria e nossos corações estão repletos de amor!!!!

Lady J
Enviado por Lady J em 17/11/2010
Reeditado em 30/11/2010
Código do texto: T2620609
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