Certa vez, quando eu era criança, minha avó, uma imigrante russa, disse que as pessoas nos Estados Unidos não dão com o coração. “Quando se dá aqui”, declarou, apontando para seu plexo solar, chamando-o de nome que jamais aprendi a pronunciar, “é como manter um livro-caixa. Eu lhe dou três, você me dá três. Eu varro o chão, você corta a lenha.”

Ela afastou a mecha de cabelos brancos dos olhos com o dorso das mãos avermelhadas, balançando a cabeça de um lado para o outro, sussurrando: “na, na, na, na, isso não é dar; é negociar. A alma se vai quando se dá desse jeito. Dar deve vir daqui”, disse ela, tocando de leve o centro do peito, com seu dedo frágil. Quando se dá com o coração, não se quer nada em troca. Não há dívida nem devedor. Dá-se apenas pelo prazer de dar. Quando se dá assim, somos preenchidos e não esvaziados.

“O coração jamais se gasta. Quanto mais se tira daqui, mas cheio ele fica. Então, ela limpou as mãos no avental amarelo e me puxou para si. “É como dar um abraço. Lembre-se disso ketzaleh*. Lembre-se de dar com o coração. Mesmo para estranhos. Quando se dá com o coração não há estranhos. E fique atenta quando alguém lhe der assim, para não se esquecer de dizer obrigada.”

Décadas mais tarde, enquanto lutava contra uma doença grave, viajei para o sul a fim de assistir a uma conferência, em busca de respostas às minhas dúvidas. Uma das conferencistas era um escritora e poetisa fantástica chamada Maya Angelou. Maya discorreu sobre como sobreviver a uma infância cheia de terror e de violência. O seu caminhar no escuro foi guiado por inúmeros atos de criatividade de autores e artistas. Eles não estavam tentando fazer algo de bom para ela. Eles nem mesmo sabiam de sua existência. “O trabalho deles me inspirou, ajudou a moldar meu pensamento, mostrou o que era possível”, lembrou ela. E eu jamais me esqueci de dizer obrigada pelos gestos de bondade feitos ao acaso”. Sem saber, sem jamais ter ouvido meu nome ou reparado no vestido vermelho que eu usava naquele dia Maya Angelou deixou as impressões de seus dedos em meu coração, como se ele fosse feito de cera quente.

Voltei para casa vendo mundo através de lentes diferentes. O destino era tão injusto agora quando partira para a conferência, mas tudo que conseguia pensar era nos incríveis presentes que me haviam dado todos os dias de minha vida: a suavidade da face de um bebê, os lírios de Monet, as ondas do mar, a música de Tchaikovsky que me fazia girar em volta da cama até me transformar em um bombom imaginário, as canções de Johnny Mathis que me ensinaram a amar, os contos de Mark Twain que me mostraram como ser corajosa, o jardim da senhora McLean que apontou a beleza dos quintais das ruas do Brooklyn, um livro de Natalie Goldberg que me levou a descobrir a voz interior que me instigou a escrever.

Na estrada, cada indicação de saída parecia abrir um novo caminho que me conduzia ao emaranhado de riquezas que eu me esquecera de perceber. A viagem de volta da conferência foi abastecida pelo meu desejo de buscar atenção. Minha viagem de volta foi exatamente isto – a volta às lições sobre o dar do fundo do coração que minha avó me ensinara tanto tempo atrás. O resgate da consciência de que eu estava conectada ao céu estrelado, ao vibrante nascer do Sol, à terra morna do jardim da senhora McLean – se ele podia florir todas as primaveras eu também poderia!

Lembrei-me de que eu sabia como me encantar com uma história, como dançar sem roupa ao amanhecer, como cantar no chuveiro com toda a força dos meus pulmões e como repousar tranqüila no silêncio do cair da tarde. Naquela viagem de volta para casa, minha alma parou de sofrer e este foi o começo da minha cura. Nos workshops que meu marido e eu lideramos, frequentemente ajudamos as pessoas que estão passando por situações de muita dor e sofrimento. Essas pessoas estão procurando se desenvolver deixando para trás os acontecimentos negativos de suas vidas, buscando meios de quebrar as barreiras atrás das quais muitas vezes nos escondemos ou nos isolamos para nos defender.

Como parte desse processo, nos últimos anos temos pedido às pessoas que reconheçam os braços que as acolhem todos os dias – os gestos de bondade em suas vidas. Eu lhes falo sobre pessoas e acontecimentos que me gratificaram, não porque eu merecesse, mas simplesmente porque aconteceram. Então sugiro um tema como: “Aqueles que o ajudaram a aprender a amar” ou o que lhe deu forças nos momentos difíceis.” (...)


Nota: *Gatinha, yidish

[Dawna Markova]
In: Gestos de Bondade
UMA COLETANEA AO ACASO
Autor: Conari Press
Editora Ágora, 1995
p. 14-17
 


Band Aid - Do They Know its Christmas 1984
http://www.youtube.com/watch?v=w5cX_ncZLls

USA for Africa - We Are The World (w/M.Jackson) + Lyrics HQ http://www.youtube.com/watch?v=k2W4-0qUdHY&feature=related


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7 Pensamentos para Educadores
 
Ninguém é tão grande que não possa aprender, nem tão pequeno que não possa ensinar. (Píndaro, poeta romano)
 
Ninguém ignora tudo. Ninguém sabe tudo. Todos nós sabemos alguma coisa. Todos nós ignoramos alguma coisa. Por isso aprendemos sempre.(Paulo Freire, educador brasileiro)
 
Mestre não é só quem ensina; mas quem, de repente, aprende.
(Guimarães Rosa, escritor brasileiro)
 
Não confunda jamais conhecimento com sabedoria. Um ajuda a ganhar a vida; o outro a construir uma vida.
(Sandra Carey, escritora norte americana)
 
Sábio é aquele que conhece os limites da própria ignorância.
(Sócrates,filósofo grego)
 
Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina.
(Cora Coralina, poetisa brasileira)  
 
O saber a gente aprende com os mestres e com os livros.
A sabedoria, se aprende é com a vida e com os humildes.
(Cora Coralina) 
 
 ________________
 
Paul McCartney & Wings - Tomorrow
http://www.youtube.com/watch?v=mFFAD04-v3Y&feature=related

(art by Lisa Evan
c/ arte final: angelalib)
 

Rosangela Aliberti
Enviado por Rosangela Aliberti em 04/11/2010
Reeditado em 04/11/2010
Código do texto: T2595905