Um ritmo de sinfonia, vozes do além.
Um ritmo de sinfonia, vozes do além. As músicas de bailes. Do além, não do agora, mas de dentro de si. De suas lembranças. Daquilo de vozes e sons que lhe restou. Ela ouvia vozes em todo o tempo. Estava surda pela idade, quase noventa. Mas só nos últimos dias tem falado sobre as vozes e músicas que ouve. Nos conta a todo tempo.
- Como agora a música está alta, ela diz.
- Ouvi um "pai nosso" e depois uma "ave maria", acompanhei. Relatou ontem durante a comemoração do aniversário do meu irmão.
Enquanto minha cunhada prestava uma homenagem a ele eu ia repetindo as palavras ditas para que ela pudesse acompanhar tudo.
Estava feliz aparentemente, mas não conseguiu dormir toda a noite. Meu pai disse que ela não pregou os olhos dizendo que quer ser operada a qualquer custo. O médico está temeroso em decorrência da idade e tenta avaliar a real necessidade de fazer a cirurgia de outro modo. Irei falar com ela mais tarde. Tentar tranquilizá-la. Estava muito tranquila até sair do médico ontem. Na saída nos perguntou se de fato era câncer. Não se tem certeza absoluta ainda. Mas estamos todos muito apreensivos. O tumor no pâncreas é bem grande. O médico preocupa-se também pelos rins. A UNIMED não liberou o exame até a próxima semana.
As lembranças do sofrimento de minha tia, a irmã querida dela deve ter sido o motivo de ela não ter conseguido dormir. Com esta atitude dela fica notório que ela quer tomar suas próprias decisões. Eu tinha pensado em me reunir com meus irmãos e pai decidiríamos sobre ela fazer ou não a cirurgia sem que ela se preocupasse com isto. Mas ela mostrou que está "inteirada", que quer estar presente nesta decisão. Aliás, se a decisão fosse para hoje a resposta dela seria sim eu quero operar. De qualquer modo falaremos com ela novamente, as coisas são mais complexas do que parecem ser.