08 de março de 1857!
Hoje quero silenciar...Sim com o pensamento desejo retornar na história. 1857 é o ano escolhido. Desejo percorrer os corredores de uma fábrica norte-americana e inspirar o sentimento que povoa o ar. Sim desejo sentir o passo decidido e o olhar altivo das tecelãs acostumadas a tecer fios. Sim elas se tornam tecelãs da vida e da história. Desejo me nutrir daquela certeza quase insana de que uma vez unidas algo podem conseguir. Desejo aprender com aquelas mentes a tecer com coragem e audácia a minha própria história.
Desejo sentir naqueles olhares a força que vem de um sentimento de poder que beira a insanidade da onipotência.
E no ânimo acalorado desejo me contagiar com a coragem que pode mover montanhas intransponíveis.
Sim desejo sobrevoar aqueles corredores. Entrar nos recintos e ouvir o sussurro proibido, mas intenso. Desejo encontrar aquelas mãos calejadas que ainda empunham a bandeira da luta e reivindicam prerrogativas de igualdade. Desculpem-me, mas hoje não quero olhar curvas, ou traços finos e delicados. Não! Hoje quero sentir o olhar quase rude. As mãos fortes. Os traços sérios. Os semblantes sisudos. Hoje não quero pensar nas fofoquinhas de rodas de chá ou nas discussões por liquidações e ofertas. Não. Hoje quero beber do sentido vital da luta. Da coragem de verdadeiras lobas, talvez iludidas por uma ideologia, mas certas de que unidas poderiam lutar. Hoje quero celebrar mais que corpos e rostos belos ou sensuais. Hoje quero orar. Sim quero orar.
“Santa incógnitas de 08 de março de 1857, ajudai-nos a nutrir o desejo de mudanças!”.
Santas desconhecidas, mas carbonizadas, ajudai-nos a queimar todo desprezo e preconceito!
Santas tecelãs ajudai-nos a tecer os fios de uma história igualitária!
Santas anônimas ajudai-nos a resgatar a nossa identidade humana na certeza de que somos valiosas!
Santas lutadoras, ajudai-nos a empunhar ajudai-nos a mostrar mais que um corpo sedutor”.
Ao percorrer os arredores dessa fábrica sinto o cheiro forte da fumaça que sobre aos céus.
Ali se misturam corpos e maquinas. Seres vivos e objetos inanimados.
Não quero sair tão rápido. Não por masoquismo, mas desejo invadir as chamas e contemplar o olhar daquelas que queimam. Sim desejo me aproximar das tochas vivas no desejo de ser chamuscada com um pouco daquele odor de luta e dignidade.
Desejo nesse encontro roubar alguma dessas chamas para iluminar o obscuro universo feminino e ir mais além do corpo e de suas tantas ilusões.
Infelizmente o silêncio recai sobre tudo. O véu negro da fumaça tudo esconde. Mas o cheiro da luta, o odor da busca, o brilho da conquista não se perde. Mas o que ela conquistaram?
Elas conquistaram a certeza de que diante da humanidade transformada em animosidade existe a igualdade.
Elas conquistaram a certeza de que para o poder gritante homem e mulher são contabilizados como ameaça a ser extinta.
E particularmente elas conquistaram, para mim a certeza de que sou mais que corpo. Que posso lutar. Que posso incomodar. Que posso perseguir. Que posso agir. Que sou humana e sei ser forte.
Por isso hoje invoco as santas incógnitas de 08 de março de 1857! Que elas me protejam e me ensinem...amém...