Comparaçao.
Comparação.
Examinei as cavernas de minha memória onde guardo as minhas recordações de minha infância. Não encontrei nada, absolutamente nada, que se parecesse com uma memória infeliz. Memória de dor, isso encontrei, perda do meu herói aos 6 anos, necessidades, diversas, dor de quedas, de ferimentos, dores de dente, de barriga,Mas dor e infelicidade são coisas diferentes. Há dores que são felizes.
As razoes para ser feliz eu não tinha. Meu herói havia morrido, minha mãe analfabeta, sem experiência perdemos tudo. Fomos morar em uma casa feia, onde não tinha luz elétrica: de noite acendiam-se os lampiões, que atraia muitos insetos. Não tinha água dentro de casa: Eu e minha mãe íamos buscar e tirar no poço, não tinha chuveiro: tomávamos banho de balde, bacia, com água aquecida no fogão de lenha. Não tinha forro: Quando chovia ficava preocupado em guardar um plástico para não molhar a cama, e o barulho da goteira no plástico era uma sensação única. Não tinha privada, o que havia era a famosa “casinha”,do lado de fora.
Não tive brinquedos comprados, Não me lembro de nenhum sequer. E, no entanto não encontrei em minha memória nenhuma infelicidade. Eu era um menino livre, pelos campos, que amava caçar, coisa boa, velhos e bons tempos, amava as paisagens e os riachos, os matos, apanhar gabirobas, marmelos, macaúbas, sempre com o embornal cheio de pedras escolhidas a dedo, e um estilingue com forquilha de leiteiro, a melhor.
Nessa época eu não sabia que éramos pobre. No meio daquela pobreza éramos ricos. Tínhamos um rádio de pilhas grandes que toda noite era nossa maneira de ouvir as notícias, O primeiro jogo que lembro de ter ouvido no rádio foi: Brasil e Holanda, no ano de 1974 em que o Brasil perdeu por 2 a 0 e foi eliminado da copa do mundo.
Mudamos – nos para a cidade. Foi então que fiquei sabendo o que era infelicidade. Fui estudar em um colégio totalmente diferente do que eu estava acostumado a estudar. Nesse novo colégio tinha belas meninas, meninos bem vestidos, e que falava de maneira diferente de muitas palavras que eu falava. Foi inevitável tive de me comparar com eles. Segundo Rubens Alves, a comparação é uma operação lógica e indolor. Foi Nesse momento da convivência com os meninos do colégio, comparei-me e descobri-me pobre.
Nada me foi tirado. Continuei a ter as coisas que me haviam feito feliz. Só que, depois das comparações elas ficaram feias, estragadas, motivos de tristeza e vergonha. A Inveja sempre faz isso: ela destrói a casa boa que temos. Senti-me pobre, feio em relação aos outros meninos com suas roupas diferenciadas, ridículo, humilhado, jamais convidei qualquer colega para que viesse á minha casa, Não queria que eles vissem a minha pobreza. Foi a inveja, que fez Adão e Eva perderem o paraíso. Lugar de delícias tinham tudo para que qualquer ser humano fosse feliz.Veio a serpente especialista em inveja e riu-se da felicidade deles “Vocês pensam que são felizes...” É que vocês ainda não viram o mundo dos deuses, lindo, atraente, magnífico. Vocês querem? É só comer esse fruto mágico...” E a malvada lhes deu fruto da inveja para comer.Não lhes mentiu.Eles viram mesmo um mundo belo - e nesse momento os frutos das árvores do paraíso apodreceram, as folhas começaram a cair, as fontes secaram e eles se sentiram feios: começaram a esconder-se um do outro.
A inveja não mata.Ela só faz destruir a felicidade. Isso não acontece nunca. Isso acontece todos os dias. ( j.f.Alvarez)