REFLEXÕES SOBRE A VIDA, O DESEJO E A FELICIDADE
O que se pode fazer quando tudo aquilo se deseja parece está
distante de nossas possibilidades? Como conviver com essa falta
que amargura o coração de quem se sabe carente, sente os desejos e é obrigado a aceitar a impossibilidade de concretizá-los?
Ele conhecia bem essa angustia da falta e do desejo. Desde menino trazia consigo esse sentimento de desejar, de possuir, de ter, de ser alguém ou representar algo com um grau de importância que ele mesmo não sabia como expressar. Sentia a dor física que essa falta provocava. Um buraco no peito, uma incapacidade de raciocínio lógico, uma angustia que o levava a considerar-se o mais infeliz das criaturas sobre a Terra. Não era uma carência material, ou a falta de estruturas mínimas para uma vida confortável e sadia, tudo isso era oferecida pelos seus pais. Era uma carência existencial, um momento de distração do criador, uma desatenção mínima e ele teria nascido faltando alguma coisa. A conhecida sensação de buraco no peito retornava mais forte, as angustias triplicavam, o medo do que poderia acontecer invadia sua alma e seus pensamentos. Seria medo da morte? Mas não temia a morte, pelo contrário tinha por ela certa simpatia e agradecimento. Simpatizava com a certeza de encontrá-la um dia e lhe era grato por ter levado embora alguns, antes que estes pudessem lhe causar mal.
Temos o péssimo hábito de nunca estarmos contentes com o que somos e com o que construímos. Nossas realizações podem até ser importantes e consideradas, em algumas situações, como válidas e representantes daquilo que almejávamos construir. Entretanto, esse comportamento é reflexo da adequação a que nos submetemos para parecermos normais, no fundo não valorizamos tanto assim nossas realizações e conquistas. Aquele egocentrismo infantil, aquela analise do mundo e dos outros continua acontecendo a partir de nossos umbigos. Pouco nos interessa saber do outro, queremos mais é vê o nosso lado. Não, não somos felizes! Felizes são eles que têm isso, possuem aquilo, podem comprar o que quiserem e a esta hora estão passeando de lancha.
Conhecemos pessoas que se tivessem vivido um quarto das experiências que vivemos estariam plenas na realização de seus desejos. Se analisar-mos veremos que nossos mais profundos desejos e realizações não passam de hábitos cotidianos para alguns e, mesmo esses alguns, estão cheios de angustias e preocupações quanto aos seus desejos. Porque desejamos coisas diferentes. Estaria no desejo a causa maior da infelicidade?
Sentia a falta de algo, de um pouquinho a mais para ficar plenamente realizado e mesmo quando conseguia esse pouquinho, sentia a falta de mais. A felicidade é como uma droga poderosa quem dela experimenta não consegue mais largar, quem nunca experimentou já ouviu falar e se morde de curiosidade para conhecê-la. O que não sabem é que felizes são os que não a desejam. Os que aceitam tudo do jeito que é, sem questionamentos, sem dúvidas, sem revide. A vida em sociedade foi feita para os passivos, para os que baixam a cabeça, para os que oferecem o outro lado do rosto depois que um é esbofeteado.
Há momentos em que cometemos determinados atos, assumimos rígidas posturas ou nos armamos até os dentes para defender algo, pode ser um objeto, uma idéia, uma crença... Ao fazer isso transferimos nosso ponto de referência, que deve ser nos mesmos, para esse algo, essa alguma coisa. Nossas atitudes passam a ser norteadas a partir dessa escolha. Temos o campo de visão reduzido. A unilateralidade impossibilita que vejamos o que acontece ao lado, atrofia nossa capacidade de pensar. Com o passar do tempo essas coisas se materializam, tomam corpo e vida própria, independentes de nos, que os criamos e tão reais se tornam que muitas vezes mesmo sabendo que o ato, o gesto, a atitude, o pensamento, a postura, ou qualquer outra manifestação do caráter humano não é correto, ou não cabe naquela situação especifica, nos o cometemos.
Achamos que as coisas são o que são por serem. Que tudo já foi determinado e que essa determinação imposta é correta, sacra e deve ser aceita sem questionamentos para não prejudicar o equilíbrio das coisas. Mas, de qual equilíbrio estamos falando? Deste que mantêm alguns poucos tão felizes e realizados e remete outros ao mais profundo vazio? Esse equilíbrio que prega o amor entre os homens, a fraternidade, e que diz sermos todos iguais perante a Deus? Mas como, se Deus nem neste mundo reside? Se Deus criou mesmo esse mundo e tudo que há nele por que então deliberou sua administração aos homens se sabe que os homens são egoístas e não medem esforços nem respeitam o próprio Deus quando se trata de alcançar seus objetivos? Por que Deus não ficou, ele mesmo aqui, na sua criação a administrá-la, a indicar o caminho correto que os homens deveriam seguir?