A RODA DA VIDA

É tão rica a correspondência entre os criadores artísticos, principalmente nestes tempos de rápida e intermitente interatividade graças à internet, que me sinto na obrigação de registrar determinados colóquios havidos. Sempre penso que esses registros poderão servir como memorialismo e uma espécie de crônica de costumes, aos olhos da posteridade. Peço escusas à Maria, do site do Recanto das Letras. Desejo surpreendê-la com a publicação, ao mesmo tempo em que registro o seu pensamento que, de pronto, se depreende divergente de meu “modus faciendi”, em Poesia. Os dados com que me obsequia a cada mensagem são estimuladores, como o leitor bem pode aquilatar. Vamos ao diálogo intermitente:

Original Message

From: "Recanto das Letras" <recantodasletras@recantodasletras.com.br>

To: "Joaquim Moncks" <joaquimmoncks@brturbo.com.br>

Sent: Thursday, April 16, 2009 12:20 AM

Subject: Contato de visitante

Assunto: O SILÊNCIO TAMBÉM FALA.

Nome: Maria.

Mensagem:

Pelo seu silêncio creio que o ofendi outra vez com meus ataques de sinceridade. Perdão. Acho que as pessoas preferem que a gente sempre finja que gostou ou que concorda com tudo que dizem. Às vezes fico pensando e digo para mim mesma: sabe Maria, todo mundo tem de pensar igual. Todo mundo precisa se uniformizar ao que alguns ditam como leis e regras... Para tudo... Até para a poesia. Os tempos mudam, até o clima mudou... Claro, prá pior... Mas tem coisas que mudam para melhor também. Por que as palavras não mudam? Veja, mudaram até o nosso dicionário e o jeito tão quente de falarmos para adaptar tudo ao mundo ao redor... Por que a poesia não pode mudar? Por que o pensamento precisa ficar imutável? Bom, sei, vais dizer: isso vale tanto para mim, como para ti nobre “colega”... Nunca chegarei aos pés de um poeta de verdade. Nunca alcançarei nem os pés de meu mestre, mas... não posso parar de escrever. Mesmo que, para alguns, isso não seja poesia pura. Desculpa se lhe feri com meu comentário. Talvez, como já aprendi: ele não tem nada a ver com o texto.

Mensagem Original:

Data: 16/04/2009, 13:24:37

De: Joaquim Moncks <joaquimmoncks@brturbo.com.br>

Assunto: Re: Contato de visitante

"Ainda bem que não entendo nada disso. Senão teria de estagnar, enforcar, matar as palavras que já estão nascendo e desejam jorrar para fora de mim. Me fala, Joaquim: onde a inspiração pura? Por que poetas e mais poetas, críticos e mais críticos literários falam nela? Ela existe ainda? Creio que não, no seu mundo e pensar poético. Lá só sobrevive a minha mais matusalética... (será que poderia existir uma palavra assim? – no meu mundo das letras sim !) desconhecida transpiração. Ah! Eu leio o seu texto sim. Do início ao fim. Penso e penso, aprendo, aprendo, mas... não me convenço. Ergo o já esquecido cabo de guerra. Quando é que vais deixar teu coração se enternecer com o sentimento mais puro, mais deslumbrante, o primeiro que brotar, ao ler uma linda e encantada poesia? Ao contemplar a magia da natureza e suas nuances de vida? Ao ouvir o retumbar do coração e sentir a pele arrepiar diante de um verso de amor? Quando deixares isso te tomar o espírito, te tocar a alma e aquentar o coração... Então sim, voltarás a escrever poesias sem a tal da minha falecida transpiração...

Enviado por Maria em 14/04/2009 22:25

para o texto: SOMENTE O ALTER EGO PRODUZ POESIA (T1531235)"

Obrigado por tuas contribuições, Maria! Recebo e respeito a tua opinião, embora discorde dela, tens o direito de dizê-la tal como a concebes. E até acho que estás em processo de síntese dialética neste assunto. Se já estás pensando sobre tal ou qual, nem tudo está perdido... Não me ofendo porque alguém discorda do que penso. Fico ruminando pra ver se me pode ajudar a pensar diferente e a encontrar soluções diversas. Creio que sou um condenado a pensar. Mas não pretendo que todos aceitem o que digo. Realmente, o comentário paralelo, muitas vezes nada tem a ver com o texto publicado. Pode até surgir como instigação para a confecção de um “intertexto” literário, aproveitando o tema desenvolvido. Mas, tal como ocorre comumente na net, os “comentários” acabam sendo uma conversa informal. Como somente aceitas a inspiração, nunca vais crescer, em Literatura. Perdão! Recolho-me ao silêncio em tua homenagem. Dá uma olhada no último texto, POEMA EM PROSA E PROSA POÉTICA: http://recantodasletras.uol.com.br/teorialiteraria/1540627 Talvez possa te ajudar a pensar mais sobre o tema e outros correlatos.

Original Message

From: "Maria"

To: "Joaquim Moncks <joaquimmoncks@brturbo.com.br>

Sent: Thursday, April 16, 2009 10:28 PM

Subject: Re: Contato de visitante

Não almejo crescer, Joaquim. Não almejo mais nada na literatura. Só quero escrever o que penso, o que sinto, o que vejo, o que talvez sei, ou... não sei. Pra quê? Pra que os vivos saibam quem sou depois que morrer? É. Eu sei que o comentário não tem a ver com o texto em si como um todo ou com a intenção dele, mas tem com parte dele sim. Não sei porque, mas quando leio algumas coisas tuas (só algumas quando tocas neste assunto em especial – nem que seja uma linha) um sentimento nada elegante me toma a alma. Acho que é uma braveza perdida dentro desse coração que me veste o interior. E não consigo conter as palavras. O que fazer? É assim que sou e é assim, ¨sentindo ¨e respondendo a cada emoção que escrevo. É. Sei que nunca vou crescer. Já disse isso. Jamais chegarei nem na sola do pé do meu mestre. Mas, não almejo mais nada Joaquim. E o que almejei nunca consegui. Não fica em silêncio com Maria, não. Não precisa ficar. Assim como sei brigar eu sei ser amiga e querida também. Obrigada, já li o texto também. Costumo ler tudo o que publicas, mesmo que ultimamente não tenha comentado nada, nem de ti, nem de ninguém. Aliás... tinha pensado até em parar de escrever... mas a teimosia das palavras não me deixa em paz também. Me dedicar só a fotografar o que é belo... Você é um condenado a pensar e eu a escrever o que penso. Meu cárcere é a escrita, pelo menos enquanto meus olhos ainda podem ver. Fica bem. Abraço. Maria.

Mensagem Original:

Data: 22:57:21 16/04/2009

De: Joaquim Moncks - Gmail < joaquimmoncks@gmail.com >

Assunto: Re: Contato de visitante

Agradecido por haveres compreendido o meu silêncio. Se não queres crescer, somente escrever, respeito. O poeta é o único artista a que não está reservado o sucesso em vida... O tempo é que se encarregará de sua obra. Mas é bom refletir sobre ela.

Original Message

From: "Maria"

To: "Joaquim Moncks - Gmail" <joaquimmoncks@gmail.com>

Sent: Monday, April 20, 2009 8:39 PM

Subject: O TEMPO

O meu tempo já acabou Joaquim. Já passou. Eu sei que não compreendes, mas para escrever me falta o principal. E esse principal eu já perdi mesmo antes que soubesse o que era e que tinha encontrado. Por isso, o que lês, desculpa, nem sei se tem lido alguma linha minha – nunca vai ser melhor... nunca. Assim que sair da toca, e for ao centro da cidade, vou efetuar o depósito para a compra de teu livro. Eu só não sei se já envio o endereço porque estou para me mudar a qualquer momento e tenho medo dele não chegar em minhas mãos antes. Mas logo que estiver em minha casa definitiva eu mando o endereço. Até. Abraço. Maria.

Original Message

From: Joaquim Moncks - Gmail

Subject: Re: O TEMPO

To: Maria

Sent: Tuesday, April 21, 2009 12:56 AM

Querida Maria! Tem algo que realmente não compreendo: é este desânimo frente ao futuro, este desconsolar-se... Sei que és comandada pelos sentimentos, como reafirmas a cada vez que a ti falava como estudiosa de Poesia, e não meramente à escriba inspirada, cuja sedimentação está na compulsão sensitiva, nem digo tanto sentimental. Este é o teu "tendão de Aquiles", a tua parte vulnerável. Não importa qual seja o motivo que te leva a me revelares (conjunturalmente) esta objeção que maneia o "principal" já perdido... Curioso é que, dantes, quando eu examinava os teus textos, sempre te arvoravas, em "unhas e dentes", na defesa de tua criação emocional. Agora, já que tenho me recolhido ao silêncio em tua homenagem, sempre respondendo afirmativamente às tuas objeções e ao pensamento divergente, te vejo insurgida em relação a textos de terceiro, onde procuro fazer a provocação, a instigação criativa, procurando – repito – que ocorra a síntese dialética, que sempre é um amadurecimento intelectual. Realmente não consigo entender a expressão inicial, na mensagem acima: "o meu tempo já acabou, Joaquim." Acho que nada está acabado, pois estás viva, diligente, ativa. Continua, amada, enquanto há vida, "tudo corre como dantes no quartel de Abrantes", como dizia o antigo provérbio português. Conta comigo, mesmo que não aceites os métodos que proponho. Tu tens em mim o irmão condenado ao pensar, que vai morrer antes de ti, por certo, mas vai apostar na vida em todo o sempre. E, acaso me faltem esperanças – terei a ti, a postos – para me fortalecer o espírito. O máximo que pode ocorrer é continuarmos divergindo no outro plano espiritual, pois já temos raízes que fortalecem e emulam a convivência. Conta com o meu apreço. Quanto à aquisição de meu livro, quem faz a hora és tu, amadinha! O livro te esperará, por certo! O que importa é que estás nas páginas dele em vários momentos...

Original Message

From: "Maria"

To: "Joaquim Moncks - Gmail" <joaquimmoncks@gmail.com>

Sent: Tuesday, April 21, 2009 1:58 PM

Subject: Re: O TEMPO

Talvez o problema seja que toda minha vida eu só aprendi a brigar. Passei tanto tempo lutando contra tantos movimentos e tragédias que já não sei mais ser diferente... E se não há tempestade para enfrentar, faço o vento soprar tão forte que ela logo se faz acontecer... E se não há briga, eu mesma a construo... Obrigada por tudo Joaquim. E, veja... o dono do tempo é Deus. Ele pode me querer antes no céu...

Original Message

From: Joaquim Moncks - Gmail

To: Maria

Sent: Tuesday, April 21, 2009 5:32 PM

Subject: Re: O TEMPO

Maria de todas as horas! Que estejas bem! Tens uma vida tão rica em enfrentamentos que só podes ser uma vencedora neste campo do viver!

Um escritor que não tenha passado por tragédias dificilmente poderá produzir algo que seja bem recebido pelo público. Será difícil que traduza algumas situações com verossimilhança... Repito o que já te disse um dia: Do Nada nasce o Nada! Eu também tenho o privilégio – e digo isto por vezes – o de organizar a oposição contra mim. Mesmo que ela nem exista... Mas o tempo tem me ensinado a ser paciencioso e a ouvir a voz do tempo.

Bem quanto à outra margem do rio da vida, a barca de Caronte que nos espere... Temos relatos para a posteridade, e a estamos construindo. Combinado! Já tenho alguém que esperarei ou me esperará para uma cerveja ou para um sorvete. Dizem que o arcanjo Gabriel, nas horas de folga, adora jogar canastra. Mas, por força de suas tarefas sem horário, nada bebe. Nem caipirinha, quando é tempo de carnaval...

– Do livro O HÁLITO DAS PALAVRAS, 2006/2012.

http://www.recantodasletras.com.br/mensagens/1551674