Metade

E que a força do medo que tenho

Não me empeça de ver o que anseio

Que a morte de tudo que acredito

Não me tape os ouvidos e a boca

Porque metade de mim é o que grito

Mas a outra metade é silêncio

Que a música que eu ouço longe seja linda mesmo que tristeza

Que a mulher que eu amo seja prá sempre amada mesmo que distante

Porque metade de mim é partida

E a outra metade é saudade

Que as palavras que eu falo não sejam ouvidas como prece

Nem repetidas com fervor

Apenas repetidas como a única coisa que resta a um homem

Inundado de sentimento

Porque metade de mim é o que eu ouço

Mas a outra metade é o que calo

Que essa minha vontade de ir embora se transforme

na calma e na paz que eu mereço

Que essa tensão que corrói por dentro seja um dia recompensada

Porque metade de mim é o que penso

E a outra metade é um vulcão

Que o medo da solidão se afaste

Que convive comigo mesmo que se torne ao menos suportável

Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso

que me lembro ter dado na infância

Porque metade de mim é lembrança do que fui

E a outra metade eu não sei

Que seja preciso mais do que uma simples alegria para me aquietar o espírito

E que o teu silêncio me fale cada vez mais

Porque metade de mim é abrigo

Mas a outra metade é cansaço

Que a arte nos aponte uma resposta mesmo que ela não saiba

E que ninguém tente complicar pois é preciso

Simplicidade para fazê-la florescer

Porque metade de mim é platéia

E a outra metade é canção

E que a minha loucura seja perdoada

Porque metade de mim é amor

E a outra também.

Osvaldo Montenegro

André Ícarus
Enviado por André Ícarus em 26/04/2006
Código do texto: T145526