CONFIDÊNCIAS ... BIOGRÁFICAS? (30): Sonho incerto

Emanuelle Querino publica no RdL (11/01/2009.- T1379077) este poema com o qual me topei felizmente. Intitula-o «Sonho incerto»:

Teus olhos têm uma coisa

um brilho opaco

Ofuscado

ofuscante

E quando os cerras

me encerro.

Nada mais espero

que o roçar dos lábios teus

e sentir o sabor molhado

que me envolve

com os teus olhos semi-abertos

Assim,

durante teu beijo

o mundo se apaga

me esqueço de mim

Coloco minhas mãos em tua nuca

não quero que chegue no fim.

E quando acaba esse sonho real

e me dizes,

sincero,

que voltarás

minha felicidade ilusória parece que vai desmaiar

como se não soubesse a verdade:

tua ausência a aprisionará.

.........................................................................................................

O poema, tão sensível quanto sincero e certo, é para mim uma feliz provocação...

Segundo avançava na leitura, sentia também que me envolvia o sonho incerto da amada a beijar-me...

Ou acaso era que eu me submergia no sonho de beijar a amada na meixela rubra como maçã disposta a ser brandamente mordida e com delicadeza mastigada e engolida com amor...

Senti-me abraçado por essa umidade confusa e mesmo disparatada que emana da paixão...

Não sei se o que estou a confidenciar é fruto do desejo intenso ou ideia absurda ou impulso inconsciente, arrancado aos anos velhos...

Mas (jurá-lo-ia se tivesse costume de jurar... em vão) foi, com certeza foi...

Algum/a leitor/a curioso/a mesmo perguntará: «E quem é essa amada que sonho tão estranho suscita?» (A pergunta parece-me com mais do que pouco requinte...)

Respondo: «Minha amada é minha amada, a mulher (sou assim), simplesmente a mulher... ideia não fictícia ou sonho real, como assinala Emmanuelle no seu lindo poema...»

..................................................

Define o dicionário Aulete:

 1 Ação ou resultado de sonhar

  2 Conjunto de imagens ou pensamentos, freqüentemente disparatados e confusos, que se apresentam à mente durante o sono: "Dormiu mal; os sonhos não o deixavam em paz." (Aluísio Azevedo, Casa de pensão.)

  3 Utopia, imaginação sem fundamento, seqüência de idéias vãs e incoerentes às quais o espírito se entrega; FANTASIA; DEVANEIO; ILUSÃO: A crua realidade, inimiga dos sonhos, mostrou que já não havia lugar para a esperança

  4 Idéia ou ideal defendidos com paixão: O sonho da fraternidade entre os povos

  5 Idéia inconsistente, sem duração ou alcance: "A vida é sonho tão leve,/ que se desfaz como a neve..." (João de Deus, A vida", in Campos de flores.)

  6 Desejo intenso e constante, aspiração: O sonho da casa própria

  7 Idéia absurda, sem fundamento; FANTASIA; UTOPIA; FICÇÃO: Em seu sonho imaginou que era o rei da Inglaterra

  8 Coisa ou pessoa muito bonita, visão: Era uma deusa, um sonho de mulher

  9 Psi. Conjunto de imagens, lembranças ou impulsos inconscientes, geralmente distorcidos, que se experimenta durante o sono e que pode ser parcialmente memorizada

10 Psic. Para Freud, cenário e enredo imaginados em estado de vigília, produzidos pelos desejos, e da mesma natureza do sonho noturno

11 Liter. Na literatura clássica, visão clara e precisa ordenada por potências sobrenaturais, e que proporciona aos mortais um bom ou mau conselho: O sonho de D. Manuel, tal como está em Os Lusíadas, é uma premonição das descobertas

12 Liter. Art.pl. Composição literária ou artística um tanto vaga e caprichosa, com uma certa incoerência e desalinho de formas, que leva a uma ordem de sensações semelhantes às do sonho

13 Cul. Pequeno bolo muito fofo feito de farinha e ovos, passado em açúcar e quase sempre recheado de creme

[F.: Do lat. somnium, ii.]

NOTA FINAL:

Que "misteriosas" são as línguas e, sobretudo, os "linguados" delas! A acepção (13) de SONHO define o que no castelhano europeu se denomina "buñuelo (de viento)". Parece-me muito mais humano denominar esses bolos pela palavra SONHO... "Buñuelo"... que é o que possa ser "buñuelo"? Explica o "Diccionario" da "Real [no Reino de España temos Rei e Rainha!!!!] Academia Española": «1. m. Fruta de sartén que se hace de masa de harina bien batida y frita en aceite. Cuando se fríe se esponja y sale de varias formas y tamaños. [...] ~ de viento. 1. m. El que se rellena de crema, cabello de ángel u otro dulce.»