Cara Senhorita Y:
O estudo de qualquer texto literário, ainda os mais simples, implica limites reais de competência crítica. Então confesso: o teu comporta significados bem mais numerosos e maiores do que pode dar conta esta mera e breve leitura...
Ainda assim, arrisco:
Predominam em tua literatura a solitude, a angústia do abandono, dos fins-de-caso, a solidariedade, a esperança e o amor a Deus (e revolta pelo descaso celeste).
O vocabulário, bem pobre, repetitivo e previsível, não condiz com tua imensa riqueza e experiência interiores. Conselho-segredo: lê mais: mais gramática, mais figuras de linguagem, mais autores, mais teóricos da Literatura.
Logo, continua mas amplia e enriquece teus versos e tua prosa, melhoráveis sim senhora. Afinal, quantos alcançaram e alcançarão a imortalidade cantando um só assunto? Poucos, porque nas letras existe também uma seleção natural.
Sê menos chorosa, não te lastimes assim tão banalmente. Transforma essa dor, essa alegria, esse amor, esse ódio, essa revolta, essa mágoa, essa treva em uma única e gigantesca tocha, que nos ilumine --- que para isto escreves: iluminar-nos e receber os reflexos dessa iluminação, sob a forma de leituras, comentários, análises...
Aliás, as opiniões dos comentaristas nada mais refletem que lenços imaculados, que piedosos consolos. Recusa tais sentimentos vazios. Exige mais respeito literário. (Então, escreve melhor!)
Achei teus textos regulares, lamuriosos, medíocres. Literatura barata. Mas plena de boas intenções. Faltou transformar essas intenções em grandes versos, em prosa digna.
Todo mundo te elogia ou consola, triste sofredora solitária que te apresentas. Discordo dessa atitude paternal, antiliterária dos colegas. Você tem que ser confrontada com a covardia que demonstra ao negociar com as palavras, todas (mal) medidas e pesadas. Pérfido léxico, não? Traiçoeiro, movediço...
Lembra-te de que em breve eu, tu e toda essa geração passaremos, findaremos, e virá outra, e outra...
Se queres ser lida e estudada por essas 'outras', trata de se dilacerar verbalmente, criatura! Sem maiores melodramas ridículos!!
Creio porém que, fugindo às costumeiras exclamações de quem borboleteia superficialmente sobre uma escrivaninha, preferi a autenticidade e o exame profundo de alguns trabalhos somente, livrando-te de cândidas e levianas afirmações, como:
“Oh mas que beleza, poetisa!!”
“Gostei do seu versejar. Visite-me!”
“Lindo lindo! Amei de paixão...”
“Grande, grande talento!"
"Que beleza... Gostei, ou melhor, adorei!!"
"Gente, que lindo!"
Agora afirmarei convicto, e sem as mesuras corriqueiras: "Sim, teu texto convence como literatura, instiga, revolta, nos esbofeteia também. E encanta pela verdade artística implícita. Beijos."
Teus trabalhos até estão inspirados, mas não trabalhados literariamente. Palavras apenas, e não luzes à nossa espera num caminho desconhecido, em auxílio à lúgubre jornada. Reescreve-os...
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Escrito em 29/12/2008.
Modificado 20 vezes até 28/06/2010.
Tempo gasto: 10:00 horas.