Uma viagem pela abstração trivial do aparentemente lógico
O fato que se mostra claro e incontestavelmente concreto aos olhos dos que procuram analiticamente enxergar uma razão para as profundas divergências no seio familiar, no meio social de nossas cidades, de nosso estado, do país e, como visto, por extensão, no mundo é que toda e qualquer doutrina não tem resolvido os conflitos sociais. Ao contrário, temos visto que nesses últimos dois séculos os conflitos têm se multiplicado e, paradoxalmente, o que se esperava com o desenvolvimento do conhecimento humano o qual trouxe avanços tecnológicos e em larga escala, não foi o aprimoramento das relações humanas no que se refere ao respeito pelo próximo, mas uma mudança da natureza das agressões, pois o bem-estar esperado, oriundo da sistematização desse conhecimento, nos trouxe uma ciência excludente, por meio da qual fora mudada a forma do desprezo do homem para com o homem e do homem para com seu Criador, uma vez que o avanço do conhecimento científico tem dado a esse homem, até mesmo, a sensação de ser criador e não de ser descobridor daquilo que já está criado e que foi criado para o bem da humanidade. Assim, o bem-estar e a solidariedade humana tem se manifestado de forma muito distante do que se imaginava ser coma aquele caminhar para um limiar do ideal. Cabe, então, e sempre coube, indagar e procurar compreender o porquê desse perpétuo desentendimento entre os homens.
O ser humano nasce desprovido dos conhecimentos necessários para a sua sobrevivência. Parece que um outro animal qualquer largado na natureza, após sua desmama, teria mais probabilidade de sobrevivência que o homem, também após sua desmama. Por isso, talvez, não há como ter-se referências para a sobrevivência sem valer-se da característica animal que nos distingue dos outros animais que é o raciocínio, a associação decorrente e, por consequência, o aprendizado e seu registro. Logo, o recorrer à história registrada ou à tradição repassada de geração em geração torna-se imprescindível para a evolução social e espiritual humana.
Embora o ser humano seja uma criatura lógica e analítica, o grau de sua criatividade às vezes o leva a divagações que estruturam teorias, muitas vezes complexas, as quais trazem a grande satisfação de explicar os fenômenos que perturbam sua curiosidade, seu pensamento e suas crenças. Contudo, e em função disso, vê-se que grande sempre será a necessidade de compreensão de tudo aquilo que o cerca. Mesmo tomando rumos divergentes, assim sente todo observador – uma grande fome de conhecimento das coisas da Natureza e as sobrenaturais. E, por tudo que foi dito, não há como não se reportar à história ou à tradição para que tenhamos o conhecimento necessário para a análise do que nos cerca e nos espera à frente. É aprendendo com a história que vivemos melhor o presente e podemos evoluir para um futuro melhor ainda.
Hoje vemos claramente que há uma destruição do bom sentimento entre as pessoas. Um sentimento que nos torna capazes de sentir a dor do outro. Um sentimento que nos coloca não em uma posição superior por sermos possuidores dessa capacidade, mas um sentimento que nos leva a agir em prol do outro. Um sentimento que nos faz profundamente incomodados, diante da necessidade do outro, ao perceber nossa impotência na solução desse desequilíbrio. Um sentimento que nos permite compreender as nossas fraquezas e as fraquezas do próximo como um processo de quebra das esperanças de ver uma sociedade melhorada em sua vontade de evoluir para o bem comum. Um sentimento que nos impulsiona na direção da construção de uma sociedade blindada ao estímulo da riqueza material desenfreada como se nada mais houvesse de objetivo a alcançar; blindada ao estímulo do individualismo como se pudéssemos viver sós; blindada ao puro prazer apenas das endorfinas, serotoninas e adrenalinas dessa vida mundana, mas que se envolvesse ao prazer da empatia, da solidariedade, do companheirismo e do amor. O sentimento que mais nos cerca hoje é a inveja, o desprezo e a procura da total liberdade individual sem a preocupação do espaço alheio.
Contudo, sempre houve uma esperança cada vez mais deixada de lado. Ao nos deixarmos levar na direção de conhecer os ensinamentos, mesmo que pela curiosidade ou por uma vontade interior inexplicável, daquele que foi um dos maiores profetas da história da humanidade e que se disse e mostrou ser o Filho de Deus, pelos prodígios feitos e testemunhados e pela vitória diante da morte ao ressuscitar três dias após tirarem-Lhe a vida terrena conforme previsto, Esse que foi enviado para que sejamos com Ele irmãos e conheçamos as promessas de vida eterna, passamos a ter esperanças na mudança da consciência do homem e, por consequência, na sociedade por ele reconstruída. Passamos a ter esperança que as pessoas sejam menos vulneráveis às maldades, enxergando com mais profundidade as intenções espúrias daqueles que não se rendem pelo amor e precisam da violência como alimento para seu espírito. E o mundo está cheio desses últimos que pretendem resolver a violência com mais violência ainda, e quando assumem o poder não resolvem as necessidades e perpetuam com mais profundidade a violência da qual se alimentam.
Não importa que muitos considerem utópica a procura de um caminho que nos leve a perfeição, mas que seja real colocar como um objetivo a se perseguir, com toda a nossa deficiência, a perfeição de nosso espírito para que possamos ser bons. E Cristo nos ensina como ser bom e a fé nEle e em seus ensinamentos não pode se apoiar em privilégios e poder, mas numa vocação autêntica voltada ao desenvolvimento integral do ser humano. Portanto, procuremos por Cristo, pois muitas teorias têm sido colocadas em prova sem que tenham resolvido o problema da humanidade, ao contrário, temos visto, como foi explanado, o crescer dos conflitos desde o seio de nossa família até a dimensão mundial, acelerado pelo inevitável processo globalizante das evolutivas tecnologias do nosso mundo.
O Evangelho é um elemento fundamental em todo esse processo, pois ali se encontra a palavra de Deus escrita historicamente por aqueles que foram inspirados pelo amor divino para que possamos ter o conhecimento dos mandamentos de Deus. Mesmo que não se aplique uma verdadeira hermenêutica na procura da verdade, o que se lê no Evangelho é atual e se pode ver nele a Luz para o desenvolvimento e o bem-estar humano. Soluções adequadas para os graves problemas socieconômicos que afligem a humanidade passam por essa verdade da fé Cristã, pois não é lógico presenciar e sofrer com todas essas intolerâncias espalhadas mundo afora sem que surja a vontade de experimentar o amor de Cristo, a não ser que já estejamos tomados pelo mau e que nosso coração só tenha espaço para as paixões materiais desse mundo que com a sua velocidade, perspicácia e argumento econômico, nos rouba o raciocínio e nos fecha para a simplicidade e para o amor.
Mas tenhamos fé que em todo o coração tomado pela desesperança haja um pequenino espaço, seja no ventrículo esquerdo, seja no direito para que uma transformação possa ser operada, pois não há escuridão tão grande que não possa ser impedida pelo pequeno clarão de luz da pequena cabeça de um palito de fósforo. Sejamos também uma luz. Sejamos também aquele sal que dá gosto ao bom alimento, e, um dia, nossas luzes poderão iluminar grandes espaços de trevas e poderemos dar gosto ao bom alimento que nos faz crescer e ser justos e trazer boas soluções para nossos conflitos sociais. E a lógica se traduz em escolher trilhar um caminho assim na procura de boas soluções, com a humilde compreensão da grande necessidade que temos da ajuda de Deus, ou se deixar levar pelo mar de destruição que, às claras, tem tentado nos transformar nesses seres cheios de ódio, de vontade de vingança enfeitada pelos adereços cruéis da tortura e cujo resultado não pode ser outro senão a continuada autodestruição social.
S. C. De Albuquerque
25/09/2018