A tristeza do Natal....
(Partilho com vocês uma carta escrita a uma pessoa amada e que injustamente não estará conosco no Natal...)
Outra reflexão que gostaria de partilhar com você é sobre o Natal. Na outra carta lhe disse que nosso Natal não seria fácil e realmente não será, a mãe já disse que festa será o dia que você estiver aqui e isso não importa o quanto demore. Então eu egoisticamente pensei: caramba que Natal triste e dolorido!
Na sala aqui de casa nós montamos o presépio e olhando para ele me peguei pensando no primeiro e verdadeiro Natal e de acordo com a narrativa do Evangelho será que podemos dizer que o primeiro Natal foi feliz? Será que esse clima romântico que lhe atribuímos existia mesmo desde o início? Será que o Natal só pode ser paz, sossego, tranqüilidade, alegria, festa? Eu me atrevo a dizer que não e me explico.
Pensemos na cena: Maria que recebera a mensagem do Anjo que estava grávida do Filho de Deus, José que não entendia direito o que estava acontecendo, mas havia aceitado o compromisso de cuidar de uma mulher que ainda não era sua e de um filho que nunca seria seu. Como se não bastasse isso, se faz necessário uma caminhada longa tendo como transporte um burro, que com certeza deve ter empacado várias vezes, uma mulher grávida viajar em condições tão precárias, sabendo que o parto se aproximava, com certeza se fazia necessário levar tudo que precisava para o bebê que estava para nascer. Não tinham casa, não tinham dinheiro, tinha apenas uma promessa que nem entendiam direito. E quando chegam a Belém não encontram um lugar normal e devem se abrigar na pobreza de uma estrebaria, talvez o lugar mais “tranqüilo” que tenham arrumado e ali, em meio aos bichos nasce o menino que trazia a marca divina. Meu irmão, sinceramente, você consegue ver beleza nisso? Você consegue ver alegria? Qual expressão terá povoado aqueles rostos cansados de Maria e de José? Que pensamentos aquela mulher não deve ter nutrido depois de uma dor tão grande para dar a luz a um Filho tão misterioso? Qual não terá sido a sensação de José ao olhar um menino que ele não tinha desejado, não tinha planejado, não tinha fecundado e que deveria acolher como filho?
Realmente esse primeiro Natal foi confuso, com muitas respostas procuradas e não encontradas. Nesta parte assemelho nosso Natal ao primeiro Natal que aconteceu naquela estrebaria, naquela gruta de Belém. Tudo escuro, sem explicação, sem motivação, sem certezas, mas mesmo assim celebrado pela luz da vida que nasce.
Se você ainda suporta um pouco mais eu continuo a reflexão. A cena do primeiro Natal não foi nada encantadora ou romântica, foi a semente lançada no escuro da terra, semente que podia germinar ou não. Convido você meu irmão a imaginar as peças do presépio: José, Maria e um menino deitado em um cocho revestido de palhas (era o berço), esse menino ali meu irmão, é o próprio Deus. Dá para acreditar?! Deus deitado em meio a palhas? Olhando para as casas pelo mundo a fora a noite de Natal será iluminada, regada a tanta comilança, bebidas, festa, luz, alegria (quantas vezes nós também não comemoramos assim!). Porém este ano nos vemos obrigados a festejar de outra forma, nos vemos obrigados a entrar na suja estrebaria e em meio a tantos cheiros identificar o odor divino que se mistura aos fedores humanos e faz com que tudo se transforme em um delicioso perfume.
Meu irmão neste Natal somos convidados a celebrar o nascimento de Jesus na manjedoura de Belém, nossa casa se transforma em uma estrebaria, fria, escura, carregada de tantos sons que em nada atraem ou agradam, mas capaz de acolher a força divina que vem na pobreza, na dor, no abandono.
Não quero exaltar o sofrimento, até por que Jesus não nos ensinou a sermos masoquistas, quero apenas recordar que a alegria que hoje se diz celebrar em todo mundo é resultado de uma noite escura e sombria, de uma jornada longa e sem explicação e se de lá brilhou a luz para todo o mundo, também da nossa dor brilhará a luz nova da paz e do amor.
Celebremos o que temos que celebrar, mesmo que a celebração seja contida, mesmo que as lágrimas da ausência molhem nosso rosto, mesmo que a tristeza aperte nosso coração. Vamos celebrar! Pois nossa dor é semente de nova vida, nossa confusão é prenúncio de novas respostas...vamos comemorar. Fecundo Natal!