Festa no coração
Ela tinha pressa. Lista enorme, lojas abarrotadas de gente, filas quilométricas. Estava preparada para aquela maratona: roupas e sapatos confortáveis, carro estacionado, dinheiro não era problema, saúde era de ferro. O que mais poderia desejar?
Entrou em várias lojas, comprou muitos presentes... Percebeu que a hora corria. Teria que ir a outros lugares, providenciar tantas coisas ainda... Ufa! Era hora de dá uma pausa. Fez um reforçado lanche e prosseguiu na sua peregrinação. Tudo contribuía para que o gasto não ficasse apenas na lista. Vitrines coloridas, as luzes, os enfeites, o riso fácil das pessoas, o maior número de atendentes, o próprio ar parecia dizer: É hora de festejar.
Após o almoço, e uma boa descansada voltou para o entre e sai. Mal percebeu quando estava chegando o fim da tarde. O corpo pedia descanso. Os braços cheios de sacolas e pacotes. Quando vai chegando ao estacionamento uma pessoa lhe dirige a palavra:
- Moça, dê-me uma esmola.
Aborrecida, fechou a cara e disse a primeira coisa que lhe veio à cabeça:
- Não tenho dinheiro! Não me incomode e se chegar mais perto eu chamo a polícia!
- Calma, Tia, eu não sou assaltante. Eu só estou com fome.
Respondeu aquela figura que era uma mistura de alguma coisa, menos de gente. Olhando bem, seu cão estava em melhor situação que aquele moleque. Seus cabelos era um emaranhado de fios grudados e sem brilho. Parecia ensebado. Era mais crespo que a vassoura que a Zulmira, a empregada, usava para lavar a calçada. Sentindo um arrepio de nojo, apressou os passos para sair daquela situação incômoda. Com tanta gente, aquele garoto tinha que escolher logo ela, pensou com seus botões.
O garoto viu que daquele mato não saia coelho, usou outra estratégia para conseguir uns trocados:
- Se a senhora quiser eu levo seus embrulhos.
Falou cuidadosamente, querendo mostrar que não estava pedindo por não querer trabalhar. Mas a reação daquela mulher tão distinta foi ainda mais agressiva:
- Não! Eu não preciso de ajuda! Sai daqui, moleque! Era só o que me faltava, depois de um dia cheio encontrar-me com um chato de galocha!
O moleque percebeu que a mulher a cada momento ficava mais exaltada, e já estava chamando a atenção das outras pessoas... Olhou para ela de uma maneira diferente, e antes de sair falou:
- Eu só estava pedindo uma esmola. Mas deixe pra lá... Feliz Natal pra senhora.
Saiu cabisbaixo, pés descalços, calção rasgado e desbotado. Dirigiu-se para a Ponte Velha, com a intenção de conseguir a atenção de um pedestre qualquer. Fez muitas tentativas, as pessoas tinham pressa, outras com medo seguravam as sacolas e a bolsa, pensando que ele num bote iria lhes roubar os presentes, o relógio, quem sabe até a roupa do corpo. O moleque só queria uns trocados. Há muito deixou de sonhar com Papai Noel, com presentes, mesa cheia, roupas e sapatos novos, casa, cama cheirosa, lençóis limpos... Já estava acostumado com o chão duro, que era sua cama; por teto um bueiro ou o viaduto, por lençol um papelão. Já aprendeu a comer resto em lata de lixo, a ficar esperando alguém jogar fora o resto de um lanche, provar resto de refrigerante e coco que as pessoas saciadas jogavam adiante. Para ele o importante era no momento ter a fome saciada. Mas naquele final de tarde as coisas não estavam indo bem. Parecia-lhe que iria outra vez dormir com a barriga pegada à costela.
Enquanto isso aquela senhora conseguiu entrar no carro, jogando os embrulhos no banco traseiro e antes de conseguir colocar o carro para funcionar, teve um estalo. Caiu em si. Como é que ela tinha dito que não tinha dinheiro quando sabia que não era verdade? Além disso, pela quantidade de compras que havia feito dava para constatar que ela era indigna de comemorar o verdadeiro Natal! Aquele menino havia pedido apenas uns trocados, e ela o havia tratado como um animal! Naquele momento chorou suas fraquezas, sua incapacidade de amar. Percebeu que precisava se despojar pelo menos por um momento e voltar a ter um coração com capacidade de ouvir a mensagem de outro coração.
Olhe à sua volta, olhe com o coração. Fazendo assim, você encontrará motivos para comemorar o verdadeiro Natal. Dê uma chance para sentir os céus dentro de si, ouvindo os anjos tocando. Haverá uma grande festa dentro do seu coração.