A dança no fio do vento

Nascer com asas era um presente para todos da floresta, exceto para ele, que as via como uma prisão invisível. Ele nasceu com asas fortes, mas cada vez que olhava para o céu, algo o prendia ao chão. Havia sempre um vento contrário, uma tempestade ao longe, ou a lembrança de quedas antigas. Então ele caminhava. Apenas caminhava.

Um dia, enquanto andava por uma planície deserta, viu outro pássaro, um corvo, voando como se não houvesse amanhã. Suas asas eram rasgadas, seu voo, torto. Mas o corvo parecia não se importar com nada disso. Ele subia, despencava, girava e voltava ao céu como se a queda fosse parte da dança.

— Como você faz isso? — perguntou o pássaro que caminhava.

O corvo pousou perto e respondeu, com a voz rouca de quem já enfrentou muitas ventanias:

— Eu não espero que o vento seja perfeito. Eu só deixo que ele me leve.

O pássaro ficou em silêncio. Passou dias observando o corvo. Ele voava mesmo quando o céu parecia desabar. Não era bonito, mas era livre.

Certa manhã, antes que o sol subisse, o pássaro abriu as asas. Sentiu o vento. Não era calmo, mas também não era uma tempestade. Era apenas o que era. Ele se lançou. Caiu no início, mas depois sentiu algo que nunca havia sentido antes: o vento carregava, mesmo quando parecia empurrar para baixo.

Naquele momento, ele entendeu. O céu nunca esteve contra ele. A ideia de um vento perfeito é que o mantinha no chão.

E assim, o pássaro que não voava começou a dançar no fio do vento, entendendo que o segredo não é esperar pelo momento certo. É confiar que, no final, até as rajadas mais fortes só querem que você aprenda a abrir as asas.